Capítulo Quatro

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O quarto que eu divido com Camille na casa de praia é bem pequeno. Duas camas de solteiro lado a lado e um guarda-roupa compõem o ambiente. Está impecavelmente arrumado e limpo. Sobre as camas, colchas de quando eu era criança. É claro que eu trouxe comigo o meu fiel escudeiro: meu ursinho marrom que tenho desde bebê. Desabo sobre ele na cama e fecho os olhos.

Que diabos eu fiz? Como pretendo um dia conquistar esse homem, correndo feito uma boba desse jeito? Está de parabéns, criançona!

Viro, encarando o teto. Jace está de volta. Quatro anos depois. O sorriso lindo dele, feliz ao me ver, não sai da minha cabeça. Mas a sua indiferença sutil depois disso, também não.

Uma batidinha à porta me arranca dos meus pensamentos. É Jhon, que entra todo desconfiado e senta na minha cama. Vira a cabeça de lado para me encarar na horizontal.

– Ah, qual é Jhon! Vai começar? – sento, emburrada. – Eu sei, fiz besteira. Tive um péssimo comportamento! Feito uma completa idiota! – levanto os braços para o alto e os deixo cair em minhas pernas, totalmente arrependida.

– Anda, maninha...– aponta a porta com a cabeça. – Vamos jantar. – meu irmão sorri. Devo ter mesmo cara de idiota!

– Não estou com fome, Jhon! Vai você. – deito novamente na cama e coloco as mãos na cabeça. Ou seja, fim de papo, estou com dor de cabeça. Mas ele não desiste.

– Clarissa, pare de bancar a bobona... –sorri mais uma vez.

– É isso mesmo que eu sou! Uma bobona!– abro os braços visivelmente irritada. – E que tanto você ri? – falo de forma agressiva.

– Opa! Sou eu, seu irmão. Baixe essa guarda ou teremos problemas sérios aqui... – não parecia estar brincando. Jhon chateado podia me custar semanas sem, ao menos, me dirigir uma única palavra.

– Ok. Desculpa. – sento na cama e baixo os olhos. – Você não vai querer que eu fale sobre isso, né? – olho pra ele com súplica. – Por favor...

– Clary, eu vim aqui só para chamar você para jantar! Se não quer, já estou de saída. – levanta e se vira para ir embora.

Ufa. Poupada de ter que explicar a minha cena desprezível. Mas ele volta. É claro que vai soltar uma liçãozinha de moral antes de ir. Típico de cenas em que meninas cometem gafes que não conseguem justificar.

– Não é a mim que você deve desculpas. – pisca um olho. – Fica a dica.

Quando o meu irmão se vira novamente para sair, escuto novas batidas à porta e sento imediatamente, trazendo meu ursinho ao colo. Jhon abre a porta e a figura atlética de Jace aparece, esperando para entrar no meu quarto. Meu coração resolve sair pela boca e eu sinto aquela mesma explosão, só que agora, dentro do estômago. O que eu faço? Preciso pensar no que dizer, preciso pensar!

– Posso falar com a Clary, irmão? – Jace se dirige a Jhon e volta novamente a olhar para mim. Meu irmão confirma com a cabeça e bate a porta atrás de si.

Não posso parecer uma tola agora! Não mesmo! Nada de insegurança, Clarissa! Nada de insegurança! Ele está de volta! E essa é a sua chance de recuperar a intimidade que sempre tiveram.

Quatro anos! Ele está ausente há quatro anos! Deixou aqui uma criancinha e agora... Deve estar confuso. É isso! Ele está muito confuso. Não sabe mais as coisas que gosto de fazer, as porcarias que gosto de comer... Tudo é novo.

Para mim, ele é o mesmo Jace. Mas aquela Clarissa de maria-chiquinha, chupeta e ávida por saco de balas, não existe mais. Agora, não é mais uma rodopiada no ar, um empurrão no balanço e cosquinhas na cintura que vão fazer de mim a menina mais feliz do mundo. Eu cresci. E ele notou isso.

Boa, Clarissa! Agora sim você mostrou que está amadurecendo! Suspiro e aguardo que Jace comece a falar. Mas ele apenas me olha, numa mistura de surpresa e afeto. Será que o “você sempre será minha garotinha e eu vou te amar para sempre.” Vai resistir a esse salto no tempo? Ele aponta os pés da minha cama.

– Posso? – exibe seus dentes perfeitos em seu sorriso mais lindo e continua a me olhar, talvez tentando encontrar a mesma menininha que deixou para trás.

Tirando o fato de eu estar com um ursinho no colo e de ter corrido dele há alguns minutos, nenhuma semelhança.

– É claro. – resolvo começar a falar e me surpreendo porque a minha voz parece bem firme dessa vez. E porque sai da minha boca mais do que o oi sussurrado que só consegui dizer até agora. – Eu te devo um pedido de desculpas, Jace. Desculpa. Fui muito grosseira saindo da sala daquele jeito.

Ele continua a me fitar, visivelmente admirado com as mudanças que havia ocorrido em mim.

– Clary, quem deve desculpas sou eu. Fui extremamente precipitado, tratando você daquela maneira! Imagina só... Você não tem mais nove anos de idade! E eu te rodando no ar, feito um tremendo idiota! – ri. – Agora vendo você assim... com essa voz de moça, crescida... me sinto envergonhado por ter tratado você como criança.

Há muita verdade nessas palavras. Muita. Eu posso sentir. Enquanto eu pensava que ele não queria mais ter de volta a nossa amizade, Jace se preocupava em estar me aborrecendo com brincadeiras de criança! Quanta ironia! Tudo o que eu mais quero é que ele cante até que eu pegue no sono e me conte histórias de príncipes e fadas.

– Clary, eu não quis chatear você. Essa não foi minha intenção. Estou desculpado?

Eu me sinto à vontade perto dele agora. Toda a atmosfera pesada se quebrou. Dou um sorriso amoroso e espero até que ele sorria de volta. Ah, se Isabelly, minha melhor amiga, pudesse me ver nesse momento! Ela ficaria surpresa com a minha cara vitoriosa.

– Pode me chatear o quanto quiser... – continuo sorrindo.

– Amigos? – estende uma de suas mãos.

– Amigos! – aperto a mão dele e sinto um calor acalentador invadir meu peito.

Agora, sim, eu me sinto em casa.

Um amor quase impossível Onde histórias criam vida. Descubra agora