As belas noites de domingo

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É domingo a noite e eu estou chorando no meio de uma festa, só pra variar (contém ironia)

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É domingo a noite e eu estou chorando no meio de uma festa, só pra variar (contém ironia). A garota que eu gosto me deu um fora, mas não é isso que me deixa triste. O ponto é que eu sempre me humilho por qualquer pingo de atenção que exista e eu nem sei porquê faço isso. Talvez o meu pai seja a principal causa de tudo isso, pois quando eu nasci, ele não esteve presente. Não o culpo, ele era jovem demais para se importar, mas minha mãe, apesar de muito jovem, sempre se importou, ela costumava acariciar meus cabelos quando eu estava com medo da chuva ou de qualquer outra coisa que viesse a ser assustadora para mim. Meu pai, mais tarde, tornou-se meu herói, ele trançava meu cabelo todas as manhãs antes de me levar a escola e contava de suas várias viagens que fez pelo mundo. Eu sabia que era mentira, meu pai nunca recebeu dinheiro suficiente para desfrutar desses luxos e, além disso, minha mãe desmentia tudo que ele dizia porque, segundo ela, era "pecado mentir para uma criança". Mas mesmo sabendo que tudo não passava do imaginário do meu pai, eu continuava ali, ouvindo atentamente a tudo que ele compartilhava, pois estar com ele era precioso e o agradeço até hoje por nunca ter me contado a mais pura verdade de sua vida. Minha infância amorosa era perfeita, no entanto, com o passar do tempo, eles ficaram mais distantes de mim e toda interação que  eu tentava com meu pai eram correspondidas com uma expressão raivosa e palavras como: "você tá atrapalhando meu filme!". Agora não existiam histórias malucas, viagens desafiadoras ou paisagens para imaginar, elas foram substituídas por uma tv no volume máximo, a cara fechada de meu pai e um    silêncio que partia o meu coração. Eu tinha dez anos quando tudo isso começou. No meu aniversário de onze, ganhei meu primeiro celular e decidi que era hora de buscar o afeto que precisava no mundo fora de casa. É aqui que começa minha caótica vida amorosa. Primeiro, fiz um perfil no Facebook e, meio influenciada pelas minhas amigas da escola, postei várias fotos sensuais em grupos pra descobrir se eu atrairia alguém. No começo, só consegui atrair uma mulher de uns 30 anos que me mandou um nude de corpo inteiro e velhos que tinham, provavelmente, dez vezes a minha idade. Mesmo que hoje eu tenha noção de como a atitude daquelas pessoas era problemática, naquela época só pensei no quanto eu seria burra de não aceitar conversar com as únicas pessoas que me deram atenção. Então, comecei perguntando sobre suas vidas, mas após algumas horas a conversa fluiu para o lado sexual e passei a me sentir desconfortável, pois eu era só uma menina, não queria sexo, queria amor, um abraço e alguém que perguntasse como tinha sido meu dia na escola. Entendi que eu não conseguiria nada disso ali, então comecei a jogar charme para os garotos e garotas da minha sala, alguém da mesma faixa etária que a minha com certeza me entenderia... mas não aconteceu. Apesar disso, ganhei um "não conta pra ninguém que fiquei com você", um beijo e alguns elogios como prêmio de consolação, então acho que valeu a pena, de certa forma. Após essas tentativas fracassadas, comecei a pensar em novas formas de buscar o carinho que eu precisava, mas não importava o que eu fizesse, eu sempre seria a garota excluída e esquisita da escola, então usei a Internet ao meu favor e busquei maneiras de ficar mais bonita e atraente. Também pedi dica às minhas amigas da escola, mas uma delas tinha síndrome de down e a outra, de acordo com os caras da escola, era feia. Para se ter noção, nós éramos conhecidas como a "tríade espanta macho", então elas com certeza não puderam me ajudar. E o meu defeito nesse trio eu lhe digo: eu era negra. A cor da minha pele, meu nariz achatado, minha boca grossa e meu cabelo cacheado por demais, era tudo que me tornava um defeito. Foi a partir desse ponto que resolvi aprimorar minha tática. Se ninguém me queria, o problema com certeza estava em mim, então pedi mil vezes a minha mãe para alisar o cabelo, mas ela não deixou, então dei meu jeito e comecei a deixar ele mais aceitável. Acordava uma hora mais cedo para me maquiar e definir meu cabelo. E, então, após oito meses, finalmente comecei a namorar. Só que estava tarde demais. A sensação de abandono e o vazio me levaram a traçar os primeiros cortes na minha pele antes que eu pudesse encontrar a primeira pessoa a me notar, mas mesmo assim, me mantive bela e destemida, era só sofrer em silêncio que tava tudo certo, não poderia entediá-lo com a minha tristeza.
Aos doze anos, fui pedida ao meu pai em namoro e no início era perfeito, eu tinha o amor e a atenção que eu queria, meu namorado me ouvia por horas e eu podia me expressar sem ser julgada ou reprimida, ele gostava dos meus traços e da minha personalidade. Apesar disso, tudo ficava cinza quando ele ia embora, na maioria das vezes, eu me trancava no quarto, chorava e me cortava. Nosso relacionamento ficou sombrio quando descobrimos o sexo. Como disse anteriormente, tudo que me importava eram as conversas e o carinho, não me interessava por nada mais íntimo. Portanto, tinha medo de ser deixada de novo e resolvi fazer o que meu namorado queria: boquete. Eu odiava o cheiro e a sensação de um pau enfiado na minha boca, mas eu fazia tudo, tudo pelo seu amor. A esse ponto eu já sabia que meu maior sonho era fazer oral na Patrícia, a garota mais bonita da nossa escola, então sempre imaginava que estava fazendo aquilo nela, e até que fluia bem. Nunca fizemos nada mais que isso, pois eu preferia morrer a ter que colocar aquela coisa dentro de mim, e ele não se importava com minha decisão, então ficamos bem. No entanto, nossa relação não durou muito porque, apesar de tentar bastante, eu continuava odiando chupar rola e quis me matar por não conseguir satisfazer ele. Todos os dias, me perguntava por que eu não era como as meninas da minha idade. Passei a me cortar com mais frequência e não suportei mais prosseguir com aquele relacionamento, foi aí que fiquei sozinha de novo.
Logo depois, mudei de escola e meus cortes, maquiagem pesada e roupas escuras chamavam atenção. Usei a tristeza ao meu favor e ganhei uma plateia de pessoas que se reuniam só para ver eu me cortar e mentir sobre ter coragem de matar várias pessoas. Era divertido, mas depois da euforia, quando todos me abandonavam, eu desejava a morte. Adoraria dizer que isso mudou, que estou bem agora, mas a única diferença é que tento me adequar ao mundo das mulheres, não mais aos homens, pois descobri que definitivamente não gosto de paus se metendo em nenhum buraco existente em mim. Enfim... Nesta festa, só percebo o quanto sou diferente, desnecessária e sozinha nesse mundo. Afinal, se nem meus pais gostam da minha presença, quem vai gostar? Eu tenho muitos à minha volta para culpar pela minha dor, mas a única que merece toda a culpa por todo esse passado e fracassos, sou eu mesma. Me odeio, odeio estar viva e quero que o mundo acabe aqui, nessa festa.

Monólogo de Um Adolescente (Trans)tornadoOnde histórias criam vida. Descubra agora