Edgar estava em desespero, não tinha esperanças em sair de lá.
O lugar era sombrio, pavoroso, assustador. As almas que vagavam por lá eram a pior parte, gritavam, esperneavam, xingavam, deixando o ar ainda mais sórdido.
As almas eram moribundas, haviam ferimentos expostos, apesar de vestes interessantes. Algumas haviam uma certa beleza, com cores vibrantes, tecidos caros e aparência luxuosa, mostrando uma riqueza em vida, outros, haviam roupas surradas, mais simples e com cores mais opacas.
Claro que as almas que haviam roupas luxuosas eram mais escassas, já que o dinheiro era dividido de forma que poucos acumulassem capital de forma a viver uma vida luxuosa.
Com isso, várias almas perceberam Edgar, que vestia um terno e calça de cetim de coloração azulada e camisa ruffle com babados branco.
O rapaz se assusta com a aproximação repentina das almas, que o xingavam e tocavam-lhe os bolsos, a procura de algum dinheiro.
- EU NÃO TENHO NADA!
- PARE DE MENTIR! EU SEI QUE VOCÊ É UM RICO MESQUINHO QUE CUSPIA EM NECESSITADOS!
- EU NUNCA FARIA ISSO! EU SOU UM CAVENDISH! NÓS AJUDÁVAMOS COM ALIMENTOS!
- MENTIROSO! VOCÊ MERECE ESTAR NO INFERNO!
- Inferno...? - aquelas palavras assustam o fantasma, que começa a olhar ao redor, percebendo as crescentes chamas e o calor escaldante que assolava o local.
- VOCÊ É BURRO OU SE FAZ? NÃO PERCEBE OS DEMÔNIOS POR AQUI? - a mulher vociferava, assustando mais e mais Edgar, que ficava com um olhar fundo.
Mais almas se aproximam conforme a briga se instala. Elas estavam furiosas com o rapaz. Como poderia um jovem ser rico em vida e eles mal terem um tostão para se sustentar enquanto vivos?
Essa mulher começa a gritar para que os outros comecem a apedrejá-lo, e assim é feito.
Pedras de todas as direções começam a ser atiradas contra Edgar, que começou a gemer de dor.
Agachado, ele protegia a cabeça enquanto pedras o atingiam, abrindo feridas pela sua carne.
Alguns, mais enraivecidos, decidiam se aproximar e chutar ele, chutavam sua canela, tentavam chutar sua cabeça, atordoando o rapaz.
Ele não aguentava mais, então em um gesto de tentar se aliviar dessa dor, ele consegue pegar uma pedra que havia sido atirada contra ele e joga em direção a mulher que tinha começado tudo aquilo.
A mulher grita de indignação, que começa a perguntar hostilmente o que ele havia na cabeça para fazer algo como aquilo.
- Eu... - Edgar começa a se afastar, tentando fugir do local.
A mulher começa a persegui-lo, até que tropeça e começa a rastejar pela lama, sujeira, urina e fezes que haviam no chão.
Edgar, no meio de sua fuga, tromba em uma mulher com feição sã e confusa, assim como ele.
- Mil perdões...
- Oh... você... você também está são? Não encontrei ninguém que estivesse nesse estado... bom, não nessa região... - as palavras ditas pela mulher enchem o coração de Edgar com esperança, que em um momento de alívio, abraça a mulher fortemente. Após perceber o que fizera, solta ela e se afasta.
- Mil perdões, eu não queria...
- Não precisa se desculpar, está tudo bem - a mulher sorri. Ela parecia ter a mesma idade que ele - A propósito, qual o seu nome? Me chamo Rosie Stuart!
- Edgar Cavendish - Rosie estende sua mão e Edgar beija ela, em sinal de respeito.
- Bom, julgando seu nome e suas roupas chiques, você era da Eliete, estou correta?
- Sim, você também era, não é? - ele começa a medir Rosie de cima a baixo. A mulher possuía um vestido armado com coloração azulada e flores douradas.
- Está certo! Bom, o que te traz aqui? Qual o seu pecado?
- Imagino que seja ira... eu morri assassinado pelo meu melhor amigo...
- Sinto muito... eu morri com um tiro de espingarda, fui confundida com um veado durante a época de caça... estava na floresta... inclusive, meu pecado é a avareza.
- Hm... bom, você se arrepende, não é?
- Sim... se eu pudesse voltar no tempo e ser uma pessoa boa, que doasse o dinheiro em prol dos necessitados, eu faria...
- Isso é ótimo! Mas ao meu respeito... não consigo me arrepender, eu tinha um grande apreço pelo meu amigo...
- Eu sinto muito, de verdade! - ela pega a mão dele e as envolve gentilmente. Suas mãos eram quentes com um toque aveludado. Edgar sorri com ternura.
- Sinto que seremos bons amigos... - Rosie sorri, assentindo com a cabeça.
- Eu gostaria de lhe fazer uma pergunta... existe alguma forma de voltar para a terra em forma de fantasma?
- Sim, existe, é difícil, mas existe... alguns anjos vêm até aqui e chamam por todas as almas arrependidas, que então, passam por um julgamento e escolhem se querem ir para o céu ou para a terra, mas cuidado, se você escolher a terra, nunca mais sairá de lá...
- Entendo...
Os dois então, começam a vagar pelo inferno em silêncio enquanto observam as almas em agonia, desejando poder sair de lá e que elas pudessem se arrepender para alcançar a redenção.
Eles encontram uma construção em ruínas, deixando Edgar intrigado, como haveriam construções no inferno?
- Por que existe uma casa em ruínas? Pessoas podem ter moradias por aqui?
- Sim, elas podem, alguns conseguem achar construções idênticas às suas casas em vida... venha, irei lhe mostrar a minha - ela puxa ele, caminhando rumo à casa dela.
Após alguns bons minutos de caminhada, os dois chegam à uma casa simpática, de piso térreo, mas com um teto alto.
Os dois adentram, revelando uma casa luxuosa e empoeirada. Os lustres do teto refletiam a luz avermelhada que o fogo da área externa proporcionava.
- É uma casa linda!...
- Obrigada! - Rosie sorri - Bom, eu imagino que você não sabe onde sua casa se encontra, então, gostaria de morar aqui? E eu posso cuidar de seus ferimentos! Você está todo machucado, se meteu em uma briga? - Edgar responde que sim com a cabeça e sorri.
- Você faria tal bondade comigo?
- Sim! Uma das formas de redenção para a avareza é ser bondoso com os outros, e você é uma pessoa agradável! - ela passa a mão pela bochecha de Edgar, como um pequeno agrado, que por sua vez, pousa sua mão sobre a cintura dela.
- Posso? - Rosie entende o que ele tem a dizer e deixa sem hesitação.
Os dois se aproximam lentamente e tocam os seus lábios. Os lábios de Rosie eram macios e suaves ao toque, os de Edgar, por sua vez, eram mais firmes, mas com uma certa leveza.
Os jovens se beijam apaixonadamente, com um grande desejo crescente entre os dois. Eles se separam, ofegantes.
Edgar coloca seu indicador debaixo do queixo de Rosie, fazendo carinho nela com seu polegar.
- Você é belíssima... seus cabelo castanho chocolate são estonteantes!
- Os seus olhos verde grama são ainda mais apaixonantes...!
Edgar e Rosie começam a flertar um com o outro, deixando levemente implícito o desejo que um havia pelo outro.
As almas que vagavam pelo inferno não importavam mais quando os dois estavam juntos, eles só queriam a companhia um do outro.
- Bom, agora vamos tratar de seus machucados... - a mulher dá uma piscadela.
Rosie então, pega um kit de primeiros socorros e começa a tirar a camisa do rapaz para poder esterelizar os machucados. Ela pega um algodão e passa no álcool.
- Isso irá arder um pouco... - ela passa o algodão embebido no álcool nas feridas do rapaz, que dá pequenos gemidos de dor.
- Eu não lembrava que isso doía tanto...
- Bom, agora você não irá pegar nenhuma infecção! Tem que tomar cuidado com os ferimentos por aqui, é muito fácil de infeccionar...
- Muito obrigado por tratar de mim e me abrigar! Não consigo pensar em como te agradecer!...
- Oras, você não precisa! O senhor é um rapaz muito gentil, isso eu posso ter certeza! Desde o momento que eu pousei meus olhos sobre o senhor, pude perceber que você é um Cavaleiro!
- Sério? Muito obrigado! Eu fui formado para ser assim, meus familiares prezavam pelo respeito de um homem, sua lealdade e sua bravura contra qualquer adversidade que aparecesse em seu caminho.
- Bom, com isso, posso ter ainda mais certeza que você é um ótimo rapaz! - os dois sorriem.
Rosie vai guardar o kit e, quando volta, decide colocar uma música em sua vitrola.
A música era calma, com um tom de graça e leveza que ressoava por toda a casa.
Rosie então, pega um livro em sua estante, se senta em uma cadeira e começa a ler.
Edgar pega um livro e acompanha ela na leitura. Os dois podiam ficar horas e horas se distraindo com grossos livros e histórias inventadas por eles.
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A Mansão do Inconsciente
RomanceUm jovem se torna fantasma por conta do seu melhor amigo, que então decide buscar vingança por sua morte, mas para sua surpresa, ele reencarna, ficando assim, em um looping de vingança e mortes.