Capítulo 02

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Son Heung-min


Estava tentando ser um marido e filho mais dedicado no decorrer daquela semana. Considerei que, talvez, se tomasse cada segundo do meu tempo com tarefas e preocupações sobre outras pessoas na minha vida, seria mais manejável obliterar-me dos meus pecados e as sensações intensas que provocavam em meu corpo e mente - sendo praticados, ou somente pensados.

Naquela quinta feira, em questão, acordei me sentindo um tanto quanto ansioso. Yoon-ju e eu jantaríamos  na casa dos nossos pais, mas Hyu-jin não estaria presente, já que tinha marcado uma pequena reunião com suas amigas do serviço após o trabalho. Desde agora, conseguia sentir uma aflição certeira sobre os questionamentos que o meu abeoji faria durante a refeição, fazendo valer a ausência atípica da minha esposa, como fizera algumas vezes, desde que havia sido demitido.


“ — Você já arrumou um emprego fixo, Heung-min? Por favor, pare de causar constrangimento à imagem da nossa família perante os demais fiéis da igreja. Já lhe disse: — Basta rezar e ser temente a palavra de Deus que eu espalho na nossa igreja, que conseguirá vencer. Você não anda rezando o suficiente?”


Eu rezava diariamente e isso não deveria ser uma dúvida para ele. Continuamente, me esforçara em todas as entrevistas de emprego que consegui me inscrever, mas, ainda assim, nada justo foi pra frente, até agora. Grande parte das empresas que estavam contratando em meio a crise financeira exigiam certificados específicos e diploma de ensino superior - o que sempre me causava certo constrangimento, no momento de explicar que havia trancado o meu curso.

A frustração sobre a falta de perspectiva em qualquer carreira - bem como a pessoal, que já me era aceleradamente constante -  cresciam no meu íntimo, tomando conta de mim, e definitivamente, ouvir palavras recheadas em tom de repreensão de alguém que  admirava e, mesmo custosamente, em quem buscava espelhar minha própria conduta moral, era doloroso.

Entretanto, mesmo passando por esse turbilhão de críticas pessoais, não poderia parar e me “reencontrar profissionalmente”. Devia continuar trabalhando nos meus empregos temporários, precisava continuar o meu papel de provedor para a minha esposa. Eu era o homem da casa, afinal. Sempre fui ensinado que a maior obrigação masculina num relacionamento eram essas: apoio financeiro e amor eterno - com reflexão sobre às palavras pregadas na nossa igreja. E se eu, certamente me culpava por não conseguido desejar Hyu-jin, da forma que um esposo deveria amar sua esposa, deveria manter a obrigação de garantir nosso sustento com mais conforto.


Hoje mesmo, conseguiria algum dinheiro. Depois de almoçar, recebi uma ligação da Sra. Williams - uma das vizinhas dos meus pais, que conhecia desde a infância -, me pedindo para revisar a estrutura interna de alguns móveis da sua casa. Ela morava num dos
sobrados mais bem conservados da região em que cresci e insistia em manter objetos antigos de decoração, que adquirira no início do seu casamento, muitos anos atrás, dispostos sobre sua sala de visitas. Assim, quase sempre era necessário um reparo insignificante nos mesmos e ela pagava bem, considerando o cuidado que era preciso para manusear uma mesa de centro de madeira legítima, por exemplo.

Eu gostava de ir lá. Com pouco mais de setenta anos, ela permanecia saudável e lúcida, adorava conversar e contar histórias triviais da sua juventude pra mim. E no fim, antes de me entregar o pagamento para que fosse embora, me convidava para que me juntasse à sua costumeira seção de chá com biscoitos amanteigados. Como não tivera filhos e vivia sua vida quase de forma solitária, imaginava que a minha presença também a confortasse. Envelhecer sozinha deveria ser muito mais árduo, do que com uma família um pouco complicada. Eu não tinha o direito de reclamar tanto.


Illicit Affair - 2sonOnde histórias criam vida. Descubra agora