Dois dias se passaram, o corpo de Liz foi cremado - esse era um dos desejos dela, tivera muitas conversas com Moretti sobre o que queria que fosse feito após sua morte, eles viviam sempre sob esse risco, era bom preparar tudo -, Moretti se encontrou com alguns membros da resistência, mas disse que precisava de um tempo sozinho antes de planejarem qualquer nova operação. Ele e Pietro foram para um lugar secreto, surpreendentemente bonito, era uma casa simples e aconchegante que ficava em frente a um lago. Foram para lá com a promessa de consertar o aparelho de viagem multiversal, mas não tinham começado o trabalho ainda, passaram os dois dias pensando sobre a morte de Liz. Nenhum deles conseguia lidar com isso.
Quase não conversaram desde a morte da garota. Até que, em determinado momento, Pietro acordou e percebeu que estava sozinho na casa, se preocupou por um momento, mas ao sair viu que Moretti estava perto do lago, contemplando-o. A contemplação dele só cessava em alguns momentos, quando ele jogava pequenas pedras no lago. Pietro se aproximou e o observou, em um silêncio que logo foi interrompido.
- Ela tava errada. - disse Moretti, sem olhar para Pietro. Pietro notou que a voz dele demonstrava uma grande melancolia.
- O quê?
- A Liz, ela tava errada.
- Sobre o quê?
- Sobre o meu plano. - pegou uma pedra do chão e a jogou no lago - Ela achou que eu tinha a mandado pro seu universo para que ela te achasse e te trouxesse aqui pra me salvar, não foi nada disso.
- Então qual era o seu plano?
- No aparelho existe uma maneira de visualizar algumas imagens de outros universos, assim eu consegui ver como eram alguns deles, inclusive o seu, vi ele na época que estava infiltrado no laboratório do governo. Enfim, eu não a mandei pra um universo onde ela pudesse encontrar uma versão de mim disposta a ajudá-la, não existe nada de especial em você ou no seu universo. - Moretti olhou para Pietro pela primeira vez desde o início da conversa - Não se ofenda com isso, ninguém é realmente especial nesse multiverso. Enfim, eu mandei ela para lá simplesmente porque era um mundo pacífico e tranquilo. Não era pra ela voltar, meu plano era que ela ficasse lá e finalmente tivesse uma vida feliz e tranquila, longe desse mundo horrível.
- Se ela tivesse ficado lá, nada disso teria acontecido, mas ela te amava demais ao ponto de atravessar um universo pra tentar te salvar. E ela conseguiu.
- Uau, ela me salvou! - Moretti usou um tom melancólico de ironia - A que custo? Valeu a pena ela sacrificar a própria vida por mim?
- Bom, se você é como ela dizia, talvez tenha valido.
Moretti voltou a olhar o lago, o silêncio prevaleceu novamente por alguns segundos. Até que ele disse:
- Ela te contou como me conheceu?
- Não exatamente, mas disse que você salvou ela.
- A mãe dela morreu quando ela tinha 12 anos, meu pai morreu quando eu tinha 13 anos, ambos de forma semelhante. Meu pai morreu por guardar algumas tecnologias que o governo proibia a população de ter. Depois da morte dele, eu comecei a fazer qualquer coisa que fosse de certa forma rebelde, na minha mente da época, irritar pessoas ligadas ao governo era uma forma de me vingar, olhando agora não faz muito sentido. O que um dia viria a ser a resistência, começou quando eu e mais algumas pessoas começamos a fazer com que a população tivesse acesso às tecnologias proibidas.
- Como a Liz entra nisso?
- Eu não acreditava que poderíamos mudar algo, eu só fazia isso porque eu odiava o governo global e atacá-lo me dava um certo propósito, tudo que eu conhecia era raiva, ódio e dor. Até que um dia, eu vi um guarda correndo atrás de uma garota, ele conseguiu encurralar ela em um beco, provavelmente ela morreria ali, mas eu consegui chegar a tempo e golpeei ele por trás, não o suficiente pra matá-lo, mas pra derrubar ele. Liz estava com um dos arquivos da mãe dela, era algo que o governo queria destruir, mas ela conseguiu fugir com ele. Enfim, quando eu olhei para ela, eu me encantei, tinha algo naquela garota que fazia eu sentir que realmente poderíamos mudar alguma coisa, era uma mistura de inocência e de rebeldia, um equilíbrio entre doçura e ódio. Olhar pra ela me fez sentir esperança, pela primeira vez.
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A Infrutuosa Busca pelo Horizonte
Science FictionPietro, um jovem solitário, conhece uma garota chamada Liz que revela a ele que é de um universo paralelo. No universo de Liz, ela e uma versão alternativa de Pietro fazem parte de uma resistência contra uma ditadura que dominou o mundo inteiro. No...