Parte 2: Imprevisível

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E aqui estamos nós.

Andando pelas ruas iluminadas e agitadas de Sumeru em direção à taverna. Eu deveria vir sozinho, mas mesmo se dissesse "não" incontáveis vezes ele viria de qualquer jeito. Alhaitham é bastante insistente quando quer. O problema é que eu nunca sei o que está passando na sua cabeça, e tem sido assim desde que nos conhecemos. Ele sempre parece inalcançável e perdido no próprio mundo em que ninguém mais tem acesso. Mas agora neste momento ele está todo cheio de si, insistindo em sair comigo. Há algumas semanas atrás se eu perguntasse a ele sobre sair por aí para beber comigo e outras pessoas, provavelmente teria arranjado uma desculpa para recusar. Eu não entendo. Isso é frustrante, sua imprevisibilidade...é frustrante.

A cada dia que passa ele parece cada vez mais longe, caminhando em uma estrada nebulosa e cheia de obstáculos. Quando poderei te alcançar? São tantas perguntas que rodeiam minha mente, elas se formam na nascente e desaguam em um mar interminável de insegurança. Alhaitham não é diferente da maré, ele vem e vai, às vezes perto o suficiente para se chocar contra à costa, e às vezes longe o bastante para me deixar sozinho nesta praia deserta.

As ondas são tão turbulentas, sinto que irei me afogar.

Imerso em meus próprios pensamentos sinto meu corpo indo de encontro ao de outra pessoa. No final, acabei esbarrando em alguém. Eu deveria prestar mais atenção por onde ando.

- Ah, desculpe. - a pessoa não responde, apenas segue adiante em meio à multidão que se forma no meio da estrada. O palco montado adiante parece chamar a atenção de todos. Em cima dele, parece haver alguns dançarinos vestidos com adornos elegantes.

Alhaitham para, ele volta seus olhos à multidão se formando em nossa frente, enquanto me encontro logo atrás. Me pergunto se ele não está incomodado com o barulho em volta, ou se deseja voltar para casa. Eu sei o quanto isso o deixa inquieto.

Mas minhas dúvidas são cessadas quando sinto minha mão ser agarrada com força pela de Alhaitham.

- Por aqui. - ele diz enquanto me olha por cima dos ombros, para logo depois me puxar para seguir em frente, adentrando a multidão.

Não pude evitar de me surpreender. Já era a segunda vez no dia em que nossas mãos se encontravam, e uma sensação familiar tomava conta de mim.

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Esse contato me recorda de quando Alhaitham ainda era novato na academia. Como seu sênior, fui designado ao papel de apresentá-lo ao ambiente em que iria frequentar à partir daquele dia. A primeiro momento ele apenas me ignorou e continuou lendo o livro que tinha em mãos.

- Me deixe sozinho, está atrapalhando minha leitura. - O pequeno Alhaitham quis se esconder atrás do livro.

- Oh, então você gosta de ler. - Com as pontas dos dedos pressionei o livro para baixo, revelando uma sobrancelha franzida e olhos ameaçadores. Sem resposta, continuei. - Conheço um lugar cheio de livros em que você vai gostar. Mas para isso você precisa vir comigo.

O garoto apenas voltou os olhos ao livro e caminhou em direção oposta. Rapidamente o acompanhei, não poderia deixar que escapasse.

- Pare de me seguir. - Disse exacerbado.

- Eu não estou. - Neguei. - Estou indo para a biblioteca. - Pisquei para ele como um sinal e em seguida agarrei sua mão livre e o arrastei até lá. Foi a primeira vez em que nossas mãos se encontraram, e elas nunca deveriam ter se distanciado.

Naquele dia, levei Alhaitham pela primeira vez para conhecer a biblioteca da academia. Estava vazia, erámos apenas nós e um amontoado de livros, não havia nada de especial. Mas ainda assim, seus olhos brilhavam e se enchiam de vida à cada prateleira, seção e livro que lhe mostrava. E eu estava feliz, o pequeno Alhaitham realmente amava livros.

Foi a primeira vez que senti que havia o alcançado.

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Embora estejamos rodeados de pessoas, não é diferente daquela vez em que estávamos sozinhos na biblioteca. Talvez um pouco diferente, mas a sensação é a mesma.

Talvez eu tenha o alcançado novamente.

A ideia de me aproximar de Alhaitham me lembra que mais cedo estava agindo igual àquela criança birrenta que ele era, a diferença é que agora sou um adulto.Que vergonha. Sem me dar conta, meus lábios se curvam em um pequeno sorriso. Me encontrar agindo como uma criança chega a ser engraçado, mas às vezes esse idiota realmente me irrita.

- Do que está rindo?

- Hahah. Não é nada. - Não queria ter que explicar o motivo, iria ser ainda mais vergonhoso.

Ele nada disse, e voltou os olhos novamente à estrada, que ficava cada vez mais vazia conforme nos distaciavámos do palco. Devagando todo esse tempo, não percebi que nossas mãos ainda estavam juntas.

- Acho que agora está tudo bem, pode soltar minha mão. - Verbalizo, mas a verdade é que eu não queria que esse contato acabasse. Então por quê estou pedindo para soltar?

Alhaitham parou, mas ainda mantinha os olhos na estrada e por alguns instantes permaneceu calado.

- Por quê? Você não gosta? - Disse por fim quebrando o silêncio, junto da minha postura.

Eu não sei como responder. Eu não sei como dizer à ele que na verdade é o oposto disso, que na verdade só o contato de suas mãos são o suficiente para que eu me recorde de um passado distante em que almejo novamente. A incerteza faz com que meu coração inquieto queira dizer por mim, me pergunto se o som das batidas são o suficiente para que ele possa entender. Droga, meus lábios não querem me obedecer, insistem em não se mexer.

- Tudo bem. - Ele diz em um tom indiferente, e antes que eu pudesse dizer algo sinto sua mão deixando a minha. - Você pode ir por conta própria.

Parece que a maré baixou novamente.

Mas antes que as preocupações pudessem me afogar, Alhaitham se vira em minha direção e com o dedo indicador aponta para frente.

- Mas só se me vencer em uma corrida até a taverna. Está logo ali. - Da distância em que estávamos já era possível enxergar a entrada do lugar. - Quem ficar para trás é um cogumelo podre. - Acrescenta.

É claro, eu havia esquecido. Hoje ele também estava agindo como uma criança. No final, parece que não evoluímos muito nesses anos que passaram. Ah,que seja.

- Quanta maturidade senhor escriba. Acha que isso é o suficiente para me fazer correr atrás de você? - O desafio.

- Tem razão, precisamos de um prêmio mais recompensador. - Ele se alonga despreocupadamente. - Então que tal se eu pagar suas bebidas essa noite caso eu perca? Embora sabemos que não vai acontecer.

- Vai nessa. - Ajeito as presilhas em meu cabelo garantindo que não vá atrapalhar minha visão. - Aceito seu desafio. - Me preparo para dar a largada. - Espero que esteja com a carteira cheia.

Ele ri cinicamente e também se prepara.

- Não se preocupe com isso. Ela sempre está cheia. É uma pena não posso dizer o mesmo da s‐...

- Filho da puta. - Ele ri novamente. - Vou arrancar esse sorrisinho do seu rosto assim que não sobrar nada na sua carteira.

- Hah. Vou estar esperando por isso.

Em nossas marcas, iniciamos a contagem regressiva.

- 3, 2, 1. Já!

E assim iniciamos uma corrida inusitada até a taverna, em que o resultado decidiria quem sairia falido dali.

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Continua...(um dia)

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Nota:

Um pouco atrasado, mas saiu. Queria agradecer à todos que deixaram seu apoio no último capítulo, eu realmente não esperava. Postei um rascunho que fiz durante o final do ano e me deparei com comentários me pedindo para continuar, li cada um deles com um sorriso no rosto. São coisas assim que me animam a continuar escrevendo, e continuarei. Até o próximo capítulo. <3

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Unreadable - Kavetham Onde histórias criam vida. Descubra agora