Filho do Destino

Capítulo 1

Tudo começou quando um rumor perigoso chegou a Awa'atlu. Os Metkayina tinham guerreiros que serviam como espiões, faziam expedições ao redor e a lugares ainda mais distantes, para que soubessem o que estava acontecendo e não estivessem totalmente isolados. Um desses rumores chegou ao ouvido de Tonowari, que por sua vez comentou com Jake Sully.

Seus filhos curiosos e atentos acabaram ouvindo uma conversa entre os pais. Entendendo do que se tratava, Kiri achou melhor falar diretamente com o melhor amigo.

-Ouviram falar que... o Quaritch pode estar vivo ainda - ela disse como receio a Spider - não pode ser verdade, não é? Meu pai deixou ele para trás, pra morrer, será que ele sobreviveria? Eu acho que não.

A história toda deixou Spider nervoso, mas não pelo motivo que Kiri imaginava. Ele sabia a resposta certa para essa incógnita, Miles Quaritch estava vivo graças a ele. Pelo jeito, tinha sobrevivido ao mundo selvagem de Pandora de alguma forma. Muito por causa dele, deveria ser, depois de tudo que tinha ensinado a ele.

-Spider? - Kiri o chamou, percebendo que tinha ficado quieto e pensativo.

-Oi? Desculpa - ele disse mais por reflexo do que por disfarce.

-Esse assunto ainda é difícil pra você, né? Me desculpa, só achei que fosse melhor você saber - ela se justificou.

-Tá tudo bem, Kiri, se você achou melhor me avisar, foi bom eu saber - ele improvisou uma resposta, voltando a ficar calado outra vez.

Spider não pôde dormir aquela noite, tudo que ficou pensando foi mas possibilidades de o que aconteceria se os Sully descobrissem que ele tinha resgatado Quaritch. Esse era um segredo dolorido que ele estava guardando para si, certo de que se alguém descobrisse, o tratariam como traidor.

Certo de que não havia nenhum cenário favorável para ele em toda essa situação, um plano desesperado se teceu em sua mente.

Ele participava de caçadas e patrulhas com os outros jovens, e foi isso que fez no dia seguinte, procurando manter a calma e não mostrar que estava nervoso e abalado.

Quando o ilu que Spider montava mergulhou, ele direcionou o pescoço do animal para a direção oposto, esperando que ele entendesse a instrução. O animal então fez isso, e o jovem retomou um pouco de fôlego, enquanto pensava no que fazer a seguir.

-Não vai muito longe! - ele reconheceu a voz de Lo'ak chamar ao longe.

Ele apenas ergueu um braço em resposta e se virou para o outro lado, entrando no meio de um fileira de rochas. Foi ali que ele decidiu o caminho que iria tomar, mostrou ao ilu para onde queria ir e o animal deslizou rapidamente pela água, o deixando parte na superfície.

Indo o mais longe possível, ele deixou o ilu retornar para a casa. Não podia arriscá-lo também. Ele parou em uma formação rochosa, ainda havia um caminho de grandes pedras em que poderia caminhar. Faria isso até encontrar alguma comida, com sorte.

Pequenas plantas cresciam ali e depois de examinar seu cheiro, percebeu que conseguiria sobreviver das folhas e frutos. Ao menos, a fruta redonda e avermelhada tinha água e polpa o suficiente para mantê-lo.

Seu plano agora era encontrar outro clã que não estranhasse sua aparência e lhe ajudasse, o que era pedir por um milagre. Ele continuou caminhando pela formação rochosa, até as pedras acabarem e se ver totalmente ilhado. A esperança brotou quando ele viu uma ilha ao longe. Esperança essa que se tornou medo ao ver o enorme vulcão expelindo fumaça. Aquele era território do clã das cinzas, altamente violentos e portanto, evitados por todos.

Ali no meio do nada, Spider sabia que só encontraria Na'vis ali. Teria que se arriscar. Com um literal salto de fé, pulou na água e se pôs a nadar, contando com o fato de que conseguiria chegar à praia.

Quando sentia cansaço, tentava se mexer menos, mas continuar se mexendo antes que afogasse. Eventualmente, seus pés pisaram o chão e ele percebeu que estava quase em terra. Os joelhos cederam pela dor, o fazendo cair de uma vez, na areia da praia. Só teve tempo se virar para cair de costas, completamente estatelado e cansado.

Fechou os olhos, sentindo os músculos doloridos, esperando que o pior não acontecesse, fosse ele capturado ou acabar morrendo mesmo, por estar fraco.

Seus sentidos se apagaram apenas em forma de sono, ele adormeceu e só acordou novamente, notando a presença de algo ou alguém ao seu redor.

Os guerreiros do Clã das Cinzas o encararam com cuidado. Nunca tinham visto um ser humano tão de perto, mas sabiam de sua fama por todo planeta. Invasores do céu, destruindo tudo que viam pela frente. Porém, aquele indivíduo em particular era completamente o oposto disso. Era muito pequeno, se trajava como os na'vi, tendo até mesmo a marca de tinta ao redor dele, como um guerreiro tribal.

Havia uma estrutura estranha protegendo seu rosto, o que fez com que os guerreiros cutucassem o objeto. Spider se sentiu ameaçado e em alerta, se levantou rapidamente, rosnando em posição de defesa, embora exibisse dentes muito pequenos.

A atitude provocou um pouco de riso dos guerreiros, porém Rayfu, seu líder, sendo mais prudente, resolveu que seguiria as instruções de sua olo'eyktan, trazendo qualquer intruso ou estranho à presença dela. De qualquer forma, só Varang poderia decidir o que fazer como o rapaz.

-Deixem-no - ordenou Rayfu - vamos levá-lo até Varang.

Spider compreendeu as palavras perfeitamente e, se lembrando de que estava lidando com guerreiros do clã das cinzas, resolveu não tentar nada arriscado.

Um dos guerreiros empurrou Spider com a lança, o fazendo entender que deveria caminhar com eles. O menino apenas se conteve, obedecendo silenciosamente, para o próprio bem.

Spider observou o caminho ao seu redor, percebendo a fuligem no ar, os vulcões ao longe, expelindo fumaça, as pessoas, muito comuns aos olhos dele, acostumado aos costumes na'vi, as construções em cabana, com folhas e troncos.

Para o menino, tudo aquilo podia ser comum, mas ele, muito pelo contrário, era a atração do momento. Os olhares eram curiosos, assustados, até mesmo acusadores. Ele captou murmúrios sobre sua aparência e como tinha parado ali, mas tentou ignorá-los. Tirando-o de seus pensamentos, um dos guerreiros o empurrou para uma das cabanas, indicando que ele deveria ficar ali. O medo tomou conta de Spider, não fazia ideia se o matariam, se o manteriam como prisioneiro. Fosse o que acontecesse, só restava o menino esperar. E era justamente a espera que alimentaria seu desespero.