Capítulo I - Bobo

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 "Meu joelho treme, treme, treme

Se você olhar para mim eu fico que nem uma boneca, boneca, boneca

Amor à primeira vista, acontece, acontece, acontece

Eu digo não para você, mas estou começando a perder a cabeça"

La Crisi a Saint-Tropez, Annalisa


– Era só o que me faltava hoje – resmungou o baixinho ruivo correndo da chuva para dentro da escola onde o filho de seis anos estudava.

Inesperadamente virou pai solo aos vinte anos e agora, aos vinte e seis, ele se desdobrava em mil para criar bem seu menino. O último ano havia sido especialmente difícil por ele ter se mudado com o menino para o Rio de Janeiro, ficando longe dos pais que viviam em São Paulo e que o ajudaram a criá-lo até então. Ainda contava com a ajuda deles sempre que as coisas apertavam financeiramente, mas o dia a dia sozinho com o filho era bastante complicado. 

– Desculpa – ele pediu à diretora da escola – Mil desculpas. Eu tô sempre correndo, sempre atrasado. E hoje com essa chuva quase não conseguia um carro.

– Entendo, seu Diego, entendo. Bom, chamamos o senhor aqui para falar sobre o comportamento do Theo. Ele brigou com um coleguinha pela segunda vez, puxou o cabelo...

Diego deu um longo suspiro. Até imaginava qual tinha sido o motivo mais uma vez... Theo era um menino doce e gentil, mas virava bicho quando os coleguinhas perguntavam sobre a mãe dele.

– Ele está numa fase difícil... Tô tentando administrar, já marquei uma psicóloga e garanto que vou conversar com ele sobre isso novamente.

– Ótimo. Já ia mesmo recomendar o acompanhamento psicológico.

– Ele fazia. Tivemos que parar, mas ele vai voltar. Desde a primeira briga que eu marquei – garantiu. No entanto, era meia verdade. Ele tinha de fato feito um orçamento para retomar a terapia de Theo mas as contas estavam um pouco apertadas, então adiou. Com a segunda briga, não tinha mais como evitar, mas teria que falar com seu pai mais tarde para ver se ele conseguia ajudar.

Depois de sair da sala da diretora, Diego foi buscar o filho na salinha de espera onde estava de castigo. No caminho, ouviu os trovões lá fora e percebeu que a chuva aumentou bastante.

– Papai!!! – Theo correu em direção ao pai e agarrou-se às pernas dele.

– Oi, meu amor! Cê tá bem? Como foi seu dia hoje?

– Foi bom!!

– Ah, é? Não foi isso que eu fiquei sabendo... Tem nada pra me contar, não?

Theo se fez de desentendido.

– Não.

– Theo! Eu soube que você brigou de novo.

– Você que falou que tem que se defender.

– É, mas eu soube que você começou... O que foi que aconteceu? Conta pro pai.

– É que o Enzo falou uma coisa aí eu bati nele.

– Falou o quê?

– Chamou você de coisa feia.

Diego deu uma respirada funda. Estava esperando briga por causa da mãe mas era por causa dele mesmo.

– Que coisa feia? Fala.

– A palavra com v... – Theo sussurrou. – Viadinho.

"Porra, eu nem dou tanta pinta assim", Diego pensou. "Aqui na escola principalmente... de onde esse inferno dessa criança tirou isso?"

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