Capítulo 7: Noite Veluda.

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Hiago pilotava tão bem quanto rápido, em uma velocidade que eu não estava acostumado. Ele tomava o espaço da Drag Star quase que inteiro, deixando meu corpo colado ao dele o caminho todo. Eu estava com tanto medo que minhas mãos agarrou seus ombros com muita força, mesmo sem eu querer.
Chegamos rápido ao West Shopping, inaugurado há alguns poucos anos. Antes dele, o cinema ficava no centro da cidade. Paramos no estacionamento quase sem iluminação do Shopping, então eu desci, retirei o capacete e disse:
    - Você não me contou que era motoqueiro.
    - Haha. Gosto de motos, mas não chego a ser um motoqueiro. Meu pai deixou essa Drag Star de herança para mim. Ele, sim, era um motoqueiro. Eu sou, no máximo, um amador.
Fiquei em silêncio imediatamente depois que ele disse isso. Onde está o pai dele agora?
    - Veja a minha jaqueta. - ele virou de costas e eu vi um logotipo típico de uma gangue de motoqueiros - Era do meu pai. Ele pertencia à uma gangue chamada Rock N' Rollers On The Road.
Fiquei olhando, meus olhos extremamente arregalados. Era uma jaqueta de couro preta e velha, isso sim. Mas há um significado para ele.
    - Então, vamos entrar? - ele apontou para a entrada do West S. a alguns pés de nós.
    - Vamos.
O cinema estava lotado, a fila para o ingresso mais ainda.
    - Vamos assistir o quê? - eu perguntei.
    - O que você quiser.
    - Você tem algum filme em mente?
    - Não.
    - Nem eu.
    - Vamos ver os cartazes.
Fomos em direção aos painéis onde ficam os filmes em cartazes. Olhamos por um tempo. Os filmes em altas são filmes de ação e animação.
    - Esse. - Hiago apontou para um cartaz.
    - Pode ser.
Entramos na fila que continuava lotada e, vinte minutos depois, conseguimos comprá-los, mas o filme já havia começado há algum tempo. Compramos um balde grande de pipoca e refrigerante e corremos para a sala do filme. Fomos rindo discretamente, tateando os lugares até encontrar dois assentos nas últimas filas.
Fiquei tão tímido a partir daqui que falei pouca coisa. E o filme? Era sobre um casal de adultos frustrados tentando lidar com o fiasco do relacionamento deles enquanto o homem trai a mulher com a melhor amiga dela e ela afunda na depressão e consumo de drogas. - achei muito pão com ovo.
    - Não acredito que paguei pra assistir isso. - Hiago disse baixinho.
    - Parecia mais legal no cartaz.
    - Quer ir pra outro lugar?
    - Quero!
Ele pegou minha mão e fomos andando para o corredor da saída. Já no corredor, olhei rapidamente para trás, para a enorme tela, e a mulher loira do filme estava aos prantos com um cigarro na mão, dizendo: ''você arruinou a minha vida''. Escutei ela repetir essa frase até sairmos da sala.
Já no estacionamento, perguntei:
    - Para onde vamos?
    - Assistir uma coisa melhor.
    - O quê é melhor que assistir uma dependente química depressiva ser traída pelo marido e pela amiga? - ironizei.
    - Você vai ver.
Subimos na moto e eu coloquei minhas mãos em seus ombros. Antes dele ligar a Drag Star, ele pegou minhas mãos e as encaixou na cintura dele: ''quero que segure-se assim quando estiver na moto comigo'', ele disse com autoridade. Quando ele começou a pilotar, abracei sua cintura com mais força.
Saímos do West Shopping e pegamos uma rua extensa cheia de curvas (e deserta) até um bairro próximo ao meu. Depois, uma estrada escura (mais deserta que a outra) que ficava há várias ruas antes do Corredor Cultural. Cheguei a pensar que iriamos para lá, mas então ele parou a motocicleta em um local com prédios em construção. Eram dois prédios erguidos e estruturados, mas não terminados. Não haviam janelas, nem cerâmicas e nem mesmo muro, eram cercados por placas de metais. Olhei para cima e pude ver, nitidamente, as constelações. Não há casas por aqui, só as luzes da estrada, então há pouca iluminação aqui, por isso não tem poluição luminosa.
    - Esses prédios foram abandonados. - Hiago disse tirando o capacete.
    - Não me diga... O que viemos fazer aqui?
    - Vem.
Segui ele até uma abertura nas placas de metais. Hiago ligou a lanterna do telefone dele e iluminou o caminho até entrarmos em um dos prédios. - é um local de filme de terror: silencioso, escuro, abandonado e assustador - Continuei acompanhando-o pelos cinco andares seguidos até chegarmos em uma porta de metal, um tanto quanto velha. Hiago parou e disse:
    - Sempre venho aqui. Não tem ninguém.
    - Ah...
A porta dava acesso a cobertura do prédio quando a abrimos. Pude ver as luzes da cidades brilhando em conjunto, como as estrelas brilhando no céu. Hiago pegou minha mão.
    - Está com medo? - a voz calma dele me acalmou.
    - Estava. Por que me trouxe para cá?
    - Para assistirmos a cidade, bem melhor do que assistir uma dependente química depressiva ser traída pelo marido e pela amiga. Não acha?
    - Haha. Acho, sim.
    - E, também... É o meu lugar favorito.
Hiago soltou minha mão e caminhou em direção da sacada. Acompanhei-o alguns segundos depois. A vista daqui é linda e sombria, mas deve ser doce no fim da tarde.
    - Foi mal ter trago você aqui.
    - A vista daqui de cima não é tão ruim quanto a lá de baixo. - sorri. - Vem muito aqui?
    - Só quando quero esfriar a cabeça.
    - Constantemente?
Ele sorriu. Ele tem o sorriso mais lindo de Mossoró.
Lembrei do que minha mãe me disse mais cedo sobre ''conversar sobre nossas vidas'' e lembrei do que Hiago disse sobre o pai dele.
    - Hiago.
    - Oi.
    - Posso te perguntar uma coisa?
    - Pode, sim.
    - Aquilo que você disse sobre o seu pai... Onde ele está agora?
Hiago ficou em silêncio e me pareceu que eu fiz uma pergunta muito tola.
    - Desculpe perguntar isso.
    - Está tudo bem. O meu pai morreu em um acidente de moto há uns três anos na cidade em que eu nasci.
Acho que acabei tocando num assunto delicado.
    - Eu sinto muito pela sua perda.
    - Obrigado.
    - De onde você é?
    - Sou de Areia Branca. Já ouviu falar?
    - Já ouvi, sim. Ouvi dizer que lá tem um lindo cais.
    - Tem, sim. E quando a maré está muito cheia, ela acaba invadindo a cidade.
    - Deve ser aterrorizante.
    - Para quem vive lá é normal.
    - Bem, e a sua mãe? Ela ainda mora lá?
Novamente senti que não deveria ter perguntado.
    - A minha mãe... - ele suspirou, como se estivesse perdendo a paciência.
    - Me desculpe.
    - Quando eu era muito pequeno, ela foi embora, deixando minha irmãzinha e eu com o nosso pai. Tenho uma fotografia e poucas lembranças dela. E, antes que você pergunte, quando meu pai morreu viemos morar com nossa tia.
    - Eu não queria...
    - Deixa pra lá.
Me aproximei dele e lentamente enfiei meus braços pela cintura dele e dei um abraço pelas costas. Ele é mais alto e mais forte que eu, me encaixo perfeitamente nele. Ficamos um bom tempo assim.
    - Foi mal, eu não costumo falar sobre isso. - ele disse.
    - Eu pergunto demais também.
Ele virou-se para mim, soltando o nosso abraço mas não se afastando de mim.
    - Eu sei que conversar sobre essas coisas faz parte do processo de conhecer alguém, mas eu não sei como fazer isso. - ele disse.
    - Você... Pode me contar tudo aquilo que não conta aos outros. E no seu tempo.
De repente, eu estava olhando em seus olhos e ele nos meus. O olhar sereno e redondo dele fez meu coração gritar ''vou enfartar vou enfartar''.
Ele colocou as mãos na minha cintura e começou a aproximar o rosto lentamente do meu. Eu entendi que vamos nos beijar agora. Coloquei minhas mãos em volta do pescoço dele e fechei os olhos. Apenas senti nossos lábios se encontrarem, lentamente e desengonçados. Mas nossas línguas juntas fizeram o momento florescer.
Melhor que o beijo dele era suas mãos percorrendo meu corpo por baixo da minha camisa. Me permiti fazer o mesmo com ele. Sua pele bronzeada embaixo dessa camiseta vermelha é tão macia. E ele não estava poupando seu toque em mim, minha bunda estava sendo o alvo das suas mãos, me acariciando lentamente.
Comecei a sentir algo crescer em mim: era o meu pau. Ele começou a tirar minha jaqueta jeans. Pausamos o beijo, estávamos ofegantes. Depois, ele tirou a jaqueta dele e voltamos a nos beijar. Hiago colou minha cintura com a dele e senti que ele estava excitado também. Não paramos de nos beijar e nossos paus estavam loucos para se encontrarem fora das roupas, mas nenhum dos dois deu nenhuma iniciativa.
Interrompidos por um telefonema novamente. Retirei o telefone do bolso da jaqueta que estava no chão, saindo dos braços fortes de Hiago.
    - Oi, mamãe. - falei ofegante.
    - Nicolas, já são quase 22 horas da noite. Onde estão vocês? - minha mãe perguntou calmamente.
    - Ah... Já estamos indo.
    - Certo.
Eu desliguei o telefone e apanhei a jaqueta.
    - Temos que ir.
Hiago estava com a mão no pênis ereto. Ele deu um sorriso safado de lado.
    - Vamos! - ele disse, apanhando a jaqueta.
Ele passou por mim e eu dei um sorriso safado limpando nosso beijo abaixo do lábio com o polegar.
Pegamos as ruas e, na mesma velocidade que viemos, nós fomos. Mas eu não estava mais com medo da velocidade. Agarrei no corpo dele para aproveitar esse momento. Quantos Hiagos eu iria abraçar na vida? Nenhum além dele.

Eu estava em pé, com minha jaqueta na mão e minha camisa toda amarrotada. Hiago estava sentado na moto, havia tirado o capacete.
    - Obrigado por hoje, Hiago.
Ele balançou cabeça positivamente.
    - Vem me dar um abraço. - ele disse, puxando minha mão.
Ele abraçou minha cintura e eu agarrei suas costas. Ficamos assim até meu pai abrir o portão. Ele não se importa, mas é constrangedor, então soltei nosso abraço.
    - Até logo, Nicolas.
    - Até... Hiago.
Ele deu tchau para o meu pai atrás de mim, que retribuiu. Deu a partida na moto e saiu em direção da Rua Principal, enquanto eu observava ele indo embora.

Hiago me disse bem depois que foi nessa noite que ele começou a gostar de mim.

Carta de Suicídio (Romance Gay)Onde histórias criam vida. Descubra agora