"Ellie • 12.12.2022
Segunda-feira. Me encontro sentada na cama tentando criar coragem logo cedo. Hoje eu iria tentar mais uma vez me matricular na escola da minha irmã, porque é mais perto de casa e porque meu pai não para de encher o saco com isso, e sinceramente, não sei o porquê ele quer tanto que eu vá pra lá. Acordei sem ânimo nenhum, e até pensei em só ficar na rua e depois voltar para casa e dizer que não consegui me matricular mais uma vez - até que não era uma ideia ruim. Hoje seria o último dia que eu poderia tentar entrar naquela escola, e eu não estou nem um pouco afim de ir.
O dia estava feio, nublado, mas ótimo pra passar o tempo deitada assistindo South Park com alguém legal — por mais que eu não tenha ninguém legal pra assistir South Park comigo. Sem muita enrolação, eu saí de casa e encarei o céu apagado. Aquele dia estava mais cinza do que os outros, sem cor alguma, mas eu havia acordado com uma leve esperança de algo mudar hoje, e eu não sei o porquê sendo que eu tinha dito pra mim mesma que eu iria desistir de tentar ir atrás das coisas, sejam boas ou ruins. Fui até a escola, e logo me lembrei daquele dia na apresentação da minha irmã, e me pergunto se aquela garota ainda anda por aqui. Desde aquele dia no shopping, não fui a mesma, e venho despertada durante os dias, olhando para todos os cantos como se o olhar daquela menina fosse meu oxigênio. Eu não sei o que aconteceu, mas aquele pequeno tempo que tivemos no banheiro do shopping, já foi o bastante para conseguir me fazer pensar nela o dia inteiro.Não sou do tipo de escutar músicas brasileiras direto, mas eu tenho uma Playlist com as minhas favoritas, e estou nela agora, escutando nos meus fones de ouvido "Velha Infância" dos Tribalistas. Essa música me trás uma sensação tão diferente, mas tão boa que não consigo explicar. Momentos bons e felizes sempre eram lembrados ao escutar essa música e, percebi que aquela garota de cabelos cacheados passava em minha mente enquanto eu ouvia a canção que tocava, logo me pergunto se estou voltando à uma boa fase, já que depois de muito tempo eu tive uma sensação boa, mesmo num momento difícil, e por que com alguém tão específico? Não sei.
Documentos — e claro, meu livro favorito — em mãos, e eu já estava saindo da secretaria daquela escola, que agora, infelizmente — ou felizmente —, era a minha nova escola. Me questionei o porquê não fiquei vagando na rua para depois fingir que não havia conseguido me matricular, mas logo me lembrei que eu iria escutar coisas até umas horas, e eu não estava muito afim. Não sei como me sentir neste exato momento sabendo que vou passar a estudar aqui, mas decidi não pensar muito porque isso é coisa para se preocupar só ano que vem — era o que eu estava pensando.Comecei a andar à caminho da minha casa, devagar e relaxada. A rua estava vazia, e eu estava perdida em meus pensamentos, com as músicas em alto volume nos meus fones. Não sinto presença nenhuma comigo, mas sinto algo estranho. Meu mindinho estava sendo apertado mais uma vez e eu pude sentir meu coração chacoalhar rapidamente, então eu parei e observei minha mão. Olho para o céu pela segunda vez no dia, pedindo mentalmente para que alguém me explicasse o que estava acontecendo, se seria algo bom, que mudaria as coisas ou se era só mais um problema. Respirei fundo, e dei um passo tentando prosseguir o caminho, mas fui barrada por uma voz que vinha atrás de mim depois da passada de um vento forte.
— Ei!
Karina • 12.12.2022
Não fazia tanto tempo desde o dia do meu aniversário, mas eu sinto algo tão diferente a cada dia que passa, na verdade, sendo mais específica, a cada vez que eu me encontro com aquela menina. Anda acontecendo coisas tão aleatórias que parecem ser algo real, mas eu realmente não sei. Agora, eu estou fora de casa, e sendo sincera, eu só levantei da cama e saí, querendo andar sem rumo pela rua daquela manhã. Acordei com sérios pensamentos, que estavam me matando logo cedo e eu não sabia se ainda valeria a pena olhar para o céu e pedir ao universo que me enviasse um anjo novamente, parecia que não dava certo. Mas eu tentei, e mais uma vez, eu olhei o céu cinza e pedi.
A bateria do meu celular estava em dois porcento, então se eu me perdesse, não teria como voltar e por um lado, até que seria bom — eu não aguento mais aquela casa. Não me lembro bem de muita coisa desde quando acordei, mas agora estou na rua atrás da escola, tendo péssimas lembranças de lá, eu odeio este lugar e me sinto tão deslocada nele como se eu não pertencesse a ele de forma alguma.Continuo Andando, sem direção, mas ainda não muito longe de casa. Viro a esquina, onde mais na frente tem uma menina com alguns papéis na mão e um livro. Não me parecia estranha mas eu iria continuar meu rumo até o vento gelado bater forte em direção ao meu rosto, me fazendo fechar os olhos rapidamente, mas logo percebendo que tinha algo sendo levado ao vento, era um marca-páginas. Sendo sincera, eu iria ignorar, mas parei pra observar melhor e percebi que poderia ser da garota que andava pela minha frente. Pensei em chamá-la mas meu coração tremia e minha mão se incomodava com aquela sensação estranha no meu dedo mindinho, então eu só gritei.
— Ei! — ela se vira.
Era a garota da escola, e outra vez, nos olhamos por sei lá quanto tempo, como se estivéssemos congeladas em sincronia, e mais uma vez, eu vi cores e flores vivas. Tento voltar à realidade, por mais difícil que seja, e tentei agir naturalmente. Ela era linda, tão linda que parecia coisa de outro mundo — eu acho que ela é um outro mundo, o que eu estava precisando, o que é bonito, com vida, com sol, eclipse, cosmos, conforto e borboletas por todas as partes e ela, a escultura principal daquele lugar, que ficava bem no centro rodeada de obras que foi ela quem fez tudo florescer, era o que eu estava vendo neste momento.
— É seu? — minha voz quase falha.
— Sim — ela caminho até mim e pegou da minha mão — obrigada.
É a primeira vez que escuto sua voz, e pude ter certeza de que ela é melhor do que qualquer música que existe. Tão linda como poesia, tão viciante do que qualquer sabor de pastel da feira — pode ser engraçado, mas eu sou viciada em pastel e esse é o melhor exemplo para mim —, eu já sabia que ela é incrível de todas as formas, em todos os aspectos. Não sei o que estava acontecendo comigo, mas eu travei mais ainda ao sentir seu cheirinho doce quando se aproximou. Seu aroma me trazia nostalgia, e seus óculos também. Era tudo tão belo e por um instante eu me perguntei se já tive momentos com ela na infância. Eu reparei novamente em seu rosto, onde suas sardas eram aparentes, que se pareciam estrelas e formavam uma constelação linda em seu rosto — eu poderia passar horas viajando nelas.
Ellie • 12.12.2022
Eu a chamei para passar o tempo na praça, que estava vazia. Não sei como consegui coragem para chamá-la desta forma, mas pela primeira vez depois de muito tempo, eu pude ver cores ao exergar seu rosto. O céu, naquele momento, ficou azul escuro e brilhante como se estivessemos no Cosmos, e aquela foi a melhor sensação que já senti.
Conversamos um pouco de início, mas parecíamos tímidas demais. Não sei o que ela achou, mas me senti incomodada ao voltar pra casa depois de perceber que eu falei demais porque ela me deu abertura para eu poder falar do meu livro favorito; Cosmos. Eu adoro conversar sobre isso, mas pedi muito para que ela não tivesse me achado uma estranha, porque me senti bem com ela. Na verdade, foi estranho em um momento, senti minha mão se agonizando, principalmente meu mindinho quando estava com ela.Ela pareceu interessada enquanto eu falava sobre meu livro preferido e não desviou o olhar em nenhum momento, e algo que eu também percebi, é que seus olhos são lindos. Agora eu estou em casa e já é de noite, passei o resto do dia pensando no que aconteceu e ela soube que vou passar a estudar na mesma escola que ela. Não nos tornamos tão íntimas desde o início, mas trocamos números e agora estou esperando para ver se consigo dormir, já é de noite e eu só consigo lembrar no dia de hoje."
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KALI
Teen FictionSem criação, sem sol, nem lua, estrelas, quase nada. Somente escuridão, antes de tudo começar. Era frio, cinzento, quieto, sem cor. Até realmente o Kali ser descoberto, se mostrando completamente o oposto do pensado e dito, florescendo coisas magníf...