Capítulo 1: Piquenique de Primavera

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(1877 palavras)


24 de Abril de 1896

Charlottetown

A pequena Joyce acordou bastante animada. Assim que o galo do Sr. Hammond, cantou, ela se levantou e correu em direção à janela do quarto. Com os seus grandes olhos verdes, observou o sol brilhar do lado de fora, refletindo a sua luz nas gotas de orvalho espalhadas pelo jardim. Joy sabia que aquele seria um belo sábado primaveril, apesar da brisa fresca que envolvia a capital da Ilha do Príncipe Eduardo.

Entusiasmada, a garotinha de cinco anos saltitou pelo corredor, sem se importar com o barulho desagradável do piso rangendo sob os seus pés descalços. Desprovida de qualquer delicadeza, ela abriu a porta do quarto onde os seus pais dormiam e pulou em cima deles, fazendo com que Anne despertasse ao sentir o impacto.

- Oi, meu amor. - Sussurrou a mãe com a voz rouca, esforçando-se para endireitar as costas e lhe dar um beijinho de bom dia.

Gilbert, que descansava do lado esquerdo da cama depois de uma noite dura de trabalho, também acordou ao ouvir o som de uma risadinha travessa reverberar pelo cômodo. Ele se virou ainda sonolento, e viu a filha deslizar entre as cobertas para ocupar o pequeno espaço que o separava da esposa.

- Dormiu bem, abóbora? - Foi a vez dele perguntar entre bocejos, enquanto esfregava os olhos castanhos. E embora os anos tivessem passado, o seu terrível hábito de comparar cabelos ruivos com legumes permaneceu.

Antes de responder, Joy se moveu para buscar os braços aconchegantes do pai. Tendo em vista a agenda agitada que o Dr. Blythe cumpria, os preciosos momentos em que ela podia desfrutar da sua presença eram escassos. Como médico, Gilbert se encontrava com frequência sobrecarregado por infindáveis compromissos, e quando não havia nenhuma consulta marcada, uma emergência surgia para o arrancar do ambiente familiar.

- Vocês não se esqueceram, né? Hoje é o dia do piquenique!

Joyce amava piqueniques. A menina havia herdado a paixão pela natureza que sua mãe nutria desde pequena. Infelizmente para ela, os Blythes moravam numa zona urbana onde os espaços verdes se tornaram raros. Charlottetown, uma cidade charmosa, dispunha de todas as grandes invenções do século, como energia elétrica, telefones fixos, e de vez em quando, podia-se ver um automóvel passar pela rua! No entanto, a capital da província não tinha 1/3 da beleza rural de Avonlea, com seus campos floridos, bosques encantados e riachos cristalinos. Por esse motivo, dentre todas as tradições familiares, o piquenique de Primavera conquistou o coraçãozinho aventureiro da pequena Joy.

Com os olhos transbordando de ternura, Anne encarou a filha por alguns segundos, e então acariciou o seu cabelo desgrenhado.

- Claro que não, meu amor. Como poderíamos esquecer algo tão importante?

A menina sorriu, satisfeita com a resposta da mãe, e após um abraço bem apertado, saiu do quarto aos saltos. Diante da animação da criança, o casal não pôde conter a risada. Joyce honrava perfeitamente o seu nome, personificando a Alegria mais pura e singela.

No entanto, o momento de descontração foi interrompido pela tosse violenta que vinha incomodando Anne nos últimos meses. Gilbert, sempre prático agiu de imediato, aproximando-se da esposa e colocando a mão no seu ombro delicado:

- Anne, você está pálida. Se achar melhor, podemos adiar o piquenique e...

- E estragar a felicidade de Joy de novo? Não, Gil, é só um resfriado. Eu posso muito bem aguentar um pouco de tosse.

Desde que o Inverno assolou a cidade, Anne ficou mais frágil e lívida que o normal. Vez ou outra, surgia uma febre altíssima capaz de acamar a Sra. Blythe por dias, e nem sequer a chegada da Primavera trouxe melhora à sua saúde. Diante da fraqueza da esposa, o Dr. Blythe não hesitou em adiar a comemoração por semanas a fio, mesmo que isso significasse entristecer a filha. Afinal, o bem-estar da mulher que ele prometeu amar pelo resto da vida, era a sua maior prioridade. Todavia, o coração materno de Anne não suportava ver a decepção estampada no rostinho da sua garotinha. Lutando contra toda a dor que sentia cada vez que o ar fresco da ilha entrava nos seus pulmões debilitados, ela se levantou da cama amparada por Gilbert.

Joy of AvonleaOnde histórias criam vida. Descubra agora