Capítulo 2

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Acordei no dia seguinte extremamente ansiosa, por dois motivos:
1 - Eu veria o Song e...

Tá, na verdade é só um motivo. A verdade é que eu estava completamente obsecada. Eu sei que a nossa interação na academia não foi das melhores. E eu estaria mentindo se não admitisse que fiquei um pouco decepcionada e chateada com a forma como ele me tratou, mas é o Song! E eu simplesmente não vou desistir dele só porque a minha primeira impressão não foi positiva. Mas também não vou dar o braço a torcer nem morta! Vou continuar fingindo que não tenho ideia de quem ele seja e ver até onde isso vai dar!

Quando eu saio do meu dormitório, vou direto para o refeitório tomar o café da manhã. Não tinha expectativas de encontrar nenhum dos soldados, pois sabia que eles acordavam bem mais cedo do que eu. Então, quando chego ao refeitório ele está praticamente vazio, o que me deixa feliz, porque consigo comer com tranquilidade e aproveitar o meu primeiro café da manhã na Coreia.
Quando termino, vou direto para o meu consultório organizá-lo. Entro no local e verifico os materiais que tenho a disposição. Verifico onde está cada objeto para que consiga localizar com facilidade se necessitar.
Coloco meu jaleco e estetoscópio atrás do pescoço e começo a guardar os demais equipamentos que eu trouxe comigo: esfigmo, oximetro, otoscópio...

Quando estou terminando de organizar tudo ouço uma batida na porta e por ela entram 2 soldados: um deles é alto, tem a pele bem branca e cabelos negros como a noite. E o outro, para minha surpresa, é Song Kang, que está apoiado no outro soldado para tentar andar.
Só quando saio do estado de choque por vê-lo de novo que percebo que seu pé está enrolado em várias faixas e pingando sangue.

- Oi, doutora! Sei que acabou de chegar, mas já trouxe um paciente pra você! - o homem de cabelos escuros me diz com um olhar brincalhão.
- Oi, podem entrar! Deixa eu te ajudar a colocá-lo ali na maca - respondo apontando para a maca atrás de mim

Depois de o colocarmos na maca, retiro as faixas e observo a lesão. O soldado, que se apresentou como Cabo Lee, diz que o ferimento foi causado por uma arma de fogo durante o treinamento, mas que a bala pegou apenas de raspão.

- A lesão foi superficial, mas vai precisar de alguns pontos para fechar o ferimento - digo tranquilizando-o - Está dispensado para retornar ao seu treinamento, soldado Lee. Fique tranquilo, depois que terminar aqui eu o acompanho até o alojamento. Por favor, informe o Capitão sobre o estado dele.
- Sim senhora! Obrigado! - ele sorri para mim -  Se cuida, irmão! - diz dando tapinhas no ombro de Song e nos deixando a sós.

Até então, Song estava de cabeça baixa e olhos fechados e levantou levemente o rosto apenas para se despedir do cabo Lee com os olhos ainda bem cerrados.
Preocupada, resolvi perguntar para verificar se não havia sinais de alguma lesão neurológica ou alteração psiquiátrica.
- Cabo, está sentindo mais alguma coisa? Tontura, náuseas...? Está com os olhos fechados desde que entrou aqui.

Com os olhos ainda fechados ele responde:
- Não, Dra. É que eu sempre desmaio quando vejo sangue, então já fechei os olhos pra evitar - diz ele meio constrangido.
- Não acha meio contraditório um soldado ter medo de sangue? - digo num tom mais brincalhão.
- Eu não disse que tinha medo! Disse que desmaiava, são coisas completamente diferentes! E a questão é que, infelizmente, eu não tenho controle sobre isso, me sinto assim desde criança. Então o jeito vai ser tentar evitar acidentes como esse até o fim do serviço militar - diz ele com ar de cansado - mas como você pode ver, meu plano não esta dando muito certo.

Enquanto ele estava distraído conversando, aproveitei para limpar o ferimento até que não tivesse mais sangue a mostra.

- Pode abrir os olhos agora, soldado. O ferimento já está limpo. Agora é só suturar - o aviso enquanto me estico para pegar os instrumentos para a sutura -  Mas sobre seu medo de sangue, fique tranquilo! Ele é bem mais comum do que imagina. Provavelmente outros soldados se sentem da mesma forma, só não admitem - digo para tentar fazê-lo se sentir melhor - E o que você fez pra conseguir essa bala de raspão?

Ainda desconfiado observo-o abrindo os olhos bem devagar, enquanto me explica.
- Não vi que a arma estava engatilhada e acabei apontando para o meu pé sem querer - diz ele corado e meio cabisbaixo - E eu já disse, eu não tenho med... - ele finalmente se vira para direcionar seu olhar irritado pra mim, mas observo suas feições se transformando em espanto quando ele finalmente me vê e me reconhece.

- Você... - sinto a tensão passando por todo seu corpo - Me desculpe doutora, quer dizer, capitã! Não sabia que era você - diz ele corando novamente.

Ver esse homem lindo corando na minha frente e por minha causa quase me fez infartar!  Mas mantive o semblante sereno e continuei a dar os pontos, quando respondi
- Está tudo bem soldado, não se preocupe.
- Não, não está tudo bem. Me senti muito mal ontem depois da maneira como falei com você na academia e tentei te encontrar para me desculpar, mas não te vi mais - diz pra mim com olhar de arrependimento - Eu não estava bem e acabei descontando em você. Me desculpa mesmo, capitã. Prometo que não vai se repetir.

Tento não parecer muito balançada após ele dizer que me procurou novamente ontem. Então continuo apenas olhando para a minha surura.
Corto o final da linha que estava usando quando finalizo meu último ponto e respondo olhando diretamente pra ele.
- Está tudo bem, soldado. Todos passamos por momentos difíceis, eu entendo. Mas obrigada por se desculpar - digo sorrindo - Se quiser conversar sobre o que te deixou mal ontem, estou ao seu dispor. Meu trabalho aqui é cuidar tanto da saúde física quanto mental de vocês. Então saiba que se precisar é só bater aqui. É melhor do que se enfezar com as pessoas na academia - digo dando uma piscadela para ele e me virando para descartar os materiais utilizados.

Ele assente, sorrindo pra mim, com as bochechas coradas.

- Terminamos por aqui! Daqui sete dias você volta pra gente tirar os pontos e ver como está a cicatrização, tudo bem? Vou te levar até seu dormitório - digo estendendo a mão para ajudá-lo a descer da maca
- Certo! Obrigado mesmo, Dra - diz olhando profundamente nos meus olhos.

Ele aceita a minha ajuda e segura a minha mão para descer da maca. Imediatamente sinto como se uma corrente de eletricidade tivesse passado por todo o meu corpo, me arrepiando por completo. Seu olhar flagra os pelos dos meus braços arrepiados e ele sorri enquanto desce da maca.
O filho da mãe sabe o efeito que tem nas pessoas! 

Passo seu braço por trás do meu pescoço e deixo ele se apoiar em mim até chegarmos em seu dormitório, onde o ajudo a se deitar na cama.

Quando ele me solta e não sinto mais o calor da sua pele sobre a minha, tento ao máximo esconder a frustração.

- Prontinho, está entregue! Se precisar de mim é só gritar - digo brincando, enquanto me levantou em direção a saída. Mas assim que começo a me afastar sinto seus dedos segurando delicadamente o meu pulso e volto a sentir aquele choque percorrer o meu corpo, enquanto me viro de volta para ele.
- Obrigado, Dra Clarisse - diz com um olhar sincero - Até daqui 7 dias - ele finaliza com uma piscadela, sorrindo pra mim.

Mando mentalmente as borboletas do meu estômago se controlarem, enquanto sorrio e me afasto desse homem que é a pura tentação.

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