A aula de voo

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Hogwarts, Setembro de 1971

   A manhã seguinte fora marcada pelos piados agudos de uma Calliope bastante indócil, que agitando suas asas contra as grades de sua gaiola, fora capaz de despertar a todas no quarto.

   — Pensei que corujas tivessem hábitos noturnos. — fora o primeiro questionamento que Lily fizera, seguido de um longo bocejo e o esfregar de seus olhos.

   — Sim, a maioria tem, mas quando Calliope quer algo pela manhã, raramente me permite continuar a dormir até que eu a atenda. — Dorcas resmungou, arrastando-se de sua cama para abrir a gaiola e avaliar a sua ave.

   Num primeiro momento, tanto Lily quanto Mary ficaram cabreiras com a libertação do animal, que em contrapartida lhes lançara um olhar igualmente desconfiado. Mas, para a sorte das garotas, Calliope não parecia querer fazer muito mais que esticar as asinhas, e alçando voo para fora da torre, as deixara em paz para se aprontarem para o café da manhã.

   “Hogwarts é real” Lily pensou consigo mesma, enquanto amarrava a gravata em volta do pescoço “Hogwarts é real, e hoje será meu primeiro dia de aula!” continuou a refletir consigo mesma, sorrindo diante de tal pensamento.

   Decerto que o que fora discutido na noite anterior não havia simplesmente sido apagado de sua mente, mas decidiu que assim como todo lugar — seja dentro ou seja fora do Mundo Bruxo — contava com algumas pessoas ruins, talvez o colégio merecesse a chance de se provar um lugar decente, apesar dos pesares.

   — Todos em fila! Desceremos em poucos minutos, mas desceremos em ordem! — a Professora McGonagall, quem Lily descobrira ser a diretora da Casa de Grifinória, ia alinhando as crianças a medida em que estas brotavam no Salão Comunal.

   Descendo das escadas do dormitório masculino, uma dupla mais que bem humorada veio voando pelos degraus, sendo seguida por uma segunda dupla um pouco mais acanhada que apenas os observava pouco atrás. Para o desprazer de Evans, os dois meninos extrovertidos em questão eram James e Sirius, que pareciam alheios às tentativas de McGonagall em organizar todos em linha.

   Mal eles desceram, e lá fora Dorcas falar com Black, dando a ruiva a chance de ver em primeira mão qual seria a dinâmica de amizade entre ambos: pulando nas costas do rapaz apenas para bagunçar suas madeixas, os dois riam como se aquele fosse um rito comum nas manhãs entre ambos. Por um momento, Lily desejou que também pudesse se encontrar pelas manhãs com Severus e serem colegas da mesma casa. Seria bom começar o ano ao lado de pelo menos um conhecido.

   De qualquer forma, não tivera muito mais tempo para se lamuriar sobre, já que marchando para fora da torre, a Professora McGonagall já levava consigo todos os seus alunos ao Salão Principal, onde a mesa destinada a Grifinória já era conhecida por todos. Não muito depois deles, as demais casas foram vindo, tendo a chegada da Corvinal sido destacada por uma Marlene McKinnon que prontamente saltitara até a mesa da Grifinória para abraçar suas colegas.

   — A falecida Rowena Ravenclaw, que Merlin a tenha, sabia o que era estilo quando montou a comunal da Corvinal! Vocês precisam me visitar um dia por lá! — exclamara, os dentes da frente mais do que destacados em seu grande sorriso. — Mas deixemos de falar apenas sobre mim, e vamos às formalidades! Essa é Emmeline Vance, uma das minhas colegas de quarto! — ela correra para apresentar a garota que a seguira até a mesa da Grifinória, e que ao contrário da McKinnon, parecia ser um poço de serenidade.   — Emmeline, estas são Mary e Lily, duas colegas que fiz a caminho de Hogwarts, e que assim como você, são duas figuras! — seguira com as apresentações, gesticulando a todo momento.

   — Uma pena que tenhamos ido para casas diferentes... — Lily murmurou, não necessariamente infeliz com a sua cada de destino, mas sim por essa separação de casas ter se colocado contra essa amizade que florescera há pouco.

   — Tá de brincadeira?! Sim, talvez seja chato ter que viajar de uma comunal para outra para conversarmos, mas de jeito nenhum vou permitir que esta seleção nos impeça de manter a amizade! — a loira fora bem enfática, envolvendo os ombros de Lily e Mary com os seus braços. — Mas agora, por que não me contam como é a comunal da Grifinória?! — sorriu, pedindo um espacinho no banco para que ela e Emmeline se espremessem enquanto colocavam os assuntos em dia.

   E nossa, como isso aumentara o humor de Lily. Seguiram conversando assim, se interrompendo algumas vezes apenas para mordiscarem o que Lily e Mary ofereciam em seus pratos, e só foram parar quando Flitwick convocara os primeiranistas de Corvinal para a primeira aula do dia, e que segundo Marlene, seria realizada em conjunto com os primeiranistas da Sonserina.

   Só então Evans se dera conta de que ainda não havia dirigido um único olhar para aquela mesa, de onde um Severus muito emburrado se levantara, lançando um olhar nada amigável para ela. Sentira-se culpada por não ter ido cumprimentá-lo, mas por outro lado, percebeu que, ao contrário de Marlene, seu amigo também não havia se mobilizado para ir falar com ela.

   “Talvez pudessem tentar reverter este desencontro na hora do almoço” ponderou, mas por algum motivo não se sentiu convicta de que isto seria possível.

   — Primeiranistas da Grifinória, levantem-se! A Madame Hooch já os aguarda no campo para sua primeira aula de Voo! — Minerva exclamou, causando um alvoroço entre os calouros.

   Lily não podia se dizer muito diferente dos demais, já que tinha o costume de flutuar nos balanços sempre que passeava pelo parque próximo de sua casa. Mesmo assim, a ideia de voar em uma vassoura parecia tão gostosa quanto. Uma pena que as expectativas tenham se desfeito tão rapidamente.

    Primeiro, foi a quebra da expectativa ao ver que estender a palma no ar e gritar “suba” não era tão fácil assim, de modo que houve dificuldade geral entre os alunos, com exceção de Alice, que fora uma das poucas a ter êxito na primeira chamada.

   — Benditos sejam os jogos de quadribol em família! — ela exclamou, dando pulinhos, enquanto elevava a vassoura sobre a cabeça.

   O segundo momento em que se viram se dando mal foi quando todos já tinham suas vassouras a postos, e Mary tivera um acidente desastroso ao decolar de maneira desgovernada, sendo detida ao bater contra a parede mais próxima.

   — Okay, okay, ninguém sobe numa vassoura até eu retornar da Ala Hospitalar com a Senhorita Mcdonald! — Madame Hooch determinou, parecendo estar mais aborrecida do que propriamente surpresa com o incidente.

   — Eu posso acompanhar a minha amiga? — Lily se voluntariara, nem esperando pelo sim da professora antes de começar a segui-las pelo campo, e logo mais nos corredores.

   — Seria mais fácil me seguir do que fingir que se preocupa com a minha permissão para tal, Evans. De todo modo, fez bem em vir. Fará bem à McDonald ter uma colega a zelando. — Hooch lhe sorriu mordaz, abrindo as portas da Ala Hospitalar para que as duas garotas adentrassem.

   Lá, uma moça com vestes ultrapassadas de enfermaria catalogava alguns frascos, parecendo horrorizada ao reparar no estado de Mary.

   — Já tivemos o nosso primeiro acidente do ano?! — exclamara, correndo em auxílio, orientando a menina a se deitar numa das macas mais próximas. — Essas crianças estão a cada dia mais arranjando meios de se quebrarem, viu?

   — Ossos das aulas de voo, Poppy. Ossos das aulas de voo. — a professora rira do semblante da outra mulher, suas mãos afundadas nos bolsos de seu uniforme. — Lembra-se como eu costumava me esborrachar nas partidas de quadribol? — inquiriu, parecendo se divertir com a situação.

   — E por que acha que escolhi seguir no ramo da saúde e bons tratos, hein? — a enfermeira fizera muxoxo, fazendo o máximo para não olhar diretamente para a professora, avaliando o braço de Mary que aos poucos ia inchando.

   Lily nada dissera, mas notara nos olhos de Madame Hooch o mesmo tipo de felicidade boba que ela costumava ver em seu pai, quando se divertia às custas do humor de sua mãe, o que a fez se perguntar se estaria vendo coisas ou este seria o mesmo caso. De todo modo, as lamúrias de Mary ao seu lado logo a fizeram retornar o foco à amiga, a qual segurava as mãos, assegurando implicitamente de que não largaria dela tão cedo.

   Só esperava que as próximas aulas fossem menos letais do que a primeira.

Sisterhood - Marauders EraOnde histórias criam vida. Descubra agora