DOCUMENTO 003: A HORA DAS TREVAS

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Após retornar ao módulo eu e meus companheiros começamos a checagem dos dados registrados naquela noite.

         Antes, durante e após o tempo que permaneci lá embaixo, foi realizada uma detalhada análise do estado psico-biológico do Mestre, que constatou uma profunda depressão que o assolara desde que chegara ao Gat-Semane. Aquela sensação de solidão que apenas Sua Mente poderia compreender foi a razão daqueles espasmos que o levaram a um quadro de hematoidrose, fazendo com que uma considerável quantidade de sangue saísse pelos poros de seu corpo, em especial a cabeça.

Após a análise de nossos microscópios voadores – que explicarei o mecanismo mais à frente –, nossos especialistas na base chegaram à conclusão que aquele delicado estado de seus vasos capilares iria gerar problemas caso o Soberano fosse agredido pelos seus acusadores, algo que infelizmente se confirmou da pior maneira para nós.[1]

         - Quanto tempo passei lá embaixo? – Continuei minhas perguntas, desejando saber mais detalhes técnicos sobre o que ocorrera fora do módulo.

         - Aproximadamente 15 minutos e 26 segundos.[2] – Patmah me informou, confirmando os dados da central.

         - Os Kohros,[3] registraram tudo?

         - Até o respirar do discípulo que os observava. – Concluiu.

         Eu estava para continuar minhas perguntas quando Yahron interrompeu a todos, indicando as ordens da base para acompanhássemos os novos episódios que se desenrolavam lá embaixo. Embora tivéssemos ficado debruçados durante o dia seguinte sobre aqueles registros, analisando cada imagem e cada dado coletado por aquelas microlentes que projetavam os acontecimentos em tempo real em nossas telas, nossa consciência mortal nos obrigava a testemunhar pessoalmente as últimas horas do Criador de nosso Universo em nosso mundo material.

Enquanto acompanhávamos as projeções, o tradutor em tempo real nos repassava em nossa língua os diálogos travados. Porém, o que mais me impressionou não foram as palavras, mas os atos que se seguiram. Yehoshua se encontrava à frente de seus discípulos, protegendo-os do verdadeiro perigo de que falara, e que agora havia chegado. Um verdadeiro exército formado por uns trinta soldados romanos e uns quarenta e cinco guardas do Templo.

Aqueles armados com espadas, lanças e escudos, estes, com rudes bastões e clavas grosseiras. Naquele momento, meu coração assim como dos meus companheiros palpitou. Previ o trágico embate do qual o Mestre queria poupar seus discípulos, pois sabíamos que a Seu contragosto, boa parte deles se encontrava armados.

         Quem falou primeiro foi o Soberano, perguntando por quem procuravam, em seguida revelando sua identidade. Esperei pelos próximos passos, mas foi Yehudah quem os deu, se aproximando do Mestre, em seguida depositando um trêmulo beijo na testa do nobre judeu.

         - Salve, Mestre e Guia. – Yehudah tentou abraça-Lo, meio que desajeitado, mas a vítima recuou, impressionado com a audácia do traidor. - Amigo, não te bastava fazer isso!, Ainda tinhas que trair o Filho do Homem com um beijo? – Declarou, com uma voz profundamente indignada. Imagino a tristeza que não se passou pela sua cabeça naquele momento.

         Encarando a tropa após a delação, o Soberano exclamou que se era Ele a quem buscavam, que poupassem seus discípulos. Naquele instante, um dos guardas do Templo se lançou sobre Yehoshua, tentando amarrá-lo, porém, subitamente, um de seus discípulos saltou contra o guarda do Templo, lançando sua espada sobre a cabeça do homem. O mesmo se esquivou, mas não o suficiente para que a lâmina não atingisse sua orelha direita juntamente com seu ombro. Vendo o que acontecera, o Soberano prontamente se dirigiu ao discípulo, chamando a atenção de todos, inclusive a nossa.

Os Contos Perdidos de Yuransha: A Hora das TrevasOnde histórias criam vida. Descubra agora