𝐂𝐇𝐀𝐏𝐓𝐄𝐑 𝟏

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𝐊𝐀𝐈𝐐𝐔𝐄

  Observo as nuvens fofinhas pela janela do avião enquanto penso em quanto minha mudou —para pior, vale ressaltar— de uma hora para outra. Em um momento eu estva aproveitando minha vida em BH e no outro, minha mãe estava morta, sim morta e eu sou forçado a ir viver com meu pai.

  Pai...essa é uma palavra que eu até um tempo atrás desconhecia o significado, na verdade ainda desconheço, nunca tive um em minha vida afinal. Meu genitor é mais um dos grandes imbecis que saem para comprar cigarro e não voltaram mais, na verdade ele voltou, após 9 anos, aí eu já não queria mais nenhum contato com ele.

   Meu pai se chama Bruno Bittencourt, o famoso Bruno playhard, ou PH. Ele é o dono de uma das, se não da maior organização de esportes eletrônicos do país. Aí você me pergunta, "poxa Kaique, não é legal ter um pai famoso?", não, não é legal.

  Eu nunca tive a presença do meu "pai" em festas de aniversário, em eventos escolares, em uma reunião de pais e mestres ou simplesmente em algum momento que fosse importante para mim. Ele não estva lá quando eu troquei meus primeiros passos ou perdi os primeiros dentinhos e sequer me deu o suporte que eu precisava de uma figura masculina, ele estava muito ocupado tentando crescer na Internet.

  Claro, em partes eu entendo, ele era jovem, ter um filho aos 15 anos não é o desejo de ninguém, também não era o da minha mãe, então por que ele não podia cuidar de mim assim como ela fez até os últimos dias de sua vida? Mesmo sendo uma surpresa para ela ter ficado grávida, ela não desistiu de mim, pelo contrário, ela foi uma mulher incrível que sempre esteve lá, ela cuidou de mim quando eu estava doente, estava na primeira fileira para assistir minhas apresentações, era a primeira a chegar nas reuniões, e me apoiou quando eu me descobri gay. Ela sempre esteve presente em minha vida, sem a ajuda de ninguém, pois a família dela a deserdou quando descobriram da gravidez.

  Por boa parte da minha infância eu me perguntei o por quê dele não querer fazer parte da minha vida. Eu me perguntava todo santo dia porque as outras crianças tinham uma família completa e eu não. Mas aos 8 eu parei de me importar, eu apenas percebi que eu devia dar valor a quem estava sempre comigo e parar de me matirizar pelas que não estavam. E quando eu completei meus 10 anos, meu querido papai resolveu fazer uma surpresa e aparecer em minha festa de aniversário, aquele foi o pior dia da minha vida.

  Um momento que era para ser feliz, ele estragou com sua presença, pois ao ver ele todos os questionamentos que eu havia esquecido voltaram para minha cabeça, por que ele resolveu aparecer depois de anos? Quando eu precisei dele ele não estava lá por mim. Isso tudo resultou em minha primeira crise de ansiedade, sim, aos nove anos de idade.

  Depois desse dia eu falei para mamãe que eu não queria ver ele mais, eu não queria contato com ele e muito menos queria que as pessoas soubessem que eu era filho dele, ele não existia pra mim.

  Pelo menos ele foi um homem descente e começou a ajudar mamãe com minhas despesas, todo mês ele depositava 2.000 reais na conta da mamãe para ela comprar minhas coisas, felizmente ele sabia o gasto que uma criança/adolescente gerava e mandava a mesma quantia que minha mãe gastava comigo.

  Mas essa ajuda dele, que na verdade é obrigação, não impedia de eu sentir um aperto e até mesmo raiva quando eu escutava um de meus colegas falando o quanto o PH era legal e o quanto eles queria entrar para a Loud. Eu sentia vontade de falar que ele não era tão bonzinho assim e que ele havia errado muito com as pessoas que deveriam ser a família dele, mas eu nunca falei nada, mas ainda doía saber que aquelas pessoas que trabalhavam com ele supriam o papel que eu e minha me deveríamos fazer na vida dele. Ainda doía saber que ele só nos procurou após anos e que quando eu disse que não queria ver ele mais, ele simplesmente aceitou e não se esforçou para adquirir meu perdão.

  E doía mas ainda saber que agora eu não tinha mais minha mãe e que eu teria que viver com ele, eu odeio com todas minhas forças essa situação.

   Suspiro quando piso no grande aeroporto de São Paulo, arrastando preguiçosamente minhas malas, vendo as pessoas direcionarem seus olhares para mim, me encarando de forma estranha, não me surpreendia, eu estva mais parecendo um morto-vivo do que um ser humano, meu cabelo estava grande o suficiente para tampar meus olhos, que tinham olheiras abaixo deles e também estava com os fios lisos desengrenhados. Eu só não sabia se o motivo das pessoas estarem me encarando era por minha aparência horrenda, ou se era pelas malas fofinhas da Hello Kitty que eu carregava comigo e pela mochila dos Little twin stars em minhas costas — sim vadia, eu sou homem e gosto de Sanrio, vai chorar?— me sento em um banco e espero Bruno chegar, o que demorou quase uma hora.

Durante esse tempo eu fico observando as pessoas passarem diante de mim e irem abraçar suas famílias, seus namorados, amigos. Era bonito ver o reencontro delas, bem que dizem que em aeroportos estão os abraços mais sinceros.

  Depois de 50 minutos sentado naquele banco esperando Bruno, avisto ele andando em minha direção com um sorriso no rosto.

— Oi filho, me desculpa o atraso, eu estava em reunião e fiquei agarrado nela. — ele diz parando em minha frente. — Vamos?

— Podia ter me avisado. — falo me levantando.

— Me desculpe, era uma reunião importante, não tinha como eu mexer no celular. — ele diz entrando no carro e eu entro, me sentando no banco de trás, eu não queria ficar perto dele e ele aparentemente percebeu, pois durante todo o caminho ambos fomos em silêncio.

   Depois de chegarmos, subimos para o apartamento dele, ao contrário do que eu pensei, o lugar não era tão vazio e sem vida, era um apartamento bem bonito e grande na verdade.

  O apartamento todo era todo pintado de cinza claro, porém uma parede da sala era amarela, nela tinha uma estante geométrica que ia do teto ao chão, nela havia retratos, a maioria dele sozinho ou com os integrantes da Loud e outras coisas. Na parede ao lado da estante tinha um sofá retrátil e na frente dele, uma televisão grande de tela plana, atrás do sofá tinha grandes janelas que davam vista para a cidade.

  Na sala havia uma bancada, que a dividia da cozinha, que era gigante, ela é branca e preta. Depois ele me mostra o resto da casa e por fim, meu quarto, que ficava no segundo andar do apartamento.

— Aqui é seu quarto filho, eu não sei muito bem do que você gosta, por isso apenas mandei pintarem as paredes, vou deixar você descansar. — ele diz e sai do quarto, fechando a porta.

O quarto era grande e bonito, as paredes estavam pintadas de branco e uma era vermelha. Nela tinha uma cama de casal, forrada por um edredom vermelho, ao lado da cama tinha uma grande janela e na frente te dela uma TV grande de tela plana na parede.

Em cada parede do quarto tinha leds e do lado direito da cama tinha um setup completo, que eu iria aproveitar muito, afinal o meu havia ficado na minha antiga casa.

Ao lado do setup possuía um pequeno corredor que levava para duas portas, uma de cada lado, uma delas dava acesso a um grande closet, com uma parede inteira sendo um espelho e a outra era um banheiro espaçoso. Aquele quarto era gigante.

Arrumo minhas roupas e acessórios no closet e meus produtos de higiene no banheiro, logo após coloco no Setup algumas coisas que enfeitavam o meu antigo e eu havia trago, incluindo um figure action do Luffy de One Piece, que era muito importante para mim, minha mãe havia me dado como presente de aniversário de 9 anos, naquela época, o valor que ela pagou era alto para nossas condições, mas mesmo assim ela se esforçou e comprou, mal sabendo que eu nunca tinha assistido One Piece e sim Naruto — depois desse dia eu comecei a assistir One Piece— e também coloquei no Setup um porta-retrato com uma foto nossa nesse mesmo dia.

Após organizar tudo eu me jogo na cama e fecho os olhos, sentindo as lágrimas escorrerem por minhas bochechas e minha garganta apertar, até então eu havia ocupado minha mente para não pensar muito sobre a morte de minha mãe, mas ao terminar de organizar minhas coisas em uma casa diferente, em um estado diferente, minha ficha caiu, eu estava sozinho.

•✓𝐀𝐋𝐎𝐍𝐄 | ᴬʳᵗʰᵘʳ ᶠᵉʳⁿᵃⁿᵈᵉˢ ˣ ˡᵉⁱᵗᵒʳ ᵐᵃˢᶜᵘˡⁱⁿᵒ Onde histórias criam vida. Descubra agora