Era início da tarde quando se viram com um grande problema. À sua frente, barrando o caminho estava um grande charco. Um lugar pantanoso e malcheiroso, cheio de bancos de areia. O lugar era nebuloso; muito mais escuro que o restante do Pomar de Éris.
— Acho que podemos atravessar? - Digle opinou.
— Eu não quero entrar aí - disse Laila. Não apenas o cheiro e a aparência do lugar fazia ela se sentir mal, mas havia algo que dava a ela um mal pressentimento - Não podemos contornar?
— Creio que sim. Mas vamos perder muito tempo.
— Acho que prefiro perder tempo a entrar aí - ela avaliou o charco e olhou à direita a percebeu que o terreno se elevava naquela direção - Veja como a água corre lentamente. Se subirmos é possível que encontremos a fonte das águas.
— No que ajuda encontrarmos a fonte?
— Ora, provavelmente é um córrego, ou se tivermos sorte, um pequeno curso d'água. Podemos encontrar alguém que tenha um barco ou possivelmente uma ponte.
— Está bem, princesa - Digle concordou - Vamos seguir sua ideia.
Juntos subiram pelo pequeno morro, e por um longo tempo pareceu que nada havia além daquele charco. Laila começava a pensar que teriam de atravessar pelos bancos de areia entre as águas mal-cheirosas, até que o charco começou a ficar mais fundo e com uma corrente mais forte. Alguns metros à frente o charco já não existia, dando lugar à largo córrego de águas velozes.
— As águas aqui são violentas - Digle apontou.
— Eu percebi - disse Laila - Dificilmente poderá ser atravessado à barco, e muito menos a nado.
— Vamos torcer para encontrarmos alguma ponte.
Seguiram caminho, e como uma resposta a suas preces, à frente viram uma longa ponte de madeira, que estava localizada bem no centro de uma cidadezinha que crescera à volta do córrego. Entraram na cidade, esperando não encontrar um povo tão encrenqueiro quanto os gorgulhos.
Ali as casas eram mais bonitas que no povoado dos gorgulhos. Havia construções bem acabadas com galhos; outras eram feitas na base de altos cogumelos, e ainda havia prédios altos feitos unicamente de barro. Viram um povo variado. Ali havia grilos cortando e carregando lenha, joaninhas conduzindo manadas de pulgões e mariposas produziam e comercializavam tecidos de seda. A pequena cidade prosperava junto ao rio, e seu povo parecia ser pacífico.
Digle viu alguns mosquitos vendendo néctar, e se aproximou para comprar um pouco. Um dos mosquitos pegou algumas de suas moedas e lhe entregou dois odres feitos em folhas verdes. O grilo entregou à Laila um dos odres e juntos beberam o delicioso líquido. O mosquito os olhou com interesse.
— Vocês não são daqui, não é? - perguntou o mosquito.
— Não - Digle respondeu - Só estamos de passagem. Pretendemos usar a ponte.
— Espero que tenha trazido mais do que algumas moedas consigo - disse o mosquito - A Dama da Ponte permite a passagem de nosso povo a baixos custos, mas faz preços altos para forasteiros.
Aquilo deixou o casal preocupado, pois Laila não tinha nada de valor consigo além de sua coroa; poderia ter trocado suas caras roupas por um bom preço, mas seu vestido de narcisos estava completamente sujo e arruinado, e Digle não possuía mais do que algumas moedas de cobre. Mas não tinham opção além de ir até a ponte e descobrir qual era o valor cobrado.
Atravessaram a cidade e finalmente chegaram até a ponte. Ela era magnifica, de tão grande, sendo em seu comprimento e mesmo em largura, que seria capaz de permitir a travessia de até três carroças lado a lado. Nas duas extremidades havia torres de pedra, lado a lado cercando as entradas. E junto à margem de cá havia uma grande estrutura feita das pedras polidas do rio. Com altos degraus, afunilando-se um após o outro, assumia para si o formato de uma pequena pirâmide. E em seu topo, sentada em um cadeirão de madeira estava a Dama da Ponte, bebericando um delicioso chá quente e observando a vida dos transeuntes. Ela era uma altiva viúva-negra, e sentava-se orgulhosa, como se toda aquela cidade a pertencesse.