A tácita nostalgia que eu esperava ao passear por aqui não tive. A amazônia que um dia conheci tinha cheiro verde forte, mas agora minhas narinas experimentam o forte pó da terra misturado ao enorme montante de cinzas das queimadas. Quando eu era bem jovem, meu avô me trazia em suas expedições. Me lembro como se fosse ontem, o som dos animais floresta adentro, pequenas clareiras onde mal se passavam os carros. Hoje estou exatamente no mesmo lugar, mas só vejo barro e uma enorme área de campina, onde os bois passeiam se atolando na lama de um dia que foi chuvoso até então.
— Senhor Nogueira, correto? — Um índio se aproximou. Eu ainda não o conhecia.
— Sim, sou eu... O que deseja? — Respondi ajeitando minha mochila nas costas.
— Ora, não fique parado na chuva olhando para os bois. Tudo bem que não chovia há muito tempo, mas não é algo para se admirar nessa lama vermelha! Vai manchar suas roupas, senhor.
Concordo. Então me virei e voltei meu corpo para dentro da única pousada que tinha ali. Bem no meio da floresta, onde todos os meus inimigos naturais se hospedavam, depois de passar o dia todo matando árvores milenares. Antes de eu poder chegar ao meu quarto, no andar superior do prédio, um homem esbarrou em mim e fez uma expressão de surpresa quando me olhou nos olhos.
— Lucas? Você é o pequeno? Neto do Nogueira? Aquele arqueólogo que procurava amuletos? — Ele sorria mais a cada pergunta.
— Oi, sim. Desculpe, não me lembro do senhor. — Eu realmente não lembrava e não fazia questão até então.
— Claro que não lembra. Meu nome é Saulo. Eu e seu avô fizemos a rota até o Acre pelas montanhas um ano antes dele falecer. Aprendi muito com aquele velho safado! Ele era incrível! Te reconheci por fotos da família que ele me mostrava... O que te traz para esse fim de mundo, jovem? Não me diga que também está atrás de amuletos?
Ele estava certo. Minha viagem para a amazônia tinha como objetivo terminar as buscas do meu avô, que estava muito perto da sua maior descoberta, quando morreu picado por uma aranha venenosa.
— Sim, sim. Ele chegou bem perto. Espero que eu consiga achar o que ele procurava e dar o reconhecimento póstumo que ele merece. Foi o trabalho da vida dele. Como herdei seu amor pela história e desconhecido, me achei na obrigação de concluir suas pesquisas.
— Ah, claro! Boa sorte. Eu poderia lhe oferecer meus serviços de segurança e guia, mas acabei de ser contratado por uma dondoca britânica, então... Mas se precisar pode me contactar por rádio, caso haja algo em que eu possa ajudar. Eu gostava muito do seu avô, ele era um velho muito legal. Quero muito participar disso!
— Agradeço imensamente a ajuda, senhor Saulo. Vou sim!Nos despedimos por aceno. Fui para o meu quarto, que surpreendentemente era uma suite. Tomei um banho e comecei a arrumar minhas roupas na cômoda em frente a cama e ajeitar meus livros sobre a mesa encostada na parede da janela. Foi nesse momento que eu vi a tal "dondoca" britânica chegar, com sua comitiva, igual a todos os ricos. Uma moça com roupas que não condiziam com aquele lugar. Um vestido longo azul e um colar de ouro no pescoço. Seus cabelos estavam presos em um coque muito bem arrumado. Uma senhora a abanava e ficava o tempo todo tentando limpar o seu vestido, o que visivelmente a incomodava. Havia quatro homens com elas. Um deles não parava de se coçar, um mauricinho engravatado. Outro, mais simples, porém de postura, conversava com o dono da pousada e gesticulava bastante com as mãos. Os outros dois, um não saia do lado dela e o outro circulava os carros em que vieram como se procurasse algo e todo barulho lhe chamava atenção.
Me perguntei o que ela fazia naquele fim de mundo e fiquei observando Saulo se apresentar a ela, em português. Quase botei as orelhas para fora da janela para ouvir o que conversavam, mas fui percebido por um dos "pitbulls" dela e morri de vergonha. Rapidamente fechei a janela, mas continuei ali atras da parede tentando ouvir. A única coisa que entendi é que as pessoas com ela se tratavam de um mordomo, uma cozinheira, dois seguranças e um advogado da família. E que eles estavam ali para escondê-la de um perigoso assassino que a perseguia.
Eu fiquei muito mais curioso sobre tudo e decidi que iria tentar fazer amizade com eles mais tarde.
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Horror Na Floresta
TerrorNa tentativa de terminar a ultima jornada expedicionaria de seu avô, Lucas viaja para a alta Amazônia, onde conhece a britânica Jessy e o melhor amigo do seu avô, Saulo. Jessy tenta se esconder na floresta, pois alguém estava assassinando toda a sua...