2.0 - LXXVIII

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"E as artes com teu dom são abençoadas;
Mas tu és toda a minha arte, e avanças
Tão alto quanto aprendo sobre o que nada sei."

- Soneto LXXVIII
William Shakespeare





O barulho de um pássaro bicando o parapeito da janela marcou o início de seu despertar para uma nova vida, trazida pelas águas de Iemanjá em homenagem à virada de um novo ano.
O sol, se embrenhando pelas frestas da janela, encontrava seu caminho pelo quarto até o atingir em cheio, beijando sua pele deliciosamente e incomodando seus olhos insistentemente.

E, apesar de desejar dormir por mais cinco minutinhos, se forçou a sentar no colchão fino para despertar o corpo totalmente.

As mãos foram, por instinto, para o rosto de pele pálida, esfregando os olhos com um grunhido de irritação e cansaço.

A rotina pesada havia voltado.

Estudar, trabalhar e estudar e trabalhar novamente, fazendo pausas para dormir e comer, quando possível.

Só de pensar na correria, ele tinha vontade de se esconder embaixo da cama e se manter ali, para sempre, com seus pares de meias perdidos e suas canetas jogadas. Não sairia jamais desse cantinho, meio empoeirado, mas seguro e só dele. Sem responsabilidades, tristezas e sacrifícios, apenas ele e uma baguncinha.

Porém, a realidade se postava a sua frente sem vergonha alguma de aparecer, desejando ser vista para promover uma ansiedade antecipada no rapaz.

Foi ela que o tirou da cama aos ponta-pés, na base do ódio.
Foi ela que acompanhou seu arrastar preguiçoso e exausto por todo o processo de se arrumar para mais um dia e se encaminhar para a lanchonete mais próxima.

Precisava de um café.

O quentinho do copo em contato com as palmas geladas, o sabor amargo preenchendo sua boca, adrenalina e dopamina sendo liberadas em seu sangue.

Para Diego, tomar um café era como recarregar as energias. Por isso, não se contentava com apenas uma dose.

- Bom dia. - Uma pessoa roubou o copo da proteção de suas mãos, o fazendo bufar de raiva como uma criança que acaba de ter seu brinquedo preferido confiscado.

- Eu tava tomando. - Resmungou, pegando o objeto de volta, impedindo que a ladra finalizasse o ato de tomar o líquido.

- Olá! - Mais uma vez, uma tentativa de roubar seu café, agora, vinda de um terceiro.

Diego bateu no braço antes que o outro pudesse encostar em seu precioso bem.

- Aí, egoísta! - O outro rapaz exclamou fazendo bico.

- Ele é, né?! - A moça em sua companhia concordou.

- Se querem café, comprem! É meu café. - Avisou ao casal de amigos, mostrando a língua e virando de costas. Um sorrisinho brincando em seus lábios.

Com os três, era sempre assim. Briga de criança, discussões bobas e muita risada, mesmo com as dificuldades e complicações da vida.

XVIIIOnde histórias criam vida. Descubra agora