era uma vez...

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Em um lugar bem distante, havia um vilarejo à beira de uma floresta sombria. A maioria dos moradores deste vilarejo exerciam os ofícios de lenhadores, ferreiros, cultivadores, e para os mais corajosos: Caçadores. Os caçadores eram os únicos que se aventuravam para as profundezas da floresta em busca de alimento. Era o ofício mais respeitado e honroso, pois todos sabíamos das histórias tenebrosas que cercavam aquela floresta, o motivo de apenas uma pequena parcela do vilarejo se aventurar por lá e voltar em segurança.

A existência do lobo.

Os mais velhos contam que depois do pequeno riacho, perto das altas montanhas que possuem cavernas escuras, uma fera assustadora e cruel habita por lá. Um ser criado pelo próprio demônio, com uma sede de carnificina insaciável, destruindo tudo o que é vivo e devorando a criação divina. Se aproximar daquela área é procurar pela morte, pois muitos caçadores já tentaram pôr um fim nessa fera e tudo o que restou delas foi o corpo desfigurado que outros caçadores encontraram na beira da floresta. Os dois seres, homens e lobo, poderiam viver perfeitamente em paz se um não se atrevesse a invadir a área do outro. Mas isso mudou drasticamente em um inverno.

A estação fria trouxe tempos difíceis para ambos. Todos os animais que serviam como alimento foram desaparecendo da floresta e ao decorrer dos meses, homens e lobo ficaram famintos. Sem nenhuma alternativa para se alimentar, o lobo passou a caçar os humanos. Foi uma época tenebrosa no vilarejo, o lobo invadiu as casas em toda noite de lua cheia, onde a sua força poderia vencer facilmente qualquer grupo de caçadores.

Foram meses nessa carnificina até a chegada da primavera.

Por algum milagre divino os animais retornaram à floresta. Mas o que era para ser a esperança de um fim a esses dias cruéis, passou a se tornar um pesadelo. O lobo permaneceu a caçar os humanos em toda noite de lua cheia, não se contentando aos animais recém chegados. O vilarejo em puro desespero chegaram ao acordo de que cada casa deveria colocar um animal nas suas portas em troca das suas vidas. Os moradores não viram outra opção, então todos concordaram que na próxima lua cheia iriam prender um animal na frente das suas casas. Quando a lua subiu aos céus mostrando a sua totalidade, os moradores permaneceram dentro das suas casas cobertos de medo enquanto ouviam os rosnados e uivos pelas as ruas. Naquela noite, quando as ruas voltaram a ser silenciosas, um a um, todos os moradores saíram das suas casas, rezando para que o lobo tivesse levado os animais.

E a partir desta noite, uma nova tradição se instalou no vilarejo.

Os homens aperfeiçoaram a sua tradição ao decorrer dos anos, montando dentro da floresta um local onde poderiam deixar os animais como sacrifício, poupando os humanos de ouvirem a fera levando o seu alimento. O lobo reconheceu esse ato como um acordo e não voltou a invadir o vilarejo, satisfeito em ter o seu alimento. Essa tradição permanece a dez gerações e é passada a toda criança, aprendendo desde nova a nunca se aventurar pela floresta e a nunca perturbar a fera.

E o mais importante, nunca deixe de oferecer o seu sacrifício, pois o lobo está à espreita, esperando o momento em que o homem vai descumprir a sua parte do acordo.

———

Desde que tomei consciência fui ensinado a me manter longe da floresta, aprendendo que meu lugar é aqui, no centro desse vilarejo e por seus muros protetores. Mas sempre fui alguém inquieto. O vilarejo não era suficiente, eu não queria passar o resto da vida lidando com os temores deste lugar, ensinado a temer o lobo quando nem sequer o vi. Já fazia alguns anos que nenhum homem morria pela a fera e as histórias eram apenas isso, histórias. Lendas criadas para amedrontar crianças desobedientes à base do medo.

Entre Rosas Vermelhas e Lua Cheia • SoogyuOnde histórias criam vida. Descubra agora