Atinava-se Moo Ling em meio a roupas, perfumes caros, géis para cabelo, dentre tantos outros itens favoráveis à destacar aquilo que já lhe era belo. Mal conseguiu concentrar-se durante o dia, e claro, foi-lhe passado um grandioso sermão, qual igualmente fora ouvido meldiocremente. O coração acelerava em expectativas jogando-lhe uma má passada, já que nunca antes tivera essa experiência, ao menos não depois da adolescência.
"Acho que é a primeira vez que estou tão animado para um encontro onde uma garota não vai baixar a calcinha para me impressionar (pelo menos acho). Não acredito que passei até perfume. Me sinto com 15 anos novamente, não que eu tenha tido muitas oportunidades com uma bruxa controladora regulando minha vida."
Relembra então de momentos passados, algumas escapolidas, namoricos adolescentes e outras coisas causantes de brigas icônicas com sua tia Mercy Ling. Toda exposição e falta de privacidade afetaram-o terrivelmente, na adolescência, bem como também na vida adulta. Inclusive fizeram-no vestir-se de maneira discreta hoje, para não dizer furtiva. Como dizia a finada Mercy Ling: "Liberdade é só, e apenas, para quem não conhece o doce dos privilégios". Assim sendo, restava-lhe caprichar no perfume e nas rosas tão vermelhas quanto os lábios da mulher. Embora atrasar-se talvez não fora uma boa ideia. Necessitava acelerar o passo encaminhador ao seu destino.
"Talvez o buquê de flores para dois malucos que se conheceram dividindo comida de máquina seja um pouco exagerado, mas por ela vale."
Pensa enquanto olha as flores, já no local combinado e sorri sem dar-se conta.
"Me resta apenas torcer e saber quem é a 'garota da estação 6661"
Solta uma gargalhada não muito discreta, percebendo os próprios pensamentos.
"Parece até nome de um desses filmes toscos que eu atuária na adolescência".
Navegando em pensamentos, gargalhadas e recordos, desapercebe uma figura feminina e formosa bem atrás de si, sendo surpreendido pela mesma.
—Essas flores que estão perfumando tão bem, ou é você?
Vira-se sorrindo para a mesma fonte de sua recente alegria.
—Talvez seja eu, obrigado. E...
Perdendo o poder da fala, seus olhos viajam passeando em cada detalhe pelo corpo da mais nova, deixando literalmente com a boca aberta incapaz de concluir sua frase. Envaidecendo-a completamente em conjunto. Para isso ela se vestiu: deixá-lo boquiaberto.
—Sei! Deixa a baba.
Põe os dedos no queixo dele fechando sua boca delicadamente.
—Um vestido vermelho justo, com um decote a favor, valoriza os pontos fortes de uma garota. Sinta-se lisonjeado Sr. Ling.
—Pode acreditar que já me sinto. Vamos aonde exatamente essa noite m'lady?
Diz estendendo o braço que ela segura gentilmente.
—Rumo ao desconhecido e além!
"Acho que nunca tinha reparado como esse sorriso é lindo nela, talvez eu deva observar mais. Para obter respostas é claro."
Seguem até um local onde ela indica qual seria o prato principal da noite.
—Cachorro quente na praça com certeza não é algo do meu cotidiano.
—Pois tem passe livre ao meu sempre.
Fala já devorando grande parte do lanche numa só bocada, deliciando-se com a iguaria sem medo de perder o batom no processo, arrancando junto uma leve risada do seu companheiro.
—Encararei como uma nobre oferta para o pagamento também.
Não deixou passar sua chance de alfinetá-la . Algo dentro dele amava esse jogo, ela por sua vez jamais retrocederia ante tal desafio.
—Os costumes antigos dizem que os cavalheiros pagam para demostrar bons modos. Seria extremamente rude de minha parte tirar-lhe tamanho prazer. Assim, o recompenso c minha preciosa companhia que lhe é bem mais valiosa.
—Não está equivocada m'lady. Contudo, mudaram os tempos, e nós cavalheiros sedemos a vocês o prazer de contribuir com ditas despesas, enquanto as recompensamos com nossas humildes e corteses companhias.
—Tenta outra! Estou com a carteira zerada. Mas aceito lhe recompensar no próximo local.
Diz enquanto lambe os dedos, quase satisfeita com os dois lanches devorados. O próprio e o dele também que bobeou dando-a brecha para tão exitoso ataque.
—Estou ansioso, senhorita faminta.
Seu comportamento com ela sempre fora sincero, descarado, e indulgente, não seria hoje que deixaria de ser.
"Simplesmente quero descobrir tudo sobre você a cada minuto mais, é normal ou obsessão minha?"
Preparam-se então para ir rumo o novo local, claro, não sem antes ela lhe exigir fechar os olhos e vendá-lo com os dedos. Quais foram retirados delicadamente ao adentrar numa parte mais deserta e descampada do lugar.
—Já pode abrir os olhos, Sr. Ling.
Obedecendo, vigia discretamente seu recinto admirando tamanha distinção de qualquer outro convite anterior.
—Um piquenique à luz de velas no meio do parque? Romântico. Mas por quê?
—Porque o pôr do sol visto daqui é o melhor do mundo. Ou do meu mundo pelo menos.
Responde deixando-o curioso, então o convida a sentar ao seu lado.
—Okay. Posso começar o interrogatório?
—Só depois da sobremesa.
Profere trazendo alguns quitutes para fora da cesta presente a eles, bem como duas canecas e uma garrafa de vinho barato.
—Costumo ser mais solta com álcool e doces à mesa.
—Solta?
Diz provocando-a, já que não acreditava haver nenhum lado dela cujo não houvesse expontaniedade, claro, presente, e inquestionável.
—Pode parecer incrível, mas não confio tão fácil nas pessoas, pelo menos não mais.
Tamanho ar tristonho deu-lhe um estranho nó na garganta, e nada como álcool e doces para aliviar a tensão repentina no ambiente. Encheu as canecas e puxou uns doces mais da cesta afim de consolá-la.
—Difícil de acreditar . Madalenas?
Suas intenções não passaram desapercebidas por ela, sendo recompensadas com um enorme sorriso e alegria genuína.
—Minhas favoritas! Sinta-se lisonjeado, essa é a terceira informação sobre mim.
Sorri relaxando-se um pouco, saboreando por fim das iguarias da noite e do vinho não tão bom.
—Ainda não satisfaz minha curiosidade, só que temos a noite inteira.
Aproveita para um pequeno flerte, afinal nada os impedia. Seria um enorme desperdício não tentar a sorte com uma mulher tão linda.
—Sem pressa.
—Não tenho, pode acreditar. Queria que as noites fossem eternas.
—Por?
—As pessoas que só vemos ao anoitecer e a sensação de estar viva.
Fala encarando-o, coisa que o deixou um pouco feliz.
—Você não está morta não, não é?
—Definitivamente não. Quer sentir meu coração de novo?
Provoca-o pondo a própria mão próxima ao decote, porque nesse jogo podiam jogar dois.
—Tentador, mas passemos para a próxima pergunta e outra "taça".
—Manda.
—Como foi sua vida quando se sentia "viva"?
—Bom... há 13 anos atrás era maravilhoso, como tinha de ser para todas as meninas de 7 anos. Eu não tinha irmãos, e meu pai faleceu muito jovem, então éramos só eu e... minha mãe.
—Ela...
Lembrando-se de suas próprias perdas, não deixou de sentir a dor dela. Empatizou-se de seu tormento, reconhecendo nele o próprio que sentia, desconhecido aos olhos e presente na alma.
—Sim, se foi. Como eu daria tudo para voltar àqueles dias, aonde ela estava, e eu era... muito feliz, muito mais do que eu pensava que era. Não era perfeito, mas éramos nós duas, juntas.
Neste instante, seus olhos fecham-se, como voltando para um passado saudoso e longínquo. Um tesouro precioso, qual apenas podia acessar em lembranças profundas, arraigadas na própria carne, cujas palavras nunca seriam precisas o bastante, tampouco suficientes para descrever. Coisa que de forma alguma passou desapercebida por seu companheiro.
—Deve sentir muita falta dela.
Fala com propriedade vendo nela espelhada sua dor.
—Todos os dias nos últimos 10 anos, sem exceções.
Abre os olhos enquanto se deita olhando convidativa para o homem, que entendi prontamente o pedido, recostando-se junto a ela.
—Inclusive no dia que a gente se conheceu, eu estava voltando de uma visita ao túmulo dela. Vou todos os dias lá. Eles nunca trocam as flores, você que tem de trocar sabia?
—É. Minha tia, e meus pais tem os túmulos bem descuidados devido à minha... falta de tempo.
Melhor não dizer ainda todos os detalhes, não. Não ainda. Aprofundar-se nessas águas sempre fora mal presságio, seja no passado, seja agora. Ainda doía e seu medo de seguir em frente assemelhava-se com correntes pesadas. Era cedo demais.
—Se quiser deixo umas flores para eles quando for da próxima vez.
—Agradeceria muito. Então....por quê a estação 6661 e esse trem fantasma?
—Ai que direto! Bom... estou presa a eles. E todos os dias tento me libertar.
—Como? Mas você está aqui e...
—Será que estou?
—Não entendo.
Nesse momento seus olhos captam o céu e chama com voz embargada, mas ainda tentando manter o sorriso. Por uma estranha razão, isso lhe doeu profundamente, dando-lhe calafrios.
—Vem, vamos dançar uma música que o sol logo logo sai, e meu toque de recolher chega.
Ela dar play num aparelho antigo de som que nem foi notado a presença até aquele momento, em seguida lhe estende delicadamente a mão para dançar, um estranho nervosismo lhe recorre, mas cede concedendo a honraria da dança. E outra, e depois outra mais. Tantas a ponto de perder o passo do tempo.
"É estranho sentir borboletas no estômago quando danço com a garota mais misteriosa do planeta? Talvez mas...por algum motivo quero que essa música seja eterna e esse sol nunca nasça, tenho um mal pressentimento quanto isso."
—Já imaginou o que seria ser a única pessoa no mundo? Tipo como se tivesse um mundo só para você?
Fala olhando profundamente nos seus olhos, de modo por exigir uma resposta sincera. Apesar da estranheza, Moo decide por acatar tal suplica implícita.
—Bem, nunca. Eu queria o contrário: que o mundo só não tivesse a mim.
Se surpreende ao ouvir a si mesmo. Era verdade, para quê negar? Desde que conheceu essa estranha garota, passou a querer ficar lentamente. Tanto que sua afirmação pode dizer no passado. Tudo graças a ela. Entretanto, carregava muitos fantasmas e vê um aproximando-se, um que não combinava nada com ela.
—Estou presa Sr. Moo Ling. E estou tentando sair desse mundo solitário à 13 anos, sem sucesso. Tinha perdido as esperanças, até que te conheci.
O sorriso frágil, dela que tão destemida lhe parecia quando conheceu-a, prende sua atenção ao mesmo tempo fazendo um conhecido sentimento de pânico estalar sua frequência cardíaca. Qual maneira, fazendo desapercebida a sutil chegada da aurora, com seus primeiros raios e uma sentença cruel para Lótus.
—Você podia me enxergar, não me via como um objeto, nunca fui para você uma presa num trem deserto. Também parecia compreender à perfeição o que é solidão. Sei porque conheço tanto, tão bem o sentimento, que não consegui ficar à margem e te deixar sozinho naquela noite. Mas acho que no final, quem acabou sendo ajudada fui eu.
Então ela sorriu, entretanto aquele frágil e tênue esboço, cujo qual esmigalhou fortemente o coração do artista como prelúdio da catástrofe que viria.
—Senhorita Lótus?
Gentilmente, a garota do trem junta suas mãos com as dele, de forma à entrelaçar seus dedos. Ele já não conseguia negar, estava perdido por ela, agora era tarde para desmentir isso. E para quê negar? Estava mexido por ela, sacolejado e abobalhado. Jamais houvera pensado quão medonho seria o que se aproximaria.
—Eu luto há 13 anos sozinha, aprendi a me defender bem cedo, acredite. Nem todos são gentis como você é comigo... nem um pouco.
As lágrimas escorrendo pela face refletem nas suas próprias, como a imitando num ato inconsciente de onde nem ele mesmo soube porquê. Escassas eram as palavras, mas os gestos entre eles gritavam algo, uma sinfonia onde somente dois compreendem, assim, um simples, porém singelo toque do polegar possibilitou todo diálogo ali. Foi suficiente para encorajá-la à continuar.
—É difícil confiar nos outros, pois isso é um ato de fé. Tem que ter fé em alguém para confiar, e eu escolhi arriscar minhas fichas em você Moo. Fui traída incontestáveis vezes por outros, não foi fácil.
Ela olha para o céu, depois fecha os olhos antes de continuar.
—Irônico. O mesmo carcereiro, é meu salvador dia morte várias vezes, e me trouxe você dessa vez. Bom. Estou fugindo do assunto. Só estou lhe contando isso porque quero que faça sua escolha, Moo.
Com os olhos já fixos nos seus, ele por fim, percebi o estranho fenômeno presente naquela mulher. Ela desaparece quando chega o sol. A aurora surgindo, levá-la diante dele para sabe-se lá onde, contudo devido ao choque, não consegui lhe dizer nenhuma palavra simplesmente a encara enquanto desvanece lentamente.
—Sou esquisita, não? Uma vez conversamos sobre coragem, lembra? Vai me buscar ainda que não tenha certeza do que sou? Ou vai se render aos instintos humanos e fugir para sua segurança? Preciso de ajuda para escapar daqui.
Dessa forma ela some. Quando por fim dar-se conta, uma falha tentativa de abraço ocorre, sem sucesso é claro. Não sobrava nada agora para abraçar. Ela se foi por entre seus braços com o raiar do dia. Sumiu junto as estrelas e o luar, como um sonho com a chegada da aurora.
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Antes que o sol nasça para nós
Ficción General"Antes que o sol nasça para nós" traz à tona uma amizade que torna-se um romance conforme avança o livro, no entanto abordado não tão convencionalmente. Acompanhamos Moo Ling (Sr. Moo), o qual conhece Lótus, a garota gentil diferente de tudo que exi...