Capítulo Nove

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Enquanto corria de volta para a casa, os braços carregados de álbuns de fotos, Jihyo estava bem ciente dos sons de marteladas e da furadeira vindo do salão de baile. Isso significava que, apesar da hora avançada, S/n ainda estava dentro da casa, pendurando molduras e espelhos para ela. S/n vinha trabalhando cada vez mais tarde da noite, algumas vezes até meia-noite, e Jihyo havia começado a imaginar que ela estava fazendo isso para estar perto de si, para manter um senso de proximidade, como se esperasse pelo momento em que ela trouxesse uma xícara de chá, e ela ansiava tanto por isso quanto S/n. Era por volta desta hora da noite, depois de ter terminado de organizar a casa e pôr tudo em ordem, que Jihyo geralmente aparecia e perguntava como ia o trabalho dela. S/n esperava que Jihyo fizesse isso esta noite também.

Mas, naquele momento, a mente dela estava distante. Na verdade, ver S/n era a última coisa que queria fazer. Ela havia sido sacudida pela foto de Jiyoung, pela descoberta da sala escura, mas tornou-se unicamente focada no que queria fazer em seguida, no que ela precisava fazer, no momento. Finalmente.

Porque havia cômodos dentro da casa em que Jihyo ainda não havia entrado – cômodos que ela vinha evitando deliberadamente.

Um deles era o escritório do seu pai, e era para lá que ela estava se dirigindo agora. Mesmo após meses vivendo na casa, a porta para seu escritório havia sido mantida bem fechada. Ela não quis perturbá-lo. Ou, provavelmente, não quis libertar os segredos que ele continha, fossem quais fossem.

Mas agora Jihyo sentia como se coisas demais tivessem permanecido escondidas, por tempo demais. Os mistérios em sua família estavam consumindo-a. Ela havia deixado os silêncios, as coisas não-ditas, tomarem conta de sua mente. Ninguém em sua família nunca havia falado sobre nada – sobre a morte de Jiyoung, sobre o subsequente colapso de sua mãe, sobre o divórcio iminente dos seus pais, que se tornava mais próximo a cada ano que se passava. Eles eram covardes – deixando suas feridas infeccionarem ao invés de agir. Sua mãe e seu pai eram iguais, deixando tanto por falar, deixando as feridas gangrenarem até que a única coisa a fazer era amputar o membro.

Amputar o membro, Jihyo pensou.

Foi exatamente isso que o pai dela fez, não foi? Ele havia amputado sua família inteira, havia fugido do problema sobre os qual foi incapaz de falar. Ele havia se afastado de todos por causa de algum obstáculo, alguma barreira, que ele julgou insuperável.

Jihyo não queria passar sua vida inteira entre suposições. Ela queria respostas. E sabia que as encontraria naquele escritório.

Ela deixou cair a caixa de fotos nos degraus da escada antes de subir, dois de cada vez. Sua mente estava frenética enquanto caminhava, determinada, ao longo do corredor do andar de cima.

Até que chegou à porta do escritório de seu pai, onde parou. A porta era feita de madeira escura envernizada. Jihyo lembrava de ficar olhando para ela de baixo para cima, quando era mais nova. Na época, parecia imponente, quase ameaçadora, uma porta através da qual seu pai desaparecia como se tivesse sido engolido, para emergir apenas horas depois. Ela nunca tinha permissão para perturbá-lo e, apesar de sua curiosidade quando criança, sempre obedeceu às regras, e nunca entrou. Ela não sabia por que aquele cômodo lhe era proibido. Não sabia por que seu pai desaparecia dentro dele. Sua mãe não dizia nada, e, com o passar dos anos, quando ela entrou na adolescência, havia adotado uma atitude do tipo "tô-nem-aí" sobre o lugar, envolvendo suas perguntas não respondidas num manto de silêncio.

Ela tentou girar a maçaneta e ficou surpresa ao descobrir que estava destrancada. Ela achava que o escritório estaria fechado, que ele ofereceria algum tipo de resistência à sua intrusão. Então, foi um choque para perceber que podia simplesmente pisar num lugar no qual ela nunca havia posto os pés antes.

Agora e Para Sempre - Imagine JihyoOnde histórias criam vida. Descubra agora