Reflexões em um Dia Cinzento

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Em vez de derramar lágrimas pelo vazio que deixaram, comecei a preenchê-lo. Abri as asas para a jornada, explorando novos horizontes, encontrando rostos novos. Aceitar, no entanto, foi a parte mais intrincada, admitir que o nosso mundo, o que construímos com tanto esmero, tinha sucumbido em um buraco negro, e não havia retorno possível. Restou-me erguer uma vida das cinzas, demolindo as barreiras internas que me mantinham recluso, pois elas não apenas me separavam dos outros, mas também me mantinham distante de tudo o mais.

Ainda me encontro em busca de equilíbrio, a verdade é essa. Algumas noites, o silêncio me envolve, e os sons à minha volta me lembram de outrora. Por vezes, até me engano e imagino ouvir teus passos aproximando-se, a porta se abrindo, tua presença se lançando na cama. Não estava, nem estou, pronto para deixar-vos para trás, pois o que compartilhamos foi genuíno, um capítulo da minha vida que mesmo o tempo não pode apagar. Estou tentando, lutando contra o tempo, erguendo os destroços. Às vezes, por algumas horas, outras, semanas inteiras. Porém, sem aviso, retorna. Pensamentos confusos, fragmentos de lembranças que eu desejava que estivessem aqui para me guiar.

Eu fechava os olhos, uma tentativa de escapar, e lá estava o teu rosto, invadindo meus pensamentos, resgatando as memórias. Andrea. A verdade é que o amor nem sempre é um vencedor. Somos moldados para sermos deixados para trás, e quando alguém de luz cruza a soleira das nossas vidas, expressando o desejo de construir algo novo, nós recuamos, escondemos-nos no quarto a chorar, amedrontados. O temor do que pode ser bom nos apavora, afinal, a felicidade é uma força desconhecida que desestabiliza. Como se pedíssemos, "aqui, toma, pega", mas a seguir, nos distanciamos e nos refugiamos.

Desconhecemos como lidar com a promessa de alegria que nos aguarda, pois talvez nunca tenhamos experimentado algo assim. Mas há que se abrir os braços para o amor, porque, embora não seja o amor de toda a vida, é amor para o presente, para o agora. O que mais temos, senão o agora? Além deste amor, desta pessoa, desta emoção que lateja no fundo do peito nas noites em que a escuridão reina? Além da adrenalina que nos invade quando começamos algo novo, a empolgação de mergulhar no desconhecido.

Ser feliz, verdadeiramente feliz, não se liga a grandes eventos. A felicidade é tecida nas fibras da rotina, é encontrada nos pequenos gestos. É perceber que tudo está bem, que as notícias sombrias não bateram à porta, que os amados repousaram em paz durante a noite, que um novo dia se ergue calmo. É o calor do chuveiro, o abraço aconchegante, a canção que acompanha a lavagem dos pratos, o entardecer capturado em meio ao tráfego citadino, o regresso ao lar são e salvo. Um chá que aquece, uma refeição que nutre, um programa de TV que nos transporta, a cama que nos envolve em seus aromas.

A felicidade se insinua nas coisas comuns, emerge gentilmente, aquecendo o peito, acalmando os pensamentos e trazendo serenidade ao coração. Preciso que compreendas a importância de descansar, de remover as vendas dos olhos para perceber e, assim, agradecer. Tudo já está acontecendo, só carecemos do olhar apurado.

Já está acontecendo, você só precisa enxergar. As experiências, os sentimentos, as mudanças estão diante de você, prontos para serem apreciados. As lágrimas que antes inundavam os olhos agora dão lugar a sorrisos sutis, uma transformação que reflete a jornada de superação e autodescoberta.

E mesmo que a saudade insista em bater à porta, trazendo à tona memórias e momentos compartilhados, lembre-se de que o passado não define o seu presente. Cada passo que você dá na direção do futuro é um testemunho da sua força, da sua capacidade de construir uma nova vida sobre os escombros do que um dia foi.

A busca pelo equilíbrio continua, mas agora é guiada pela consciência do seu próprio valor. Você merece o amor, a felicidade e tudo o que a vida tem a oferecer. E embora a jornada possa ser árdua, você já provou a si mesmo que é capaz de enfrentar as tempestades e emergir mais forte do outro lado.

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