2- Os Lupis

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Não se sabe por que magia da Natureza, na nossa montanha apareceram há muitos e muitos anos uns estranhos seres cor de laranja, diferentes de todos os outros da Terra. Eram animais que se distinguiam em duas qualidades*, embora fossem da mesma família. Todos eles eram peludinhos, exceto na cara. Está tinha um nariz bem gordo, batatudo, e bochechas todos redondas de tocadores de trombone. As orelhas também eram redondas. Tinham duas pernas e dois braços, andavam de pé como os humanos. Mas as duas qualidades apresentavam diferenças importantes: havia uns, a maioria, cambutinhas*,
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Qualidades: espécie.

Cambutinhas: cambutinhas, diminutivo de cambuta, indivíduo baixo.
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do tamanho de coelhos. Os outros eram maiores, do tamanho dum chimpanzé pequeno e mais gordos, todos redondos. Estes animais pensavam e falavam e trabalhavam. Não eram homens, porque se chamavam lupis.
O nome foi dado pelos outros animais, pelo fato de gritarem lupi-lupi-lupi, isto é, lupilarem, quando estavam contentes ou então muito zangados. Por aqui se vê já que está estória é do tempo em que os animais sabiam ainda dar nomes às coisas. Pois é, o avô Bento já é muito velho. Voltando aos nossos amigos, eles lupilavam de de maneira diferente, conforme as qualidades. Os cambutinhas faziam-no muito agudamente, a propósito de tudo e de nada. Os maiores faziam um lupi-lupi-lupi mais grave, menos alegre.
Foi esta a arma secreta que utilizaram quando a montanha foi invadida pelos rinocerontes. Os rinocerontes, que sempre viveram lá na planície, vieram um dia provar o capim tenrinho e rasteiro da montanha. Nunca mais queriam sair daqui. E os lupis andavam incomodados, sempre com medo de serem atropelados por aqueles mastodontes míopes.
Depois de um acidente, em que o lupi-azarado ficou com o pé esquerdo desfeito, por ter sido pisado por um monstro distraído, reuniram em conselho para debater a questão. Tinham de expulsar os rinocerontes para a sua planície. Mas como, se eram tão pequenos e fracos ? Decidiram exagerar na gritaria.
Assim mesmo. O lupi-lupi-lupi invadiu a montanha.
Os rinocerontes, que são quase cegos mas nada surdos, andavam muito nervosos com a lupilagem estonteante. Desesperados, bem corriam atrás dos lupis para os esmagar, mas estes eram rápidos e ágeis.
Subiam logo às árvores, escapando sempre. Os rinocerontes ficavam cá embaixo a escavar a terra, a dar narradas nas árvores, furiosos. E o coro lúpico prosseguia lá em cima. Até que, com os nervos arrasados, cacimbados* mesmo, os rinocerontes retiraram e nunca mais voltaram à montanha.
A montanha era de novo só dos lupis.
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Cacimbados: com os nervos destruídos, reduzidos a cacimbo ( nevoeiro ).
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