Capítulo 4 desconhecida

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NARRADORA POV

O cheiro da taverna  era exatamente o mesmo da última vez que Helena estivera ali – álcool, suor e serragem da serraria que ficava nos arredores da cidade, trazida na sola das botas de trabalhadores grandes e corpulentos. Ela não tinha planejado passar no bar quando saísse do carro que chamara pelo aplicativo de motoristas, estava cansada, a viajem fora exaustiva Mas bastaram quinze segundos observando o centro escuro para lembrar que a cidade inteira fechava assim que o sol desaparecia, mesmo aos sábados. O hotel onde ia ficar com certeza não tinha licença para vender bebidas alcoólicas, e ela jamais conseguiria lidar com a os negócios sem um pouco de coragem líquida.

Depois de entrar ela pensou em desistir, iria chamar um táxi e seguiria para o hotel. Fazia cinco anos que não ia a Califórnia. Cinco anos que tinha deixado aquela cidade e agora havia retornado para fechar negócio e resolver as questões que a empresa de sua família era dona. Parou e observou que todas aquelas caras que se conheciam desde sempre, aquele clubinho do qual ela nunca sentira fazer parte, mas que ainda assim a fascinava. Desde que havia se mudado para Seattle  com o pai, ela com 8 anos, ele com uma aliança novinha no dedo, era assim, parecia que ela estava do lado de fora de uma casa iluminada e acolhedora, na chuva, batendo na janela. E tudo ficara ainda pior com a morte do pai, dois anos atrás, deixando Helena com uma empresa na qual ela não fazia a menor ideia de como administraria.

Helena respirou fundo e olhou para o balcão. Ficava a uns trinta passos de onde ela estava, um mar de corpos entre ela e uma bebida. Ela morava em Seattle. Era Presidente de uma empresa de segurança e tecnologia. Essa cidade trazia tantas recordações, sua família...

Ela tirou a jaqueta cinza e a largou por cima da mala. O ar úmido e alcoólico pareceu grudar em seus braços, mas era melhor que sufocar de casaco. Virando o corpo para encostar no menor número possível de pessoas, manteve a cabeça baixa e andou rápido até o bar. Ali, soltou o ar aliviada. O barman era um desconhecido, não alguém com quem ela havia estudado no ensino médio e que a encararia franzindo os olhos como se ela fosse um quebra-cabeça que ele não conseguia resolver. Ela era praticamente invisível nos tempos de escola, um fantasma com uma nuvem de cabelos escuros rebeldes e olhos castanhos que ela mantinha no piso de lajotas sujas, a gótica esquisita, enquanto outras meninas populares brilhavam como uma estrela no baile. 

– Uísque, puro – disse, deixando a mala ao lado de uma banqueta e apoiando os braços no balcão.

O cara – Ted, dizia seu crachá – sorriu, piscou para ela e serviu a dose com um gesto exagerado, despejando-o de uma altura de uns 60 centímetros. Ela ficou olhando para ele, tamborilando as unhas curtas pintadas de cinza no balcão reluzente. Ele colocou a bebida na frente dela e se apoiou no balcão. Cabelo bagunçado, barba aparada, olhos castanho-escuros. Provavelmente era bonitinho para quem apreciava a forma masculina. 

– Obrigada – disse ela, virando o copo. 

A bebida desceu queimando, aquecendo-a de um jeito que fez aquela maldita reunião suportável. Porém, ela sabia que não ia durar. 

– Você é daqui? – perguntou ele. 

Ela se segurou para não revirar os olhos. 

– Não faço seu tipo – disse. 

O sorriso dele fraquejou. 

– Não?

 – Não. 

– Acho que talvez faça. 

Helena bateu no copo, pedindo mais uma dose, e ele obedeceu de um jeito ainda mais exagerado que antes, lançando o copo e a garrafa no ar. Ah, como ela queria que ele tivesse derrubado tudo. Ao entregar-lhe a bebida, ficou olhando para ela com expectativa. Ela bebeu mais devagar desta vez, encarando-o com um olhar capaz de abrir um buraco na parede, na esperança de que ele corresse para longe. Ele não correu. 

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