Capítulo 02

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Meu primeiro livro, Gozar não é missão impossível, foi sucesso de público e crítica. O que ninguém, mas ninguém mesmo, sabia era que eu nunca tinha gozado. De jeito nenhum. Nem me masturbando, nem transando, nem tomando remédio. Até maconha fumei, depois de ler um estudo falando que ajudaria. Nada! E o mais cruel era que eu sabia que não tinha nenhum problema físico. Minha trava estava na cabeça.

Começaram a me convidar para dar entrevistas aqui, entrevistas ali, entrevistas acolá. Juro que eu não tinha a menor ideia de que a coisa seria assim tão grande. Era muito louco ver meu nome em jornais, ir a rádios. Fui a várias pequenas emissoras de TV.

Mas a vaidade é algo realmente interessante. Aquela magia de luzes na cara e microfone na frente da boca é um canto da sereia. Vamos nos envolvendo e achando tudo muito gostoso. Fui cada dia mais achando o maior barato aparecer na mídia.

No embalo, José Ronaldo me convenceu a escrever o segundo livro. Era um guia para os homens, chamado Manual de instruções — Mulher.

Escrevi em uma sentada, colocando só as coisas mais idiotas do mundo, do estilo "beije a sua nuca e dê leves assopros, assim sua mulher vai subir pelas paredes". A minha intenção era fazer uma brincadeira com o meu marido e depois eu escreveria o livro de verdade, em que colocaria coisas mais científicas, como: "para achar o ponto G, use uma fita métrica na vagina da sua esposa".

Juro que nunca pensei em publicar aquela porcaria. Os conselhos eram ridículos, havia toda uma baboseira sentimentaloide no meio. O objetivo era rir, imitando as sexólogas que davam conselhos abobalhados nos programas de TV e jornais baratos. Mandei para o meu marido por e-mail, jurando que ele tinha notado que era brincadeira.

Vinte dias se passaram e mais um contrato foi fechado com a editora.

Sem que estivesse me dando conta, estava virando mais uma sexóloga que fala um monte de baboseira sentimentaloide. O mais esquisito era que eu gostava daquilo. Meu linguajar até mudou. Passei a achar natural utilizar expressões como "sopros leves" e "carícias intensas", sendo que, antes de todo o processo começar, achava que pessoas assim não passavam de charlatãs. Seria eu a nova charlatã do mercado?

O segundo livro já saiu da gráfica com a primeira edição toda vendida, de 30.000 exemplares. Foi graças a ele que fiquei rica, pois bati rapidamente os 200.000 livros vendidos!

O sucesso foi muito maior. As pessoas começaram a me reconhecer na rua, pedir autógrafo e foto. Fiquei assustada com tanto assédio. Questionava-me dia e noite sobre o motivo de aquilo tudo estar acontecendo. Era esquisito demais para a minha cabeça, mas, estonteantemente apaixonante.

O problema foi que os olhos da editora e do José Ronaldo cresceram. Pediram-me mais um livro. Eu ri da cara deles e falei que os outros tinham sido escritos de "pura sacanagem". Pronto, depois da minha frase eles já decidiram o título e, em cinco dias, escrevi mais um best-seller, recheado de puras sacanagens (dã!). As pessoas realmente se interessavam por aquelas abobrinhas que eu escrevia. Meu senso de realidade acusava alterações.

O golpe final foi no dia em que recebi um telefonema da Rede Global, perguntando se eu queria apresentar um quadro no Maravilhoso, dando dicas de sexo. Daquele dia em diante, tornei-me uma celebridade nacional.

Não me queixava, mas me perguntava diariamente como teria sido a minha vida se nunca tivesse escrito livro algum. Será que eu saberia viver sem o gostinho do sucesso? Confesso que gostava da fama. Achava esquisito quando não me reconheciam.

Muita gente perguntava o motivo de ter me tornado sexóloga. Entrei na faculdade muito nova e me destaquei pelas boas notas. Fiz Psicologia na Universidade de Brasília, e isso abre muitas portas. Resolvi me especializar em sexo por um motivo simples e ao mesmo tempo complexo: eu não conseguia ter um orgasmo.

Apimentando - DegustaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora