Part 6: REDES SOCIAIS E A INVASÃO DOS BÁRBAROS

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Foram quase mil anos da chamada era do classicismo, quando a civilização greco-romana reinou soberana por quase toda a Europa, parte da Ásia e na África setentrional.

O latim era a língua culta, adotada universalmente em documentos, obras literárias, na diplomacia e nas conversações oficiais ou pela elite social. Suplantou o grego devido à precisão, a capacidade de exprimir de maneira clara e objetiva o seu sentido, nunca passível de interpretações subjetivas ou aleatórias.

O Império Romano entrou em decadência quando os valores éticos foram tragados pela concupiscência, arrastando consigo, para a ruína, a estrutura política e social que neles estavam fundamentados.

Sublevações se sucederam como epidemia e os povos tributários derrubaram a ordem estabelecida, incapazes, porém, de substituí-la por outra equivalente e a barbárie ressurgiu mais turbulenta e insana.

Hordas selvagens destruíram cidades, monumentos, templos e obras artísticas, numa rejeição feroz de tudo que lembrasse os antigos dominadores e toda a cultura e conhecimento de milênios teriam se esvaído na tormenta que se abateu sobre o então mundo civilizado se não fossem os mosteiros e abadias que os protegeu e conservou.

O idioma que dava unidade àquele amálgama de povos tão diferentes, o latim, se esfarelou e a linguagem falada tornou-se uma babel, com o retorno dos múltiplos vernáculos, carentes de estrutura gramatical. Isto agravou ainda mais o estado de conflagração entre as diversas etnias, pois sem uma linguagem comum, a possibilidade de chegar a harmonizar interesses se tornou mais remota.

Falemos agora das Redes Sociais.

Você deve estar um tanto perplexo. Que relação há entre o acima exposto com o mundo digital, as tais redes da internet? Chegaremos lá...

René Descartes (1596/1650) formulou de maneira lapidar, em latim, o sentido mais racional possível da nossa real presença neste mundo: "Cogito ergo sum" ("Penso, logo existo").

O pensamento é a mais rotunda expressão da consciência do ser. É dele que derivam a linguagem, as manifestações culturais e artísticas, a organização política e social, as regulações econômicas e mercantis, as relações sociais e as leis que as disciplinam.

O pensamento se exprime primordialmente através da palavra, escrita ou oral e esta será rica, bela, profunda, consistente e valiosa na mesma proporção da presença desses atributos na mente daquele que pensa.

Até pouco tempo atrás a palavra tinha como teatro de operações o intercâmbio entre pessoas, seja através de encontros, reuniões, palestras, seminários, cursos ou publicações em jornais, revistas e livros. Era mister que o seu uso se fundasse na lógica, no raciocínio, embasada, quando o caso, em argumentos, explicações ou fatos comprovatórios, para que pudesse ser considerada ou aceita. Ou se dizia que eram palavras jogadas ao vento, sem nenhum valor ou conteúdo.

A partir do império, da omnipresença que a internet passou a exercer sobre as pessoas, como sendo uma presença inexorável, da qual ninguém pode ou pretende se furtar, sob pena de ser considerada jurássica, ela passou a exercer uma influência deteriorante na habilidade essencial das pessoas: a de pensar.

É uma torrente, uma enxurrada de informações impossíveis de serem processadas, pelo ímpeto, quantidade e velocidade com que afoga o internauta: a dinâmica dos muitos gigabytes que o atira numa extensão geográfica e social em que a seletividade se torna inoperante.

Em meio a essa invasão, em que os meios outrora usuais de divulgação do pensamento – dos quais se exigia lógica, concatenação, conteúdo – foram perdendo espaço, as redes sociais assumiram o papel de porta voz dos que consideram dispensáveis o ato de raciocinar, de pensar com coerência e, ao abrir as páginas de facebook, whatsapp e outras mídias sociais, nos deparamos com a babel de opiniões, afirmações, ataques e defesas de pessoas, temas e situações, sem a mínima preocupação de embasamento em fatos, em provas, em realidade.

DE LULA PARA BOLSONARO OU DA LAMA PARA O ESGOTOOnde histórias criam vida. Descubra agora