I've come to burn your kingdom down.

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Fechando a porta atrás de si com toda a força que tinha, a garota derrubou a bolsa pesada no assoalho de madeira. Ficou parada uns segundos no hall de entrada, absorvendo o ar morno do ambiente, esperando que seu nariz parasse de doer pelo frio, que seu pulmão sossegasse.

Ela respirou fundo e trincou os dentes. Era uma espécie de ritual que costumava anteceder lutas.

Alguma coisa a impediu de falar qualquer palavra para o garoto sentado na porta que dava para os fundos, ainda que aquela fosse a casa dele e ela fosse tecnicamente a visita que devia se anunciar. O fato de que ele estava ali que nem um louco, tentando arranjar uma hipotermia e enchendo sua cozinha de frio e neve, impulsionou uma raiva adormecida dentro de si.

- Oi – ele tomou a iniciativa de dizer, ainda sem se virar para vê-la.

A simples palavra bastou para fazer o copo transbordar.

- Que porra foi aquela? – Clove cuspiu, tentada a puxar a jaqueta de Cato e obrigá-lo a olhar pra ela de verdade. Contudo, ela tinha muita ciência de que a força dele ia dominar a dela em segundos. Ela se contentou em pairar de pé exatamente ao seu lado, chutando sua perna de leve ao fazê-lo. – Eu vou ficar com pena da sua cara ridícula se o seu showzinho causar mais alguma merda, seu filho da puta.

Ela esperou, parada naquela pose de poder. Então ouviu um suspiro vindo dele, como se ele fosse começar a rir.

- Você viu a cara deles?

Clove sabia que ele não tinha sido feito pros Jogos desde que matou seu primeiro tributo, quase três anos atrás. Ela viu a névoa estranha que se espalhou nos seus olhos, ela ouviu as risadas estranhas que ele soltava às vezes.

Mas isso de agora era diferente.

- Seneca Crane já está morto, Cato.

- Que ruim para ele.

Clove adorava as gracinhas que vinham dele.

Eles sustentaram o contato visual por uns segundos. Cato ergueu as sobrancelhas e riu na cara dela, daquele jeito de quem lança um desafio que sabe que a outra pessoa não vai aceitar. No entanto, uma mudança leve na sua expressão facial o fez reconsiderar.

Era estranhamento. Porque Clove, Clove, estava achando ele estranho, ele mudou o tom de voz.

- Você não é burra, todo mundo sabia que isso ia acontecer.

Ela não podia dizer que estava surpresa ou confusa pelo quão simplório – ou perturbado – o pensamento de Cato era. Alguma outra coisa atravessou a mente de Clove enquanto ela bateu a porta da cozinha atrás deles e se sentou ao seu lado. Talvez o rastro de uma solidariedade que ela não sabia como ter. Talvez preocupação. Talvez alguma outra coisa.

- Eu não sou mesmo. Nem você devia ser desse tanto.

- Fala o que você tem pra falar – ele quase ordenou num tom impaciente, de novo sem olhar para ela, escolhendo encarar aquela neve opressora, poderosa, que cobria e dominava tudo.

- Você é esperto o bastante pra saber que o Crane ia ser morto rápido desse jeito, mas não consegue saber que você também vai ser se não calar a porra da boca?

- Você está muito tensa.

E foi isso. Sem mais palavras, sem outra explicação. Tudo recaía sobre ela sendo paranoica.

Depois de alguns segundos naquele silencioso placar empatado, Clove foi obrigada a pensar em um ataque novo. Ela ponderou sobre o que o perturbaria mais, no quê o deixaria com raiva o bastante para abandonar aquela encenaçãozinha de tranquilidade, de consternação. Não combinava com ele.

Glory and GoreOnde histórias criam vida. Descubra agora