Capítulo 3

22 4 10
                                    

A semana passou voando! Atendi vários soldados ao longo dos dias e fiz amizade com vários deles, inclusive! Todos me trataram super bem e adoraram saber que eu era brasileira. Em um dos jantares a noite eles até me chamaram para sentar com eles para eu contar um pouquinho de como é a cultura do Brasil e eles ficaram ainda mais empolgados!

Também consegui me adaptar melhor ao longo da semana e criar uma rotina nova. E foi graças a essa rotina que eu consegui ver o Song quase todos os dias, enquanto malhava na academia da base. Acabou que o horário que eu consegui para treinar bateu com o horário que os soldados estavam liberados para se exercitarem na academia. Então tive o privilégio de correr na esteira com a vista deliciosa do Song malhando. Quando eu tinha sorte, ele sentia calor durante o treino e tirava a camiseta.
A primeira vez que isso aconteceu eu quase caí da esteira, preciso admitir. Mas agora já estava preparada e sempre ansiava por esse momento. Posso estar ficando doida, mas tenho quase certeza que ele tirava a camiseta para se exibir para mim, porque o flagrei olhando diretamente para mim depois do mini strip-tease várias vezes. E em todas elas eu tentei desviar o olhar rapidamente, mas fui completamente entregue pelas minhas bochechas coradas.
Depois do dia no meu consultório, ele sempre me cumprimentava quando passava por mim, até mesmo durante as atividades com os outros soldados e eu sempre correspondia sorrindo para ele, mas nunca passou disso. A semana foi cheia dessas pequenas interações, mas não trocamos uma palavra se quer.

Por isso, quando completou os 7 dias para retirar os pontos, eu estava muito nervosa para vê-lo novamente. Acordei já ansiosa e foi rapidamente para o refeitório para tentar encontrar com ele e ver se ele falaria algo sobre o retorno.
Sai do meu dormitório e consegui avistar de longe que os soldados ainda estavam tomando café. Passei por várias mesas lotadas de soldados e sentei em uma logo a frente, mas não consegui encontrá-lo logo de cara. Na verdade, consegui ouvir apenas a sua voz vindo de uma das mesas misturada as conversas dos seus amigos.
- E aí, Song! Vai ver a sua namoradinha hoje de novo? - brincou um soldado que estava de costas para mim algumas mesas a frente
- É, Song! Conta aí pra gente, você já se encontrou com ela? Tenho certeza que já se beijaram - outro soldado brincou e os outros riram juntos da brincadeira
- Com uma médica daquelas eu tenho vontade de fingir estar doente todos os dias - zombou outro soldado
- Para com isso, gente. Já disse pra vocês que não tem nada rolando entre a gente! - ouço  Song explicando meio sem paciência
- Ah, corta essa cara! Você não para de olhar pra ela! Até na academia você fica distraído babando por ela! - um dos soldados implica, enquanto ouço vários outros concordando e rindo com ele.
- Vocês acham mesmo que eu, Song Kang, me envolveria com uma simples médica e, ainda por cima, brasileira? Nunca! Então param de inventar essas histórias!

Quando termino de ouvir ele dizer, sinto meus olhos marejados de tristeza e de decepção. Fico com a cabeça baixa até ouvi-los se afastando do refeitório para iniciar as suas atividades e saio correndo para voltar ao meu dormitório. Passo por trás dos alojamentos para evitar encontrar com eles e entro correndo.

Deito na minha cama e me permito chorar até cansar. Porque eu sei que depois da tristeza vem a raiva e ela é bem mais fácil de lidar do que essa dor horrível que eu sinto no meu peito.
Choro pela dor da decepção e por me sentir tão ingênua! Como eu pude achar que um ator coreano famoso, que pode ter qualquer mulher que ele quisesse, iria me escolher? Fui para a Coreia sabendo dos rumores sobre o preconceito que eles tinham em relação às mulheres latinas e mesmo assim me iludi achando que o Song seria diferente. Acho que, de tudo o que ele disse, isso foi o que mais me machucou.

Depois de chorar tudo que precisava, tomei um banho para me acalmar e me arrumar para os atendimentos do dia.
Dou uma conferida no espelho antes de entrar no consultório e percebo a tristeza ainda presente na minha face. Meus olhos estavam  irritados e um pouco vermelhos e abaixo deles olheiras roxas já tinham se alojado. Mas como estava atrasada para começar os atendimentos, não tive tempo de me maquiar para esconder.

Entro no consultório e, para o meu choque, Song já se encontrava me aguardando, sentado sobre a maca com os pés descalços balançando.
Quando me vê, sorri para mim, mas seu sorriso logo se disfaz quando ele percebe o meu estado.
- Meu Deus, você está péssima! O que aconteceu? - diz preocupado
- Não aconteceu nada - digo irritada. Nesse momento percebo que a fase da raiva chegou.
-Ah, tudo bem então - diz sem graça - Vim aqui para retirar os pontos, como você recomendou - ele sorri para mim novamente.

Assinto sem dizer nada e me sento em uma cadeira próxima a maca. Retiro uma tesoura da gaveta de instrumentos ao lado e seguro o seu pé para corar os pontos.

- Ei, eu estou reunindo coragem já tem uns dias para te perguntar isso - ele começa a dizer com as bochechas coradas - Eu queria saber se você não gostaria de ter um encontro comigo nesse final de semana - ele me olha com expectativa.

Sinto o ódio subindo e fervilhando meu sangue. Qual é a desse homem? Um segundo atrás estava me humilhando para os colegas e agora está aqui me chamando para sair?
Retiro o último ponto solto com a pinça e me viro para ele, fulminado-o com o olhar

- Não Song, eu não quero. Até porque, até onde eu sei, você nunca sairia com uma simples médica, não é mesmo? Brasileira, então? Nem pensar! - digo furiosa.
Jogo os materiais usados em uma bacia de descarte e digo seca antes de sair 
- Está liberado.

Bato a porta atrás de mim e entro no meu dormitório. Pela primeira vez na vida, sou extremamente grata por eles ficarem um ao lado do outro. Ando pelo quarto enquanto espero a raiva passar para voltar ao trabalho, quando ouço uma batida leva na porta.

Não abro de imediato, porque sei que é o Song, então ouço-o dizer:
- Me desculpa, Clarisse! Do fundo do meu coração! Eu não sabia que você estava ouvindo quando eu disse tudo aquilo!  - diz com a voz arrependida - Nada do que eu disse lá no refeitório é verdade! Só falei aquelas coisas para os caras desencanarem e pararem de implicar comigo! Desde o dia em que estive aqui eu não parei de pensar em você! E aí vieram os encontros na academia e tem sido cada vez mais difícil evitar olhar pra você o tempo todo. Os outros soldados perceberam isso e, desde então, estão me provocando. Disse todas aquelas mentiras para eles me deixarem em paz de vez e para eu conseguir vir conversar com você com um pouco de privacidade. - ouço ele encostando a cabeça do outro lado da porta - Me deixa entrar, Clarisse. Por favor. Vamos conversar.

Sinto as lágrimas descendo pelo meu rosto novamente e reúno toda a minha coragem para abrir a porta.

Quando sinto seu olhar sobre mim, olho no fundo dos seus olhos pela primeira vez no dia e vejo seu rosto se contorcer em pura tristeza e arrependimento. Ficamos nos encarando por alguns segundos antes de eu ser surpreendida com um abraço.
Song me puxa para ele e apoia minha cabeça em seu peito enquanto acaricia as minhas costas com uma mão e meu cabelo com a outra.
Ele se inclina de leve apenas para aproximar seus lábios do meu ouvido e sussurrar para mim:
- Me perdoe, Clarisse.

Algo que descobri apenas após esse momento com o Song é que seu abraço é capaz de curar qualquer ferida e de dissolver todo o ódio. E é por isso que quando voltei meu olhar para ele novamente e o senti aproximando seus lábios dos meus e roçando-os bem de leve, como se pedisse uma permição silenciosa para me beijar, eu permiti.

Alistados No Amor Onde histórias criam vida. Descubra agora