Capítulo 07 - [parte 1]

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A luz do poste se apagou quando estava perto dos arbustos. O gato se assustou e saiu correndo.

No chão, quando caí, toquei um líquido desconhecido. Minhas mãos estavam excepcionalmente pegajosas. Esfreguei o meu tornozelo e verifiquei meu abdômen enquanto olhava para a coisa enorme onde tropecei, minhas sobrancelhas estavam franzidas. Parecia um tronco, mas era mais macio e maior do que um tronco. Não conseguia ver claramente com a escuridão ao meu redor. Levantei-me com dificuldade e peguei meu celular, liguei seu flash enquanto afastava as folhas que bloqueavam a luz para ter uma visão mais clara.

Quando vi, dei alguns passos para trás com o sobressalto repentino e imediato.

Era um corpo. Mais precisamente, era um homem com cabelos quase grisalhos.

As roupas do homem estavam amarrotadas e desengonçadas. O sangue era vermelho brilhante, com um cheiro metálico. Demorou alguns instantes para perceber que minha mão estava coberta de sangue. Meu tornozelo também tinha sangue.

Sabia que precisava manter a calma, mas não sabia se o senhor ainda estava vivo. Disquei o número da polícia e ambulância. Depois de terminar a ligação, rapidamente recuei para a beira da estrada e me sentei perto de uma pedra. Após uns minutos pensando se ia ou não averiguar se o homem estava morto, mesmo hesitante, fui até o corpo. Dando pequenos passos até ele, sempre olhando ao redor, afinal, o sentimento de que tinha alguém me observando ainda me dava calafrios. 

Antes de quebrar a curta distância entre mim e o homem inconsciente, avaliei rapidamente a situação para ver se podia me aproximar dele com segurança. Sem mais delongas, peguei um pedaço de galho e o cutuquei para ver se havia algum tipo de reação violenta, mas não houve.

Perguntei para ele se estava tudo bem, e como esperado, ele não reagiu aos meus estímulos externos, portanto o considerei inerte. 

Não precisei verificar as suas vias respiratórias, notei que a pessoa estava respirando normalmente, seu peito estava subindo e descendo conforme ele respirava. Mas por via das dúvidas,verifiquei o seu pulso, levantei o queixo dele e senti o seu pomo de Adão. A partir daí, levei os meus dedos para o espaço onde estava suas veias no pescoço. E sim, havia pulso, consegui sentir um latejamento rítmico embaixo dos dedos.

Apesar de me sentir desconfortável com minha situação, constatei que ele estava vivo e voltei a me afastar. Quando soube disso me senti mais calmo, colocando meus pensamentos em ordem durante um tempo, até ouvir uma voz rouca me chamando.

— Ei, me dá uma ajudinha aqui. — O homem levantou sua cabeça e olhou para mim, me dando um susto que fez minha espinha gelar. — Acho que vou me afogar, tem muito glitter aqui. — Olhei para ele incrédulo, ele tentou se levantar, mas não conseguiu. Fui até ele e o ajudei a se sentar, ele olhou para trás de mim e apontou, sem falar nada. — Álcool, quer dividir? — Olhei para onde ele estava apontando, debaixo de algumas plantas havia uma garrafa de álcool. — Se você me dar, eu vou ser gentil e dividir com você — o senhor sorriu para mim. — Oh! Você também está sujo de glitter! — Olhei para mim, me dando conta do que ele estava falando. O glitter era sangue, eu e ele estávamos sujos de sangue. 

— Não é glitter, é sangue. Tio, você está com um ferimento na cabeça — falei para ele, mas ele não pareceu surpreso e apenas passou sua mão no ferimento que não parou de sangrar. 

— Não é sangue, é glitter! Ou será purpurina? — Ele olhou para sua mão, sua expressão deixava claro a sua incerteza. Durante um tempo, ele observou encabulado as palmas das suas mãos. Os olhos dele estavam inchados, com resquícios de lágrimas.

Levantei-me. Estava exausto com o que acabara de acontecer. O homem também se levantou cambaleando de um lado para o outro, até que caiu de novo.

Dessa vez ele engatinhou até que chegasse perto da garrafa, seu corpo não seguia mais suas ordens e então ele tateou até que conseguiu pegar a bendita da garrafa abrindo um sorriso alegre com sua vitória pouco glamourosa. O senhor bebeu um pouco de álcool e voltou a dormir, fazendo um alto barulho de baque ao cair no chão. 

A polícia chegou primeiro. Alguns policiais uniformizados se aproximaram ao me ver com as mãos manchadas de sangue. 

— Olá, sou Otávio, do departamento de Polícia. Posso perguntar se você foi a pessoa que relatou isso? — um policial perguntou ao que mostrava seu distintivo. Não disse nada, mas acenei concordando. 

— Você pode contar sobre todo o processo que levou à sua ligação para nós? — O policial de boné tirou seu aparelho digital de notas, se preparando para digitar cada detalhe.

Ele olhou para o bêbado deitado do chão dormindo, abraçando sua garrafa. Com a chegada deles, vieram algumas pessoas curiosas, observando atentamente enquanto alguns tiravam fotos e outros fofocavam.

— Em que estado ele estava quando você o viu pela primeira vez? — o policial Otávio continuou. 

— O rosto dele estava pálido. Suas roupas eram uma bagunça. Ambas as mãos dele estavam machucadas. Havia outros ferimentos menores no resto do corpo, embora eu não os tivesse visto corretamente. Ele só estava com um par de sapatos. Havia muito sangue no chão, principalmente sob a cabeça do bêbado. Parecia que o homem tinha chorado, ele despertou e logo desmaiou novamente quando ingeriu outro gole de álcool... acho que é tudo que lembro. — Tentei o meu melhor para me lembrar de tudo o que podia.

O policial pareceu inquieto depois de ouvir o que disse. Sei que a maioria das pessoas teria apenas ido embora se visse tal situação, ou no mínimo teria ligado para o socorro e imediatamente ido para casa. No entanto, fui capaz de descrever a cena com calma e detalhes. Suas suspeitas estavam crescendo contra mim, mesmo que não houvesse fundamento.





Betagem por: Arabella [WD]

A Década Depois Da PrimaveraOnde histórias criam vida. Descubra agora