O Caldeirão de Ymir

Adelheid

 As notícias da gravidez de minha mãe correram pelo povoado de Askvoll, meu avô não queria aceitar que a filha que ele mais amava agora era uma desvirtuada, uma "meretriz", como um dos amigos de meu avô a chamou enquanto bebiam no grande salão.

- Ela merece é a morte! – Um dos homens dizia, ele era um velho barrigudo que vivia tentando pegar as serviçais de meu pai.

- Tem razão Sigurd! Minha filha é uma desonra. Convoque todos os habitantes de Askvoll, em um mês, minha filha será decapitada em praça publica.

As notícias correram tão rápidas que através de navegantes chegaram aos ouvidos de Konungr Solveig. Ele era um homem tão bondoso que sentia a necessidade de interceder por Kristen. Mesmo ela não o amando como ele desejava, sentia que precisava protegê-la e faria o mesmo com a criança, assumiria como seu filho e lhe daria o título de seu herdeiro, teria alguém para ser o futuro Konungr de Fedje.

Enfim, o mês passou rápido e a noite do noite do assassinato de minha mãe chegou, as duas irmãs e minha avó imploravam para que meu avô tivesse pena. Meu avô estava com a alma escura e cheia de rancor. Somente um milagre seria capaz de salvar a alma da pobre jovem.

Caminharam até a praça e lá estava a população de Sogn og Fjordane, algumas pessoas imploravam para que o konungr tivesse clemência pela sua filha, outro, porém gritavam para que houvesse sangue. Enfim o machado de Gaël estava levantado, os olhos do homem brilhavam como se uma força maligna tomasse conta de sua alma , estava prestes para matar a sua própria filha quando uma voz soou. - PARE! – Todos se voltaram e viram atravessando por entre a população um homem de idade. Ele estava devidamente vestido como se estivesse indo para uma guerra, atrás dele seguiam dois jovens altos, musculosos com capacetes com chifres enormes em suas cabeças.

- Sol... Solveig! – Meu avô disse ao ver o konungr o qual Kristen havia sido prometida, deixou cair o machado. – O que quer?

- Poupe a vida da garota, eu caso com ela e assumo a criança. – Ele disse voltando seus olhos para a jovem que estava em lágrimas. – Não vale a pena. Eu assumo tudo.

E foi assim que aconteceu, minha mãe acabou se tornando a soberana de Fedje e meses depois eu nasci e me tornei a Adelheid, a filha de Kristen e Solveig.

Entretanto eu sabia sobre a história de minha mãe e do homem misterioso, minha mãe dizia que sempre pensava nele e que um dia esperava vê-lo. Eu sabia que Solveig não era meu pai, porém o amava muito. Seu sobrinho Björn também possuía um filho que se chamava Ragnar. Crescíamos juntos e nossos pais acreditavam que um dia podíamos nos unir em matrimônio e juntos governar Fedje.

Eu possuía um amigo, ele se chamava Olaf, o pai dele era um dos antigos membros da batalhas travadas por Solveig, havia sido seu braço- direito por muitos anos até adoecer. Olaf era o irmão mais velho de quatro irmãos e desde os 12 anos ajudava na cozinha do castelo em troca de comida para si e seus irmãos. Muitas vezes eu escondia pedaços de comida para mais tarde entregar ao meu amigo. Minha mãe não via problemas nisso e nem Solveig, porém Björn não gostava, pois achava que minha aproximação com Olaf seus planos poderiam ser estragados.

E o tempo foi passando, Olaf e eu estávamos com 16 anos e a nossa amizade crescia ainda mais. Ragnar que havia voltado de suas viagens contava agora com 18 anos, seu pai acreditava que aquela seria a hora para a nossa união.

Eu não amava Ragnar, jamais me entregaria para alguém tão tirano. Entretanto minha mãe insistia, ela dizia jamais casaria com outra pessoa que não fosse Ragnar. Só que o meu amor por Olaf crescia cada dia mais, a nossa amizade era tão bela que começou a levantar suspeitas entre os vikings que acompanhavam Björn.

Certo dia ouvi uma conversa entre os criados, Ragnar estava indo até a choupana da família de Olaf e eu sabia que isso não acabaria bem. Ele iria

tentar confrontar Olaf, estava armado. Eu precisava salvar meu melhor amigo das garras desse monstro.

Fugi! Porém alguns dos aliados de Björn me viram e começaram a me perseguir. Escondi-me pelo caminho e por fim cheguei até a casa de Olaf. Ouvi gritos e logo a porta da pequena casa abriu-se e um casal saiu correndo com três crianças, eram os pais de Olaf e seus três irmãos caçulas, todos apavorados. O pai queria voltar para lutar pelo filho, porém a idade o atrapalhava, já não era mais o mesmo Ulf que lutará anos ao lado de Solveig.

Assim que me viu a mulher correu em minha direção soluçando dizendo que o filho estava condenado. Meu coração palpitava desacelerado, precisava fazer algo.

Peguei um machado que o pai de Olaf havia usado em suas batalhas, eu não sentia o peso da arma e muito menos sentia medo de usá-la. Corri até a porta da casa e lá estava Ragnar com a sua lança apontada, seus olhos azulados por baixo do elmo brilhavam intensamente, acuado em um canto estava Olaf. Seus olhos encontraram os meus e a sua boca descreveu um "saia daqui". Era claro que eu não sairia. Ragnar preparou-se para matar Olaf quando de repente senti uma força enorme dentro de mim e uma voz masculina e dominante dizendo "agora filha da água do solo" e então eu acertei Ragnar.

- Adelheid! - Olaf sussurrou. - O que você fez?

Pedi para que ele saísse, os vikings estavam chegando. Ele se aproximou e me beijou, depois saiu correndo enquanto de longe eu ouvia os gritos dos bárbaros. Deixei o corpo inerte no chão e me coloquei de pé com o machado ainda em mão, não temia pelo meu destino. Era como se eu estivesse esperando por aquilo há anos. Foi então que senti uma dor enorme e uma lança de madeira atravessava meu peito.

Ouvi gritos de minha mãe que chegará ali juntamente com Solveig e Björn. O velho konungr discutia com seu sobrinho, um dos homens dele havia

me acertado uma lança. Björn seria exilado com sua família para uma terra longínqua. Meu corpo deveria ser levado para ser sepultado em Askvoll, era desejo de minha mãe que aos prantos aninhava minha cabeça. Dei um leve suspiro e sorri, em breve conheceria meu pai. Então foi assim que morri ali mesmo no chão gelado.