Capítulo 1

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É impressionante a capacidade do Homem de construir armas e reunir exércitos para lutar por uma causa comum, mesmo que isso possa causar uma aniquilação em massa de nossa espécie, a ideia de governar, de ter glórias e triunfos de tal forma que marquem nomes , rostos e gerações nas páginas dos livros de história continua a ser tentador, tanto para mim como para qualquer outro homem que tem o mínimo de ambição.

O ano, meu caro leitor, é 1912, a província austríaca da Boêmia se levantou em uma revolta separatista, civis pegaram em armas e formaram um exército, e alguns formaram um grupo terrorista, autodenominada Mão Negra, mas esse não é o ponto desta narrativa, pelo menos não sobre os terroristas, mas sobre a guerra.

Apesar de ser dotado do conhecimento mais racional que um homem pode ter e abrir mão da virilidade que qualquer um tem, tornei-me um soldado da causa da Boêmia, deixei meus livros e papéis de meu escritório em meu apartamento em Karlstadt an der Aache e fui para o quartel da infantaria para me alistar. Lembro-me muito bem da euforia que contagiava os jovens voluntários, ansiosos por irem ao campo de batalha e mostrar aos austríacos quem realmente era o povo boêmio, infelizmente poucos sabiam o que realmente era um campo de batalha.

Saímos do quartel no final da tarde, no total passamos por mais de trezentos homens, armados com fuzis e carregando cantis e munições. Eu, além do equipamento padrão, carregava comigo um relógio de bolso, presente de meu avô, um objeto útil, pequeno, portátil e, em letras douradas, levava meu nome, Wilhelm Lehrer Soldat.

Nossa força era composta majoritariamente por infantaria, a carga era transportada por carroças e alguns poucos caminhões, mas, apesar de algumas adversidades, nada parecia desanimar os entusiasmados jovens soldados cantando canções patrióticas e locais. Nossos uniformes eram tão novos quanto seus usuários, nossas armas eram tão fortes quanto aqueles que as usavam, mas a guerra era tão antiga quanto o tempo, apenas o fato de nosso caminho para a batalha ser o mesmo dos soldados na guerra de 1880 mostra que esta guerra também foi travada por outras gerações de nosso povo contra a tirania austríaca e a negligência, e estávamos prontos para manchar nossos uniformes com sangue.

Caminhamos um dia inteiro até montarmos acampamento. O acampamento foi montado em uma grande clareira de uma floresta a poucos metros da borda da floresta com uma planície cortada por um rio e que separava nossa floresta de outra, provavelmente onde estavam as tropas austríacas. O limite do acampamento era defendido por uma trincheira armada com metralhadoras e arame farpado, era teoricamente impenetrável, mas não esperávamos um ataque porque seríamos nós a avançar contra o terreno inimigo, o ataque aconteceria dois dias depois de levantarmos acampamento.

Os dois dias que antecederam o combate demoraram a passar, de modo que pensei que o avanço havia sido adiado, mas isso foi uma mera impressão, a batalha aconteceu exatamente dois dias depois de levantarmos acampamento. Os soldados em seus uniformes azuis foram colocados em posição, armados com seus rifles e armados com ansiedade e ânsia de batalha. Quando os ponteiros do relógio bateram meio-dia, a ordem de marcha foi dada, demoramos alguns minutos para chegarmos à planície e vermos pela primeira vez o inimigo em seus uniformes brancos e armados com as mais modernas armas e usando o rio como uma trincheira.

Tínhamos andado alguns metros quando as primeiras balas começaram a voar sobre nossas cabeças ou em nossa direção, de modo que alguns de nossos meninos foram atingidos de forma que a bala atravessou seus crânios ou se cravou em seus cérebros jovens. O clarin tocou a ordem: Carga, as baionetas viraram-se para o inimigo e aumentamos a velocidade até corrermos para o rio e para o inimigo. O embate foi brutal, os homens tombaram no primeiro embate entre exércitos e a sinfonia que começou com clarins e gritos de bravura evoluiu para sons de tiros, gritos de dor e golpes de baioneta contra carne e músculos, a mudança de tom da sinfonia tornou-se palpável quando a água cristalina do rio ficava vermelha e os corpos empilhados nas margens, mas a cada golpe e tiro contra o inimigo avançávamos em direção a outra mata, cruzando o rio e a planície.

Do meio-dia quando entramos no campo de batalha até a batalha entrar na floresta oposta, foram três horas de uma batalha sangrenta, a cada metro avançava deixou um rastro de cadáveres e poças de sangue e eu, meu caro leitor, estava vivo, tendo feito algumas vítimas do meu heroico patriotismo, mas ainda vivo, milagre ou não.

Nesse ponto da batalha tomei a liberdade de narrá-la com mais detalhes, afinal foi essa parte da batalha que mudou todo o meu rumo. As tropas austríacas, apesar de estarem em retirada, continuaram a lutar valentemente infligindo pesadas baixas ao exército da Boêmia. A luta agora era entre as árvores da floresta, a falta de luz graças às copas das árvores fazia tudo um pouco mais difícil e a falta de espaço ainda mais brutal. Eu estava cansado, meus músculos pediam misericórdia, mas não consegui parar quando o inimigo continuou tentando enfiar uma baioneta em meu peito; nesse momento entrei em uma luta corporal feroz com um soldado inimigo, a luta tomou proporções mais agressivas de forma que nos jogou no chão e antes que ele pudesse pegar sua arma, aproveitando a queda, peguei meu fuzil com sua baioneta e atravessei o corpo inimigo, nesse momento me permiti olhar nos olhos do mais novo cadáver no campo de batalha, ele tinha um rosto bonito, olhos azuis e um bigode loiro assim como seu cabelo, em tempos de paz eu hesitaria em querer ver morto este grande exemplo de beleza humana. Acho que esta última afirmação foi resultado da influência de meus demônios, mas vamos esquecer isso por enquanto. Mas antes que pudesse me levantar, levei uma pancada na nuca e caí no chão desacordado, estaria morto? Não, pelo menos não tão cedo.

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