capítulo dois.

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Kara deu uma olhada no muro do jardim. Ia conseguir. Se agarrasse a videira que subia pelos tijolos, apoiasse o pé naquela reentrância por trás das flores roxas e alçasse o corpo para cima…
Estaria no alto e passaria para o outro lado num piscar de olhos.
Era questão de honra, também de habilidade. Até que não tinha sido em vão subir em todas as árvores do palácio.
O único porém, era que o vestido de noiva não facilitava as coisas. A Rainha Lillian tinha escolhido um modelo simples, mas de tecido pesado e anquinhas amplas.
Pois desaprovou o vestido que Kara havia trazido consigo de Krypton, já que de acordo com ela a moda na Irlanda era totalmente diferente daquela que havia vivido por quase 22 anos.
A contragosto, Kara concordou com a Rainha, já que esse vestido permitiu mais liberdade de movimentos do que aquele trazido por ela.
Kara cerrou os dentes, meteu o pé no nicho, segurou-se na videira no ponto mais alto que conseguiu e tentou se puxar.
Nada.

— Maldição dos infernos — resmungou.

Podia tentar de novo. Ia fugir daquele maldito palácio, mesmo que isso lhe custasse a vida. Ninguém lhe dizia nada sobre a princesa herdeira.
Perguntou à mãe dela, perguntou àquele tal de Brainy, que a seguia desde o momento em que ela pisou no palácio, perguntou à costureira que agira como se aquele vestido de noiva repugnante fosse pura elegância, mas não, ninguém lhe dizia nada de relevante.
Ela era bonita?
Era bondosa? Atlética? Gostava de ler?
Talvez fosse feia. E por isso que ninguém lhe dizia nada.
Tinham lhe mostrado uma pintura, pintura.
Como se ainda vivessem no século XIX.
Todos sabiam que os pintores miniaturistas eram pagos para tornar as pessoas mais atraentes do que realmente eram. Principalmente se envolvia a realeza. Não custava nada uma foto da princesa. Só uma maldita foto. Tentou procurar por algo na internet, mas a última foto que a Casa Luthor postou da princesa foi quando ela tinha quatro anos. Desde então, nada.
Ela podia suportar a feiura. Afinal, a beleza residia no interior, não era verdade?
E o que aquelas pessoas (Brainy e as costureiras, que teoricamente trabalhavam para ela) tinham a dizer de suas perguntas?
Nada. 
Brainy respondeu primeiro que a princesa era a princesa; depois, que era a futura soberana da Irlanda; e, por fim, que ela havia se tornado sucessora ao trono aos quatro anos.
Princesa, herdeira, sucessora.
Três sinônimos que não revelavam absolutamente nada.
E a costureira? Quando Kara perguntou se a princesa era cruel, ela respondeu: “Terão lindas filhas juntas, Vossa Alteza.”
O que ela queria dizer com aquilo?
Kara estava decidida a fugir. Não importava que o voo de Argo até ali tivesse sido terrível a ponto de fazê-la vomitar seis vezes em sua mãe. Ia voltar para sua casa, mesmo que isso lhe custasse a vida.
Além disso, sua mãe merecia cada gota de vômito. Para começo de conversa, toda aquela situação era culpa dela, que havia realizado um contrato de casamento sem a autorização dela ou de sua irmã, que era a verdadeira Rainha de Krypton. Sua mãe era somente Rainha-mãe agora, não tinha autoridade para nada, mas mesmo assim ela agiu pelas costas das filhas.

Deu alguns passos para trás. Talvez devesse correr para pegar impulso.

— Olá, minha senhora.

O coração de Kara quase saiu pela boca. Ela não imaginava que havia mais alguém no jardim. Uma mulher (pouco mais velha que ela, mas ainda jovem) tinha saído por uma porta que ela não havia notado.
Observou-a rapidamente e dispensou de imediato a ideia de que ela trabalhasse no palácio e tivesse sido enviada com o fim de arrastá-la de volta para a capela. Era óbvio que se tratava de uma das convidadas: seu vestido cinza-prata era extremamente bem-feito. Seu cabelo era preto, usava um penteado solto com ondas e uma trança dupla no topo, escolha de estilo aprovada por Kara. As sobrancelhas também eram escuras, mas o que mais lhe chamava a atenção em seu rosto era a máscara de porcelana que escondia toda a mandíbula dela. Como se ela fosse uma espiã secreta que não podia mostrar o rosto.
Fosse outro dia (qualquer outro dia), Kara teria considerado o visual bastante interessante. Mas não hoje. Não tinha tempo para assuntos frívolos.

The Mysterious Princess | versão karlenaOnde histórias criam vida. Descubra agora