Prólogo

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Catherine Aires

  Eu estava sentada, observando pela janela as folhas das árvores caindo enquanto saboreava meu chá. A tranquilidade da tarde foi interrompida pelo som dos passos que se aproximavam. Levantei os olhos e vi Elisa, minha madrasta, entrando na sala com um sorriso no rosto.

  — Catherine, espero que não se importe, convidei o príncipe Alessandro para se juntar a nós. — Anunciou ela. Meus dedos se apertaram em torno da xícara e eu senti o calor do líquido tocando minha pele.

  — O quê? — Minha voz saiu mais áspera do que eu pretendia.

  — Pensei que seria uma oportunidade para vocês se conhecerem melhor.

  — Isso é ridículo! — Me levantei, sentindo a indignação fervendo dentro de mim. — Não preciso de companhia, mande-o embora.

  — Catherine, por favor, seja razoável. Sabe muito bem da sua situação. — Disse ela entredentes.

  — Não estou desesperada a ponto de me casar com o primeiro homem que aparecer.

  Ela suspirou profundamente, como se estivesse cansada da minha teimosia.

  — Certo, negue o quanto quiser, mas lembre-se de uma coisa: se não assumir suas responsabilidades, farei com que Adelina seja a próxima a ocupar aquele trono.

  Elisa agia como se minha resistência fosse uma grande inconveniência, mas eu sabia o quanto ela se alegrava com a possibilidade de ver sua filha legítima com a coroa de Aires.

  — Não irei ceder à sua pressão. — Declarei, minhas palavras soando como um desafio.

  — Que seja, mas lembre-se das consequências disso.

  E então, minha meia-irmã entrou na sala com passos hesitantes e uma expressão confusa.

  — O que está acontecendo, mamãe? Quem é aquele homem no hall de entrada? — Indagou ela, seu olhar oscilando entre nós.

  Elisa suavizou seu semblante, dirigindo um sorriso tranquilizador para a filha.

  — Adelina, querida, aquele é o príncipe Alessandro. Não acha que seria uma boa ideia convidá-lo para o chá?

  A atmosfera na sala parecia pesar mais a cada segundo então Elisa a acompanhou, me deixando sozinha com meus nervos. Eu sabia que todo esse drama estava longe de terminar, mas estava disposta a lutar pelo meu poder de escolha.

  Decidi tomar um ar nos jardins do castelo. Me dirigi à estufa, perto das roseiras onde Florência, minha dama de companhia, gostava de passar seu tempo livre. Encontrei-a lá, ocupada com seus bordados, e me entreguei ao banco de pedra ao seu lado.

  — O que a aflige, majestade? — Perguntou ela ao notar minha inquietação.

  — O príncipe Alessandro... Elisa o convidou para o chá. Ela estava tão convencida de que eu deveria me sentir honrada pela presença dele, como se eu estivesse desesperada ou algo assim.

  Florência colocou sua mão sobre a minha, transmitindo uma solidariedade silenciosa.

  — Tenha calma, ela só está preocupada.

  Sua gentileza me confortou por um breve momento, mas logo fui puxada de volta para a realidade ao ver uma carta selada em suas mãos.

  — Chegou hoje de manhã. — Disse ela, entregando-me a carta.

  Quebrei o selo, e enquanto lia as palavras escritas no papel, meu peito se apertou.

  — E então, o que diz? — Florência perguntou, curiosa, já que não costumávamos receber cartas de outros reinos desde a morte do meu pai.

  — É um convite do rei de Maldar. — Murmurei, quase sem acreditar. — Para as festividades de primavera que ocorrerão no reino.

  A ironia não passou despercebida. Eu, que estava lutando contra os planos de casamento de Elisa, agora recebia um convite que claramente tinha o mesmo propósito: unir jovens em matrimônio. Era uma piada cruel do destino.

  — Não posso ir, Florência. Sabe como me sinto sobre esse assunto. — Eu disse, olhando para ela com certa frustração.

  — Entendo perfeitamente, majestade, mas não seria rude negar o convite? Além disso, desagradar um rei como ele não é seguro, especialmente neste momento delicado.

  Mordi o lábio e respirei profundamente, sabendo que ela tinha razão. A morte do meu pai deixou a corte em um estado de fragilidade, e recusar o convite poderia ser interpretado como um gesto de indiferença aos laços que mantêm a estabilidade política entre os reinos.

  — Você também sabe o quanto eu detesto esses eventos. — Resmunguei, deixando escapar um riso discreto. Ela sorriu.

  — Eu sei, majestade, mas às vezes é preciso fazer o que é esperado de nós, mesmo que não seja o que desejamos.

  Com um último suspiro, concordei em ir para Maldar, ainda que fosse apenas para manter as aparências e acalmar os ânimos na corte. No fim, criar uma inimizade com o rei não era um luxo que eu poderia me dar desta vez.

  À noite, de volta ao castelo, compartilhei a notícia do convite com Elisa e Adelina. O rosto da mais nova se iluminou, enquanto Elisa parecia satisfeita com a perspectiva de ver sua filha se casar.

  Eu, por outro lado, me senti sufocada só de pensar na ocasião, mas conhecia meu compromisso com o bem-estar do nosso povo.

  Na semana seguinte, deparei-me com a agitação frenética que antecedia nossa partida para Maldar. Elisa e Adelina discutiam animadamente sobre as expectativas para o primeiro baile de primavera, enquanto minhas damas de companhia aguardavam na carruagem. Durante dias, tentei me distrair com algumas tarefas, mas a sensação de sufocamento não ia embora.

  Fiquei em silêncio, observando a cena diante de mim, sentindo o peso da minha relutância crescendo a cada segundo.

  — Majestade, lhe asseguro que cuidarei de tudo em sua ausência. — Disse Erik, meu conselheiro.

  Forcei um sorriso, tentando esconder meu descontentamento com a situação.

  — Obrigada, Erik. Sei que posso confiar em você.

  Com um último olhar para trás, respirei profundamente e entrei na carruagem. Antes que eu pudesse me acomodar completamente, ouvi o cocheiro anunciando a partida, e o som dos cascos dos cavalos ecoou pelo ar enquanto começávamos nossa viagem.

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