Irene Galle
Admirava a vontade e a vaidade das mulheres em ficarem bonitas, sentindo até um pouco de inveja. Desde pequena tinha dificuldade lidar com atenção e talvez por isso escolhesse cores mais neutras.
Cores neutras me impediam de ser lembrada com muita frequência, facilitando o meu passatempo exótico. Não sabia se deveria mudar isso com a minha nova vida ou continuar tentando ser discreta.
Talvez nada disso importasse no final das contas.
— Novata, como estão as coisas? — A voz animada de Valéria Soares, uma das editoras mais velhas, soou extremamente contagiante e feliz. Valéria era o tipo de pessoa que permanecia sorrindo, otimista e tratava os outros com gentileza. Uma espécie rara de ser encontrada em um ramo tão conturbado.
— Tudo bem. Ainda me adaptando. — Não poderia dizer que estava cansada depois de observar o Senhor M.
— O inicio é sempre difícil. Depois melhor, promessa. Ah! Soube que você não é mais a nossa novata. Um advogado, aparentemente gato, está chegando.
— Não sabia que tinha uma vaga aberta nesse departamento.
Quando mudei de cidade, comecei a buscar trabalho e o meu tinha conseguido por sorte, já que a ultima tinha se demitido uma semana antes que eu começasse a procurar. Todas as vagas, independente do departamento, eram concorridas.
O novo advogado também parecia ser uma pessoa sortuda.
Continuei escutando seus comentários sobre os colegas e o trabalho até ela se despedir e, finalmente, voltar minha atenção para o meu primeiro trabalho: uma historia de romance trágica entre um homem solitário e uma mulher que tentava escapar de seu passado.
E eu amava histórias assim.
Uma história que prometia tristeza e entregava um amor incondicional.
Permanecia concentrada até ser despertada pelo despertador do meu celular me lembrando do almoço. Me espreguicei contente por estar fazendo algo útil da minha vida e usando a minha graduação para algo.
Arrumei tudo antes de sair da sala, ansiosa para ir ao refeitório, mas quando entrei, o ambiente estava ligeiramente diferente. As conversas pareciam ainda mais altas do que o comum e um pequeno grupo estava reunido perto da mesa onde costumava me sentar.
Não prestei atenção ao que acontecia. Só fui direto pegar o meu almoço e busquei outro lugar para sentar, mas parecia que o silencio era a ultimo coisa que teria, pois não demorou para sentir as conversas cada vez mais próximas. Bastou erguer a cabeça para sentir o meu sangue parar de circular pelo meu corpo e meu coração parar de bater.
O homem parado a minha frente usava um paletó sob medida, uma camisa escura que não escondia seus músculos, uma calça social preta e uma expressão nada parecida com a que eu observava obsessivamente todos os dias pela manhã.
O Sr. M estava parado em minha frente, sorrindo como se fossemos velhos conhecidos ou algo assim. Que merda era essa?
Nem sequer conseguia pensar em algo para dizer em um momento tão estranho. Afinal, tinha prometido a mim mesma nunca mais me aproximar das pessoas que observava, ou melhor, vigiava para garantir a sua segurança.
— Sou Kyros Palias, o novo advogado. — Sua voz era exatamente como tinha imaginado; magnética e máscula. Pisquei ao abrir a boca sem nenhum som sair. — Desculpe, a interrompi?
Algo em sua voz não pareceu soar como se ele realmente estivesse se desculpando, mas sim, me provocando.
— Prazer. Irene. — Respondi após respirar fundo e segurar a sua mão por alguns segundos. Tempo o suficiente para sentir sua mão áspera e forte.
— O prazer é meu, garanto. — Sua voz confiante me fez hesitar. Ele tinha me visto o observando? O que significava essa atenção para mim?
Deveria perguntar?
Seria melhor ficar quieta, fingir que não tinha entendido nada e seguir em frente.
— Seja bem-vindo.
Foi a única coisa que consegui dizer ao abaixar a cabeça e encarar o meu prato. Esperei que ele se afastasse ao ver que não estava disposta a conversar, só que Kyros, o Sr M, parecia ser exageradamente despreocupado e um tanto estranho. Ele se sentou em minha frente parecendo ignorar a atenção das outras pessoas.
— Sinto que já a vi antes.
Engoli em seco com medo de erguer a cabeça. Falei algo sobre o meu rosto ser comum demais.
— Nunca esqueço um rosto. — Sua voz perigosamente melodiosa soou como a voz uma sereia tentando me hipnotizar para que eu confessar algo e, assim, pudesse me levar para o fundo do amor, afogando-me. Ergui a cabeça, sem fala durante um tempo.
Precisava admitir o quanto Sr. M conseguia deixar minhas pernas bambas apenas em encará-lo. Seu rosto parecia ter sido desenhado para tentar as pessoas e as forçarem a fazerem loucuras.
Seu cabelo escuro curto, sua pele morena, seus olhos castanhos brilhantes e sem qualquer tipo de felicidade, seus lábios finos combinavam perfeitamente com seu nariz.
Até a sobrancelha dele lhe dava uma atmosfera perigosa, aumentando o seu charme.
Fiquei incerta se ele era mais bonito vestido ou sem roupa.
— Está me encarando tanto que deve me conhecer, estou certo?
Ele estava brincando comigo ou só me testando?
Semicerrei os olhos, respirei fundo e sorri o mais gentil que consegui.
— Sinto muito, mas nunca o vi antes. Admito que o encarei agora para ver se realmente já o havia visto antes. Apenas isso. Se isso o ofendeu, sinto muito. — Levantei, cansada de lidar com ele. Por isso preferia observar as pessoas a distancia.
Tudo era mais calmo, seguro e controlado por mim.
Ignorei a fome persistente ao me afastar o mais rápido possível do refeitório. Nunca mais iria voltar para esse lugar onde poderia encontra-lo.
***
Kyros Palias
Estreitei os olhos, mantendo meu olhar ao ver suas costas se afastando cada vez mais rápidos. Irene Galle não parecia uma criminosa tão inescrupulosa quanto havia sido informado.
De acordo com minhas informações anteriores, ela deveria ter demonstrado algum interesse ou alegria ao ver o seu novo alvo desfilar em sua frente tão despreocupadamente.
Só que ela parecia assustada.
Interessante.
Depois de muitos anos, começava a me divertir de verdade ao fazer o meu trabalho.
CONTINUA...
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Quando encontrei você
RomanceLivro 2 de amores gregos - Mania Assim como a maioria das pessoas, Irene Galle tinha muitos segredos, os quais preferia manter escondidos do mundo, mas, inesperadamente, cada um deles vai se revelando ao observar seu indecente, indiscreto e sensual...