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Vou começar dando minha opinião polêmica de algo que comecei a reparar desde que pisei em Mônaco:

Esse lugar é feio.

Podem me crucificar à vontade, mas eu precisava falar. É simplesmente um epicentro capitalista, cheio de bilionários, com prédios feios e sem graça. Tenho a leve impressão que se me dissessem que aquilo é uma cidade fictícia montada num estúdio, eu acreditaria. O clima também não ajudava em nada, o céu estava nublado e permaneceria assim por muito tempo, já que estávamos no outono. Apesar do frio, as paisagens em tons laranjas e marrom revelavam a beleza da estação e traziam cor para o lugar.

A empresa havia informado que eu poderia vim para essa viagem sozinha, e que se eu precisasse de alguma ajuda, eu poderia ligar para Patrick ou para Tomás, mas eu esperava que isso não fosse preciso. Afinal, eu sentia que tinha muito para provar desde que foi resolvido que eu faria o roteiro sozinha. Ouvi muitas piadinhas vindo do Richard e aquilo não me agradava e há algum tempo era nítido que eu era um incômodo, mas ele iria engolir seco quando meu nome aparecesse nos créditos do documentário e não o dele.

Provavelmente, a minha hiper independência está gritando alto agora, um perfeito resultado da criação dos meus queridos pais. No entanto, naquele momento, uma mistura de sentimentos se apoderava de mim. Por um lado, essa síndrome da mulher maravilha era excepcional para meu desenvolvimento profissional, afinal eu detinha de toda a liberdade criativa e controle completo do desenvolvimento da obra, inclusive dominar a conversa com a estrela do documentário — que era a parte mais fascinante, para mim. Mas vendo pela outra face da moeda, o peso da responsabilidade caía sobre meus ombros, exacerbada pela minha limitada experiência que me intimidava. Era minha estreia em vários aspectos. Não houve ensaios, testes ou estágios; eu mergulhei de cabeça nisso, enfrentando o projeto de maior valor da empresa até hoje. E a grandeza disso tudo me angustiava porque cada decisão, cada pergunta, cada resposta, cada palavra trocada, carregava o peso da minha inexperiência. Me enxergava naquelas cenas de filme, onde a protagonista, de repente se via nos holofotes, pronta para apresentar uma peça colegial. Onde ela é simplesmente empurrada pro palco sem aviso prévio, mergulhada em sua timidez e nervosismo, completamente perdida e então os holofotes se acendem trazendo pra superfície toda sua vulnerabilidade.

Resumo da ópera: nada podia dar errado.

Meu cochilo após o almoço me rendeu uma tarde completamente inútil e um atraso razoável. A minha sorte é que era fácil se locomover por aqui, e em menos de cinco minutos eu cheguei na casa do piloto. Nem precisei tocar a campainha, já que ao sair do elevador, eu estava bem na sua porta me deparando com sua figura encostada na parede à minha espera.

Oi! Tudo bem?  — Lewis me surpreendeu, cumprimentando-me em português. Ele estava vestido apropriadamente para alguém que estava no conforto da sua casa: uma calça moletom e um casaco de manga longa, já que o tempo pedia.

Oi — eu respondi na minha língua nativa, sorrindo. — Alguém andou estudando, ein?

— Essa é uma das poucas palavras que eu lembro, vou precisar de algumas aulas com você. — ele disse com um sorriso travesso, erguendo uma sobrancelha, me dando passagem para entrar.

— Podemos encaixar na minha agenda, com certeza. — respondi rindo. — Só não sei se serei a melhor professora.

— Tá tudo bem, nunca fui um bom aluno. — ele confessou me fazendo rir.

— Acho que estou atrasada, né? Me desculpe, dormi um pouco a mais.

— Tá tranquilo. Vem, organizei tudo na sala!

REFRAMED: ON TRACK AND BEYONDOnde histórias criam vida. Descubra agora