Chá e conversa

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Comecei a ficar genuinamente preocupado. Apesar de ser o meu primeiro dia trabalhando com a beldade que se chamava Levi Ackerman, tive a impressão de que ele queria me jogar da janela do 50° andar. Eu estava definitivamente fazendo as coisas com total concentração, mas porque Levi parecia tão irritado? Sei que nem tudo iria ficar perfeito, mas de certo modo, eu estava me esforçando a fazer as coisas exatamente como fui instruído. Mesmo que fui chamado para sua sala diversas vezes em um só dia, o dono dos olhos azul escuro suspirava irritado com minha presença que naquele exato momento já havia sido sua vigésima vez que fazia isso enquanto me encarava. Puta que pariu, eu não sabia se eu ficava nervoso com a atitude irritante de Levi ou se eu perguntava se ele queria que eu chamasse um médico para ver se meu chefe gostoso ia ter um infarto pela quantidade de cafeína que ingeria em poucas horas ou pela sua cara de peixe morto.

Ao mesmo tempo que era expulso do seu escritório seguidas vezes, eu era chamado minutos depois para fazer coisas estúpidas como enumerar papeis em ordem alfabética, organizar clipes ou até mesmo arrumar algumas coisas que magicamente estavam no chão e quando eu me virava para perguntar se ele precisava de mais alguma coisa Levi tinha um sangramento nasal enquanto olhava para o outro lado da sala, me deixando mais confuso ainda. E depois de várias investidas para saber qual diabos era o problema do meu chefe, percebi que ele massageava sua cabeça em clara dor de cabeça e tinha o semblante mais pesado depois de todas as xícaras de café que bebeu. Então tive uma brilhante ideia.

- Perdoe minha intrusão Sr. Ackerman, terminei de revisar alguns contratos que o senhor me pediu e tomei a liberdade de preparar um chá de camomila e erva-cidreira com canela para o senhor. – Entrei cauteloso e dispus os papeis em sua mesa e a bandeja no balcão ao lado, pegando a xicara e substituindo seu copo de café vazio.

- Hum. Me diga uma coisa Sr. Jeager – me virei esperando que continuasse – Se os princípios constitucionais que se aplicam ao direito administrativo previstos no artigo 37 da Constituição Federal evidenciam a imparcialidade com os serviços públicos e o interesse mútuo de todos, por qual motivo você alegou que não necessariamente havia de ser cumprido? – Levi cruzou as pernas na cadeira e me encarava acusatoriamente enquanto bebia o chá. Pai Amado, que visão de tremer as pernas.

- Ora, pois não existe uma necessidade real. – Digo como se aquilo fosse uma brincadeira de perguntas e respostas, continuando o raciocínio - Quero dizer, é até engraçado como a Constituição no mesmo artigo esclarece que a legalidade possui uma atitude inversa ao explicito em outros direitos, que de certo modo, tudo o que não for proibido por lei, é permitido, e que à administração pública só é permitido agir de acordo com previsão legal expressa, ainda que nenhuma lei proíba o ato. – Permaneço calmo, mesmo que por dentro eu pulava de alegria por finamente conversar com Levi, apesar de não ser essa a conversa que imaginei que teríamos.

- Então, se eu garantir que meus atos, fundamentos e decisões forem transparentes para a sociedade, demonstrando eficiência em ambas as partes, sem cometer o menor deslize, mesmo que eu não soubesse que a obrigatoriedade de meus atos possa ter certa “liberdade”, ao perceber que não tenho toda essa permissão, terei de assegurar a fiscalização de minha política. Assim, nada havia ter valido a pena no final, o que diria a respeito dessa decisão? – Levi parecia estar se divertindo com essa conversa nada normal

- Eu diria para ir se foder – Levi arqueia a sobrancelha surpreso e eu rapidamente entendo a merda que disse e tento me corrigir – NÃO O SENHOR! Isso foi um exemplo! Eu quis dizer que se o senhor não soubesse dessa obrigatoriedade, esta podia ser considerada uma lei não totalmente expressa que a tornaria não proibível, em que desconhece seus princípios públicos e abdica essa sua “liberdade”.

- Mas isso não é verdade. – Levi me encara mais sério

- Mas também não é mentira. Assim como o que não é proibido é por sua vez permitido, se algo permitido também é proibido, então de toda forma, há de haver o equilíbrio das decisões. Portanto, nenhuma decisão foi errada, mas também não foi certa. O senhor apenas precisaria perceber se a decisão que tomou foi satisfatória para ambos os lados, e se valeu a pena ou não. – Após dizer tudo, me senti um Aristóteles na vida.

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