Quem já jogou WAR , ou tem conhecimento de geografia, sabe que a Austrália fica num continente distante, Oceania.
São 24 horas de vôo, lógico que tem escalas.
Minha mãe está exausta e, uma hora, o jet leg ia bater.
Quando foi a noite, quando ela já tinha dado mil presentes, conversado aos montes, ela se retirou pra descansar.
Fiquei com ela em seu quarto, deitada ao seu lado. A pedido dela...Eu sei que ela me ama, me ama muito, isso me emociona, não sou feita de ferro!
Há dois anos atrás, eu estaria colada com ela com uma força, como se pudesse entrar em seu coração, ou seu útero. Eu estou em seu coração, mas até então, não sabia que nunca estive no outro lugar.
Foram 2 anos de descobertas que me destruíram, construíram um novo eu, pra então, me destruir novamente.
Quando senti sua respiração mais pesada, levantei.
A cobri, com aquela sensação, metade amorosa, metade inquisidora.
Quem era aquela mulher?
Quem eu era?Desci pro meu quarto, tomei coragem e liguei meu celular.
Como estava no silencioso, só via os pop ups surgirem.Vou na janela da Safira. Nem leio as várias mensagens, sei que estou ausente.
Apenas ligo, pergunto se ela topa me encontrar no lugar de sempre.Ela responde que sim e desligo.
Respiro fundo e olho pro quadro com minha foto. Aquela alice da foto não existe mais.
Tomo banho, visto qualquer coisa que encontro.
Short jeans, blusa grande da Adidas roxa , chinelo.Passo uma base suave, pra cobrir as olheiras enormes que esses dias me trouxeram.
Pego a moto e desço.
Algo por volta das 22:30 hs.
O restaurante vegano ainda estava aberto, mas nesse horário, haviam pessoas bebendo chopp, uma música ao fundo. Pessoas se divertindo. Como haviam aquelas mesas de madeira altas , com bancos do lado de fora, e uma estava vazia, parei ali.
A Rocinha não para nunca.
Do outro lado da rua, do canal, o alvoroço de bandidos em suas motos. Reconheci o Motoboy, mas eu estava meio camuflada, já que á noite, todos os gatos são pardos.
A essa altura do campeonato, aqui na comunidade , já sabem quem eu sou. Entendo isso pelos olhares, cochichos. Mesmo assim, não me afeta...nunca afetaria, eu sou só mais uma! O único diferencial era a "sorte" de ter sido acolhida pela família mais poderosa do lugar.
Sorte?Dependia do ponto de vista...
Como sempre, atraída, vejo a figura do Ramon sair de dentro do bar do outro lado.
Não sei o que temos...Mas o magnetismo me faz olhar exatamente na hora que ele sai, olhando pra mim, sentada aqui, sozinha , no banco de madeira.Ele senta na moto, ao lado do Motoboy, que fala algo com ele, que abaixa a cabeça, ouvindo.
Um garçom se aproxima, me tirando daquela linha imaginária que faz a ponte entre nós dois. Eu e ele.
_Eu quero uma Heinneken, por favor! - Ele anota , e então... - Não! Me vê um suco de laranja puro!
O cara me olha, risca o papel e faz que sim com a cabeça.Olho de volta, o Ramon liga a moto e vejo o Motoboy emparelhar com ele. Ele novamente ouve o que o amigo diz , baixa a cabeça e me olha. Cara fechada.
O farol apaga, ele desligou a moto, mas fica lá.