Estávamos cansados, mas apreensivos como nunca.
Novamente posicionados sobre o nosso destino, os scanners até então não registraram nenhuma alteração eletromagnética ao redor da tumba, muito menos ao redor da cidade. Abaixo de nós, o silêncio e as trevas reinavam em uma Yerushalayim que dormia após o fim do shabat judeu.
Os Kohros passeavam discretamente, camuflados de pequenos insetos voadores, tão imperceptíveis que, naquela escuridão, poderiam estar camuflados de grandes pássaros locais que passariam despercebidos pelos soldados romanos que guardavam o precioso lugar de repouso do Mestre.
O túmulo se encontrava em um horto de propriedade de um dos amigos e discípulos do Mestre, um rico sacerdote chamado Yosef, da cidade de Ha-Ramathaim.[1] Bem ao norte do Gagultha, o terreno se encontrava muito próximo à Fortaleza Antonia, assim como do Templo. Imaginei que aquele sacerdote, seguidor das rígidas leis religiosas do seu povo, queria a maior distância possível daquele tétrico lugar de execuções – e com razão. Pelas nossas investigações, soubemos que a presença da guarda de Roma juntamente com os soldados que protegiam o Templo vinha do receio dos sacerdotes inimigos de Yehoshua, de que seus discípulos roubassem o corpo do Mestre e anunciassem que havia voltado à vida – porém ninguém ainda havia compreendido como isso iria acontecer.
A visão da tumba era simples, uma parede rochosa do dobro de altura de um homem da região, lapidada de modo que denunciava as boas condições financeiras do seu proprietário. A entrada do sepulcro estava selada com uma grande rocha circular, encostada sobre outra menor. Ao redor da maior, diversos selos que reproduziam os símbolos de Roma lacravam a tumba, de modo que ninguém ousasse chegar perto.
Eu e meus companheiros acompanhávamos em silêncio os dados que eram exibidos nas telas de nossos computadores. Temperatura, medições infravermelhas, espectros eletromagnéticos, bem como as imagens dos guardiões do túmulo eram transmitidas em tempo real para nós.
Eles se juntavam em grupos distintos, ao redor de uma fogueira que os aquecia daquela tétrica noite impiedosa. A temperatura, abaixo do normal, podia ser sentida até mesmo por nós. A regulagem da temperatura em nosso Cruzador parecia estar enfrentando problemas, uma vez que o sistema de inteligência artificial, não respondia às nossas tentativas de elevar um pouco mais aquela fria temperatura que afetava a todos nós, nos dando repentinos calafrios. Era a temperatura ou nossa ansiedade?
Contávamos cada minuto passado em nossas telas, em uma vigília sem fim, e por que não, sem esperança, afinal, nada nos garantia que aconteceria algo naquela noite – pelo menos, visível ou mensurável.
Estávamos em nossas posições, quando um sinal começou a chamar a atenção de um dos Sacerdotes que monitoravam as medições eletromagnéticas da atmosfera e de nosso alvo dentro da cidade. Parecia uma espécie de pico, mas um pico direcionado. Mais do que isso, aquela alteração invisível aos nossos olhos – mas não aos radares – pareceu ultrapassar todas as medições, fazendo muitos de nossos companheiros se levantarem das cadeiras. Um frenesi se instalou entre nós, e a contagem dos dados se tornou um verdadeiro murmúrio de incredulidade. O que víamos em nossas telas e mapas luminosos era um verdadeiro absurdo.
Como que direcionado de algum quadrante do Espaço – e por que não do tempo, afinal notamos uma quase imperceptível alteração na disposição da curvatura do espaço-tempo –, um estranho vórtice se abriu ao norte de nossa posição, mais precisamente vindo da grande Har Hermon.[2]
Sem que pudéssemos esperar, essa alteração foi subitamente detectada pelos Kohros que rondavam a tumba. Para a nossa surpresa, essa conjunção de forças, que de alguma forma alteravam consideravelmente o campo eletromagnético da atmosfera ao redor do Hermon – para o nosso espanto – passou a se manifestar ao redor do túmulo, pairando como uma verdadeira nuvem, esperando descarregar sua tempestade.
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Os Contos Perdidos de Yuransha: A Hora das Trevas
Short StoryO dia é 6 de abril do ano 30. A lua brilhava intensamente sobre Jerusalém, porém, lá embaixo, a cidade estava mergulhada nas sombras da noite. Após celebrar a Páscoa judaica com seus discípulos, Yehoshua ben Yosef - conhecido como Jesus de Nazaré...