PARTE 2 - OS JOGOS

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Por um momento, as câmeras focalizam o olhar abatido de Peeta enquanto suas palavras são absorvidas. Então, consigo ver meu rosto – a boca quase aberta numa mistura de surpresa e protesto – aumentado em todas as telas enquanto me dou conta do que está acontecendo. Eu! Ele está falando de mim! Pressiono os lábios e miro o chão, na esperança de esconder as emoções que começam a se agitar dentro de mim.
– Ah, isso sim é falta de sorte – diz Caesar, e há realmente uma pontinha de dor em sua voz. A multidão está murmurando em concordância, algumas pessoas já deram até uns gritos de agonia.
– Não é uma coisa legal – concorda Peeta.
– Bem, acho que todos aqui entendem sua situação. Seria difícil não se apaixonar por aquela jovem – diz Caesar. – Ela não sabia?
Peeta balança a cabeça.
– Não até agora.
Permito que meus olhos se fixem na tela de televisão o tempo suficiente para ver que o rubor
em meu rosto é indisfarçável.
– Vocês não iam adorar se ela voltasse aqui e desse uma resposta? – pergunta Caesar ao
público. A multidão berra em concordância. – Lamentamos muito, mas regras são regras, e Katniss Everdeen já esgotou seu tempo. Bem, toda a sorte pra você, Peeta Mellark, e acho que estou falando por toda Panem quando digo que nosso coração está com você.
O barulho da multidão é ensurdecedor. Peeta arrasou com todos nós definitivamente com sua declaração de amor a mim. Quando o público finalmente se acalma, ele deixa escapar um soluçante "Obrigado" e volta para seu assento. Nós nos levantamos para o hino. Tenho de erguer minha cabeça por conta do respeito patriótico e não consigo deixar de reparar que todas as telas estão agora dominadas por uma imagem minha e de Peeta, separados por alguns metros que, na cabeça dos telespectadores, jamais poderão ser apartados. Que tragédia a nossa.
Mas sei que não é bem assim.
Depois do hino, os tributos voltam enfileirados para o saguão do Centro de Treinamento e entram nos elevadores. Faço questão de entrar num que não esteja com Peeta. A multidão obriga nosso séquito de estilistas, mentores e acompanhantes a andar devagar, de modo que só os tributos acabam entrando nos elevadores. Ninguém dá uma palavra. Meu elevador para para depositar quatro tributos antes que eu consiga ficar sozinha e então vejo que as portas se abrem no décimo segundo andar. Peeta mal saiu de seu elevador e bato a palma da mão com força em seu peito. Ele perde o equilíbrio e se choca com uma urna horrível cheia de flores falsas. A urna se parte em centenas de pedacinhos. Peeta cai sobre os fragmentos e imediatamente começa a sair sangue de suas mãos.
– Pra que isso? – pergunta ele, estupefato.
– Você não tinha o direito! Não tinha o direito de sair dizendo aquelas coisas sobre mim! –

grito com ele.
Agora os elevadores se abrem e toda a equipe está lá, Effie, Haymitch, Cinna e Portia.
– O que está acontecendo? – pergunta Effie, um tom de histeria na voz. – Você caiu?
– Depois que ela me empurrou – diz Peeta, enquanto Effie e Cinna o ajudam a se levantar. Haymitch se volta para mim.
– Empurrou ele?
– Isso foi ideia sua, não foi? Fazer com que eu parecesse uma idiota na frente do país
inteiro!
– Foi ideia minha – diz Peeta, estremecendo ao retirar algumas farpas de suas mãos. –
Haymitch só me ajudou.
– Sei, Haymitch é muito prestativo. Pra você!
– Você é uma idiota mesmo – diz Haymitch, chateado. – Você acha que ele te magoou?

Aquele garoto deu a você uma coisa que você jamais conseguiria por conta própria.
– Ele me fez parecer fraca!
– Ele fez você parecer desejável! E vamos encarar os fatos, você pode usar toda a ajuda
que conseguir nesse departamento. Até ele dizer que te queria, você era tão romântica quanto um monte de sujeira. Agora todos te querem. Vocês dois estão monopolizando todas as conversas. Os dois amantes desafortunados do Distrito Doze! – diz Haymitch.
– Mas nós não somos amantes desafortunados! – retruco. Haymitch segura meus ombros e me encosta contra a parede.
– Quem se importa? Isso aqui é um grande espetáculo. O que importa é como você é percebida. O máximo que eu poderia dizer sobre você depois de sua entrevista é que você era uma pessoa legal, embora isso já fosse um pequeno milagre por si só. Agora posso dizer que você destrói corações. Oh, como os garotos lá do seu distrito caem aos seus pés. Qual vocês acham que vai receber mais patrocinadores?
O cheiro de vinho no hálito dele me deixa enjoada. Retiro suas mãos de meus ombros e me afasto, tentando clarear a mente.
Cinna se aproxima e me abraça.
– Ele está certo, Katniss.
Não sei o que pensar.
– Alguém devia ter me dito, para que eu não ficasse com aquela cara de idiota.
– Não, sua reação foi perfeita. Se você soubesse, não teria parecido tão real – diz Portia.
– Ela só está preocupada com o namorado dela – diz Peeta, rispidamente, jogando longe um
pedaço da urna cheio de sangue.
Minhas bochechas queimam novamente ao pensar em Gale.
– Eu não tenho namorado.
– Não importa – diz Peeta. – Mas aposto que ele é suficientemente esperto para identificar
um blefe. Além do mais, você não disse que me amava. Então, qual é o problema?
Estou absorvendo as palavras. Minha raiva está desaparecendo. Agora estou dividida entre achar que fui usada e achar que adquiri uma vantagem. Haymitch está certo. Sobrevivi à entrevista, mas o que fui de fato? Uma garota tola rodopiando num vestido cintilante. Rindo à toa. O único momento de alguma substância que tive foi quando falei sobre Prim. Faça uma
comparação com Thresh, com seu poder silencioso e mortífero, e me torno esquecível. Tola, cintilante e esquecível. Não, não totalmente esquecível. Tenho minha nota onze no treinamento.

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