14| Confidências

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Alerta de gatilho, o texto a seguir contém menção a violência.


― Olá, senhorita ― declarou o senhor Uckermann enquanto retirava seu chapéu para cumprimentá-la. ― Que surpresa vê-la aqui.

― Pois eu digo o mesmo ― respondeu a dama de vermelho espantada. ― O que o traz de volta a Belmonte?

― Eu precisava resolver uma última coisa.

― Outro assassinato? ― ela mencionou em um tom brincalhão, tentando esconder a tensão do reencontro.

― Depende do ponto de vista, mas é um mistério que aguardo ansiosamente por sua revelação. ― Ele a encarou por um breve momento, deixando transparecer uma certa expectativa.

Por um segundo, a moça cogitou que ele se referia a ela. Na verdade, tinha quase certeza, já que Christopher a examinava cauteloso, como se buscasse as melhores palavras. De repente, aquela dificuldade de respirar ressurgiu e a sua boca ficou seca.

― E a senhorita? Irá viajar? ― ele comentou ao notar as malas do lado dela.

― Eu? ― A mulher franziu a testa, reparando em suas coisas. ― Hã... Sim ― ela disse confusa.

― A senhorita não parece muito convencida sobre isso. ― O investigador não afastou o olhar do dela. ― Será que me acompanharia até o armazém? Estou louco para tomar uma água.

― O meu trem partirá em meia hora.

― Eu trago a senhorita a tempo. ― O rapaz ofereceu seu braço, esperando que seu gesto fosse aceito.

Seu instinto era de permanecer na estação, porém seus pés já se moviam para acompanhá-lo, talvez em seu âmago desejava encerrar esse mistério de uma vez. Estava cansada de guardar o segredo, de sempre viver nas sombras com medo. Quem sabe, não foi por essa conversa franca entre os dois que a dama de vermelho esperou todo esse tempo?

Logo após pedir sua bebida, Uckermann e a moça se acomodaram nas cadeiras do Armazém quase vazio a essa hora. A agonia dela aumentava a cada instante de silêncio, consumida pela sua curiosidade, decidiu quebrar o impasse:

― O senhor não explicou de forma clara o que o trouxe de volta à cidade.

― Você. Eu não consegui assistir ao seu sofrimento sem fazer nada. ― Sua voz transbordava empatia.

Com algumas lágrimas brilhando em seus olhos, a mulher estendeu a mão em direção a ele, aceitando o apoio que ele lhe oferecia.

― Essas semanas em que passei fora, investiguei sobre a senhorita ― o homem continuou seu esclarecimento enquanto acariciava a pele macia dela. Antes de prosseguir, limpou a garganta. ― Eu descobri o mistério que a envolve.

Ela fechou os olhos, processando a revelação do rapaz, não era capaz de encará-lo.

― E o que o senhor descobriu? ― sussurrou, sentindo-se exposta e vulnerável.

― Seu nome verdadeiro é Dulce Maria, não é?

Surpreendida, a moça arregalou os olhos, aquele simples ato evocou memórias angustiantes. Seu corpo petrificou no assento, apenas balançou a cabeça concordando.

― O que mais o senhor sabe?

Christopher observou o estado dela, percebendo que precisava abordar o assunto de uma maneira mais sensível, pois mexeria com suas emoções fragilizadas. Ele coçou a nuca, desejava que ela reconstruísse sua vida e não fugisse novamente. Após um breve momento de reflexão, escolheu começar por algo pendente.

― A discussão que ocorreu entre você e o senhor Nogueira possui alguma relação com o que aconteceu no seu passado?

― Sim, eu havia pedido demissão do Burlesque quando ele anunciou que dois investidores de Villa de Santa Fé chegariam na cidade. ―  Dulce fez uma pausa, lembrando da cena. ― Achei que seria reconhecida por um deles. ― Suspirou abatida. ― Nós dois discutimos e eu deixei escapar o motivo de ter fugido daquele maldito lugar.

A Dama de VermelhoOnde histórias criam vida. Descubra agora