Mais uma história de vida miserável

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Os gritos de uma voz masculina denunciavam que não estava mais apenas mãe e filha na casa, seu pai também estava ali, significa que a paz havia dado uma trégua e o caos se instalaria por algumas horas.

Sempre era assim, seu pai chegava e uma nova discussão se iniciava por qualquer motivo que fosse, e sempre acabava em choro.  No final de tudo, todos estavam acabados. Seu pai de um lado, sua mãe de outro e Seulgi bem ali no meio daquilo tudo, ouvindo as afrontas de seu pai para com a sua mãe, que respondia a altura e ganhava vez ou outra um rosto vermelho e ardido. Seulgi se sentia grata por pelo menos não passar de tapas, não queria ter que chamar a polícia para o próprio pai, mesmo que se fosse pensar melhor, ela deveria fazer uma ligação para que a socorressem agora mesmo.

Mas Seulgi não queria ter que ouvir os gritos histéricos de seus pais aquele dia, ela já tinha sua própria consciência lhe importunado naquele momento, foi por isso que ela simplesmente deixou seu quarto, fugindo pela janela, e iniciou uma caminhada sem ao menos estar com uma roupa própria para aquilo. Sua psicóloga disse uma vez, que quando sua mente estivesse gritando demais seria bom que ela iniciasse alguma atividade física para dispersar as vozes, talvez a doutora não contasse com vozes perturbando sua paciente às 01:40 da manhã, era isso ou Seulgi estava ocupada demais olhando a vista da janela da sala de sua doutora que não prestou atenção no que de fato a mulher tinha dito a ela. Começar uma atividade física para que as vozes se tornassem menos presentes, isso que a mulher havia dito.

Mas não importava, nada importava. Sendo sincera Kang Seulgi não se importava com os perigos da madrugada, ela só queria que sua cabeça se calasse e ela pudesse fugir para algo ou algum lugar que lhe desse o mínimo de conforto.

A ponte dos suicidas.

Seulgi não pensa em acabar com sua vida, ela já presenciou muito bem o que acontece na vida de seus entes queridos quando você parte. Seulgi perdeu sua irmã daquela forma, a depressão levou sua irmã caçula e ela se perguntava o que infernos estava fazendo na época que lhe fez cega ao sofrimento de sua própria irmã.

Seus pais também pensavam assim, ela sabia disso, por mais que lidassem da pior forma possível sobre o que aconteceu. Espera-se que os adultos sejam mais fortes e sensatos quando algum problema acontece, certo? Teoricamente sim, mas Seulgi percebeu que seus progenitores não souberam lidar com a dor de perder uma filha de forma tão trágico.

O homem, afim de encontrar algum conforto, se viciou em álcool e a mulher simplesmente desistiu de tudo. A Senhora Kang se esqueceu de que era mãe de duas filhas e não apenas uma, com consequência disso Seulgi teve que lidar com tudo sozinha.

Cuidou do enterro sozinha, guardou todas as coisas de sua irmã sozinha, chorou noites e mais noites pela falta da irmã sozinha, sentiu culpa sozinha, sentiu pesar pela irmã sozinha, tentou entender as escolhas dela sozinha, aceitou o fato de que a irmã jamais voltaria para ela sozinha e por fim tentou superar sozinha. É claro que essa parte é o mais difícil, ainda é doloroso se lembrar do sorriso de sua caçula e saber que Yerim nunca mais irá rir com ela, para ela.

Era um processo difícil e ela estava indo bem.

Conseguiu um emprego sozinha e pagou uma psicóloga sozinha. Seulgi se tornou independente aos dezoito anos, como tinha que ser, certo?

Sua mente estava menos agitada agora, enquanto cessava a caminhada e começava a andar em passos desleixados pela ponte, olhando a imensidão das águas escuras a sua frente, naquela madrugava fria, que deixava suas mãos geladas e corpo também. Como tinha que ser.

Seulgi procura algum estabelecimento aberto para que ela possa tomar uma água, estava com sede pela correria afinal, é quando seus olhos fitam uma mulher que possivelmente teria o mesmo fim que sua irmã teve.

Borderline - Seulrene Onde histórias criam vida. Descubra agora