Cap. 3

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O carro permaneceu em silêncio por mais uma hora de viagem, até que em uma curva, algo nos chamou a atenção. Uma barreira de carros.

Seria normal ter carros parados na estrada, encontramos alguns pelo caminho. Mas a forma como os carros estavam organizados, bloqueando toda a estrada...

"Saqueadores" eu falo em voz baixa para Joel. Eu sei que são saqueadores, já vi isso acontecer em outros lugares, e os relatos que ouvi também contavam essa tática; eles obrigam os carros a pararem, abordam, e o que acontece em seguida depende muito de quem pensa mais rápido.

No momento em que chegamos no limite da barreira, vemos um homem e uma mulher saindo por detrás de um dos carros. Joel rapidamente saca a sua arma, mas antes que ele pudesse apontar para eles, eu coloco a mão sobre a sua com o intuito de impedir sua ação, falando baixo, "Não."

"Que diabos você pensa que está fazendo?" Ele desvia o olhar rapidamente em minha direção, não querendo perder contato visual com o casal que se aproxima do carro. Ele tenta se soltar da minha mão, mas eu o seguro com mais firmeza. Seus olhos transmitem uma mistura de raiva e confusão. "Não aponte a arma, pelo menos não agora", murmuro entre dentes, tirando minha própria arma do coldre e a escondendo em um local de fácil alcance. "E siga o que eu disser"

Percebo claramente o quão tenso Joel fica. É evidente que ele nunca se viu em uma situação em que alguém tenta ditar as regras durante um confronto, algo em que ele sempre atiraria primeiro e perguntaria depois. Seu olhar furioso em minha direção deixa isso bem claro. "Apenas... confie em mim. E se não der certo, atire." Eu digo, e não volto a olhar para Joel para checar se ele aceitou os termos ou não.

Ser uma mulher que viaja sempre sozinha, carregando coisas perigosas que não podem cair em mãos erradas me rendeu certas habilidades de sobrevivência que um homem provavelmente não conseguiria utilizar. Quando me via em situações similares a esta, caindo em emboscadas pelo caminho, eu sempre tentava convencer as pessoas a simplesmente me deixarem ir. Não posso dizer que funcionou em todas as vezes, mas pelo menos era algo que me concedia mais tempo para pensar nos próximos passos para sair daquela situação. Baixar a guarda era algo que eu sabia fazer bem, e usava isso ao meu favor. Principalmente quando tinha mulheres junto. De uma forma ou de outra, apesar do mundo ter virado um verdadeiro inferno, nós mulheres ainda tínhamos um certo companheirismo velado umas pelas outras.

Mas claro que se não funcionasse, se não acreditassem, a violência era a única saída. O meu plano era esse, e espero que Joel me acompanhe. Pelo bem de nós dois. "Tente ver se há mais pessoas." Eu murmuro para Joel quando o casal chega mais próximo do carro.

A mulher aponta a arma diretamente para Joel, parando próximo da janela do motorista, enquanto o homem aponta sua arma para mim. Eu imediatamente levanto as mãos trêmulas, para mostrar que não estou armada.

Tento passar a maior expressão de desespero e angústia que sou capaz de fazer, e falo com a voz assustada "Por favor... N-Não temos nada, só queremos passar, por favor..."

O homem continua nos encarando, seus olhos escaneando Joel e a mim. Um sorriso sarcástico se forma no canto da sua boca. "Vocês tem um belo de um carro para quem diz não ter nada", ele continua olhando cada centímetro do carro. As malas com o carregamento estão embaixo do banco, e espero que ele não consiga enxergar.

"Conseguimos esse carro com muito custo, é a única forma de conseguir chegar até o nosso filho... Por favor..." Agora lágrimas escorrem dos meus olhos, e eu viro para olhar para Joel e coloco uma mão na perna dele. Ele está mais tenso que antes, os nós da mão estão brancos segurando o volante. Eu fungo o nariz e volto meu olhar para a mulher ao lado da janela de Joel "Ele está doente, é a nossa última chance de ver ele, por favor..."

A mulher oscila o olhar entre mim e o outro homem, exibindo uma expressão de dúvida e compaixão. Sua inquietação começa a se manifestar, enquanto seus olhos se fixam intensamente no homem ao lado da minha janela.

A mulher começa a alternar o olhar entre mim e o outro homem. O olhar dela é de dúvida, uma quase compaixão. Ela começa a ficar inquieta.

Bingo.

"Não estamos levando nada de valor para vocês, deixem a gente ir." Joel fala pela primeira vez. A voz dele é quase um murmúrio. Ele está com uma expressão neutra, tentando ao máximo simplesmente não estourar a cabeça dos dois saqueadores.

Eu continuo a olhar para a mulher, com o olhar mais devastador possível, falo um por favor apenas com os lábios para ela, percebendo que ela começa a ficar desestabilizada. "Chris, não é melhor..." ela fala para o seu companheiro do outro lado do carro, a arma apontada para Joel começando a descer.

Mas ele apenas ignora o apelo da mulher, e continua checando o resto do carro. Ele não parece se importar com a minha história. Não acredita ou não se importa, tanto faz. Ele coloca a cabeça para dentro da janela da porta de trás, o qual teve o vidro estilhaçado, e no momento em que ele vê as malas escondidas, solta uma risada. E ali acabou.

Não funcionou.

No exato momento em que ele avança para abrir a porta do carro onde está o carregamento, lanço um olhar rápido para Joel, fazendo um aceno sutil com a cabeça. Ele entende rapidamente os próximos passos, e com um movimento rápido, pego minha arma já engatilhada e disparo contra a cabeça do homem. Joel atira na mulher ao seu lado quase que simultaneamente.

"Há mais dois homens no carro da frente." Joel diz sem hesitar, sua voz neutra e firme, como se ele não tivesse acabado de dar um tiro à queima roupa em uma pessoa. Rapidamente, em resposta ao barulho repentino dos disparos, os dois homens que Joel havia visto saem de trás de um carro, atirando contra nós. Joel tem uma mira absolutamente boa e consegue acertar um dos homens rapidamente. O outro avança atirando, estilhaçando o espelho retrovisor. Joel erra, mas eu consigo acertar antes que ele conseguisse se aproximar ainda mais. Tudo isso deve ter acontecido em menos de 20 segundos, mas foi o suficiente para fazer meu ouvido zumbir de adrenalina, e meu coração quase sair do peito.

Eu e Joel ficamos em silêncio por mais alguns minutos, com as armas a postos no caso de mais um saqueador sair do esconderijo. Como não ouvimos mais nenhum barulho, eu solto o ar que nem percebia que estava segurando, e abaixo a arma. Joel faz o mesmo alguns segundos depois, relaxando o corpo contra o banco do carro e respirando fundo.

"Bom, isso não saiu exatamente como eu tinha planejado, mas pelo menos conseguimos ganhar tempo." Eu quebro o silêncio, guardando minha arma no coldre e secando minhas lágrimas falsas com as costas da mão. Minhas mãos ainda estão um pouco trêmulas. Matar alguém nunca deixa de ser um trabalho difícil, por mais fácil que acabemos de fazer parecer. É algo que vem junto de querer continuar sobrevivendo, isso eu aprendi a muito tempo. E Joel também, com certeza.

Enquanto arrumo minhas coisas novamente, percebo que Joel está olhando em minha direção. Ele tinha um sorriso no canto dos lábios, e uma expressão de quase diversão em seu olhar, uma expressão que nunca imaginei que iria ver no rosto dele. O olhos dele em mim me deixam um pouco desconcertada por algum motivo, me fazendo sentir um frio na barriga.

"Foi uma boa tentativa, apesar de tudo. Eu não pensaria em ganhar tempo." Joel admite, seu comentário sendo genuíno. Ele volta a ligar o carro e começa a dar ré, já que não conseguiríamos seguir em frente por causa do bloqueio. "Acho que a gente pode funcionar."

A forma como pensamos rápido e quase que juntos durante o confronto acabou me trazendo um pouco mais de tranquilidade. Talvez esse homem seja tão bom quanto Jonathan diz, e talvez nós possamos formar uma boa dupla. Talvez.

"É, parece que sim." Eu respondo ele com um sorriso. "Você até que tem uma boa mira, é bastante útil." Meu comentário tem uma pitada de provocação, mas é algo da minha natureza, não consigo evitar.

Joel solta o que parece ser uma risada, mas de uma forma contida. "Até que tem uma boa mira", ele repete baixinho como se debochando do que eu falei, balançando a cabeça e voltando a olhar para mim com o canto do olho.

Mas dessa vez ele não está irritado de verdade.

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⏰ Última atualização: Jun 21, 2023 ⏰

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