8 | Besouro suco

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Jungkook

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Nunca pensei que presenciar Jimin Park chorar, pudesse mexer comigo da forma que mexeu.

Daquele lance, a mera distância de alguns passos me impedia de tocá-lo. Não longe o bastante para que eu não notasse o seu cenho abatido disfarçado pela sombra de um sorriso, e arrebatadoramente curioso para não me impedir de questionar sobre aquilo. Sobre o que teria apagado o brilho do seu olhar, e o coberto daquela áurea que me fazia me sentir impotente. Ele estava lá. Eu aqui. E aquela conclusão anterior retornou, dessa vez, me apertando de um jeito mais cruel.

Estávamos há milhares de distância um do outro.

Quem eu era, afinal? Quem eu era para desejar enxugar todas aquelas lágrimas? E porque eu desejava tanto que estava começando a me sufocar?

Quando o deslumbrei naquele calçamento do Queens, por um momento, quis fugir. Me imaginar ao seu lado, começou a soar errado.

"Estou feliz por termos nos encontrado aqui."  Você disse. Então me golpeou de tudo que me impedia de ficar longe de você. Aquele abismo das nossas realidades sumiu, nossas contas bancárias pouco importaram, nossos sobrenomes caíram no esquecimento, o fato de que aquele era você e esse sou eu...não existia mais. A cada vez que eu caminhava, sentia o chão se transformando em um campo minado. Um passo em falso e BUM! Nossas visões de mundo se chocariam e nos levariam a frustração. 

"Você é alguém agradável de ser estar." 

Quem era a pessoa que te fez esquecer o azar do seu dia, Jimin? Se eu tivesse respondido que meu alguém era você, teria feito o mesmo? Cambaleei, com medo, então fugi. Porque se a resposta não fosse eu, teria sido meu passo em falso. Aquela bomba explodiria em pedaços que eu teria que catar sozinho.

Por que ver você chorar doía tanto?

Por que caralhos eu continuava pensando em você mesmo estando em um velório?!

Você vai pagar caro, Jimin Park.

— Com respeito e reverência, nos despedimos de Ning Tuyet, cuja jornada neste mundo foi uma dança delicada, tecida com fios de compaixão e coragem. Que suas pegadas, agora silenciosas, deixem uma marca indelével em nossos corações — recitou o monge, se reverenciando a todos que estavam na sala.

O velho era decrépito, tinha a cabeça raspada, era envolto em um manto monástico que resplandecia em tons vibrantes de laranja e açafrão, visíveis à distância. Ele estava de costas para o gigantesco monumento; um arco de flores e ornamentos envolvia a fotografia da falecida tia Ning. Na imagem, ela parecia radiante, capturada no auge de seus trinta anos. A escolha de uma foto tão antiga me provocou questionamentos. Da última vez que a vi, seus dentes estavam todos podres.

Todos que estavam ali sabiam que sua morte estava próxima, eles só não sabiam que estava tão próxima assim. A notícia do seu falecimento me pegou desprevinido, mas não o bastante. Ela fumava cinco maços por dia!

— Forma não é diferente de vazio, vazio não é diferente de forma. O que é forma é vazio, o que é vazio é forma — os clérigos budistas recitaram a sutra, e eu sei lá o que isso significava.

Me sentia um impostor no meio daqueles religiosos. Eles sabiam que a última vez que pisei em um templo mostrei o pau para uma velha? Eu tinha esperança de que aquele monge caindo os pedaços tivesse esquecido do meu rosto e do meu infortúnio. Como caralhos ele ainda estava vivo? Lembro de tê-lo visto quando criança, e naquela época, ele já era idoso.

REFLEXOS • jikook (1988)Onde histórias criam vida. Descubra agora