VI

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Kelvin POV

O jardim verde e bem cuidado através dos portões que eu atravessava agora, enquanto observava três seguranças correrem ao meu encontro, com armas nas mãos, parecia uma pintura de Natureza Morta, o que era muito fora de lugar de se pensar, vendo o verde e as flores bem cuidadas.
Há exatos três minutos eu tinha dito um "abre pra mim, é o Kelvin", no interfone da minha casa. Não pude terminar bem meu raciocínio confuso, em segundos fui cuidadosamente revistado e guiado até minha casa, que agora parecia ainda mais alheia, minha mãe me abraçou forte e até chorou, agradecendo a vários santos aleatórios o fato de eu ter voltado vivo, nossos empregados todos em volta da cena... e só depois de ver esses rostos conhecidos eu comecei a racionalizar, eu óbviamente não ia dizer de onde vim, achei melhor bancar o confuso por enquanto, embora tivesse medo de parecer o clichê desmemoriado de uma novela latina... Fui levado ao meu quarto e depois de muita especulação, enquanto eu fazia a linha zonzo e sem foco, me deixaram tomar banho sozinho e descansar um pouco, sem saber que eu não estava nem minimamente cansado. O encontro com meu pai foi uma mistura de desconforto e bizarrice,mas com uma pitada de realidade que não estava ali antes. Agora eu não tinha que supor, eu sabia exatamente quem ele era e as merdas que ele era capaz de fazer, me dava nojo e quanto mais os minutos passavam, mais eu me convencia que precisava fazer parte da ruína e não do legado dele.

Narrador POV

Enquanto caminhava de um lado pra outro com olhos injetados e pescoço vermelho, Antônio achava toda a situação esquisita pra além de si mesma. Por vezes durante esse tempo, pensou que Kelvin estivesse morto, agora aqui na sua frente, sem marca nenhuma de luta ou espancamento, inclusive achava que tinha ganhado uns dois quilos e as bochechas pareciam ainda mais rosadas, não sabia dizer se o estado de confusão do rapaz era digno de crédito, tendo passado pela sua cabeça que talvez até se tratasse de uma fuga voluntária, mas ele parecia querer colaborar, como quem tenta lembrar.

- Pai, eu lembro de um quartinho pequeno, eu acordava pra dormir de novo, acho que me dopavam...mas sempre quando acordava tinha comida, tinha um banheiro também, com as coisas que eu preciso.

- Mas você viu alguém, não viu? Não é possível que você não tenha visto ou ouvido nada, garoto...te pegaram pra nada? Te soltaram pra nada?

- Claro que vi.. claro que vi, mas agora tudo parece tão embaralhado na minha mente, que eu não sei o que é real e o que eu sonhei... você quer ouvir? Mesmo sabendo que pode ser delirio meu?

- Fale.

- Vi algumas vezes, uma moça morena, com os cabelos cacheados. Parecia a dona da casa, as vezes ouvia ela falar, como no telefone ou algo assim... parecia pobre, descuidada...mas a comida era gostosa e parecia tudo limpinho...

- E o quê mais?

- Uma vez acho que vi ela negociar um valor, pelo que eu entendi, ela ia me vander a um homem, provavelmente não deu certo, me soltaram num motel, acordei lá e vim pra cá. O senhor acha que alguém por aqui, mexe com tráfico de pessoas?

Com essa pergunta e uma cara de inocência que era especialidade dele, Kelvin manteve seu pai enganchado e procurando a pista errada, no meio de seus negócios.

Casa de Ramiro.

"O chefe não está de bom humor!" Era o que mais se ouvia por ali... e não, ele não estava mesmo. Era ridículo, mas Ramiro chegou sim a ter esperança que o rapaz quisesse ficar. Tinha também o fato de sua vingança contra Antônio, ter sido incluso, dificultada e tinha ainda a cereja do bolo, João, que o tinha abordado aquela manhã perguntando por Kelvin.

- Mas ele foi fazer alguma coisa? Ou só...embora?- perguntou com olhinhos que mostravam mais expectativa pela resposta do que o que julgava estar mostrando.

- Embora, filho. Ele tinha uma casa pra voltar também...

Respondeu com o incômodo enorme de ver a mente do seu pequeno tentando se explicar e se consolar ao mesmo tempo, pelas expressões do seu rosto e as mãozinha que se enrolavam...

- Tudo bem, filho? Você pode conversar com o papai, sabe...as coisas que você pensa.

- É por minha causa, pai?

- O quê, João?

- Ninguém fica com a gente, todo mundo um dia desaparece e não volta nunca mais, igual a mamãe e o tio, agora o Kelvin. Ninguém fica aqui, e se você for também?

- Ei, filho não - Ramiro disse se abaixando e acarinhando o rosto do pequeno- Nada disso foi culpa sua, nunca mais pense assim! Todo mundo faria tudo pra ficar com você, filho. E o papai não vai a lugar nenhum. Nem que a gente tenha que viver cuidando de galinhas numa fazendinha, ouviu.

O menino sorriu. Aquilo era verdade, Ramiro faria qualquer coisa por seu filho, pela segurança dele.

Dois meses se passaram e Kelvin vivia sua vidinha de sempre, com seus livros, agora mais triste, se era sincero, não via no horizonte a possibilidade pra fazer nada que ajudasse a vingança de Ramiro e seu pai ainda o mantinha fora das "coisas da familia", pior ainda, o tratava ainda mais como um incapaz, depois do sequestro. Enquanto decia as escadas pra tomar seu lanche da tarde, deu de cara com um ruivo familiar, entrando no escritório do seu pai, familiar demais... Era André? Meu Deus, era sim...o peguete de Ramiro. Kelvin deu a volta pelo jardim, pra se colocar debaixo da janela e ouviu... André contava a seu pai que Ramiro o manteve como refém e que o impediu de fugir pelo jardim uma vez, filho da puta!
Kelvin agora era uma pilha de nervos, o que ele faria agora? O quê? Negar! Claro. Ele ia negar, negar e negar, qualquer lembrança desse momento, não havia mais nada que ele pudesse fazer. Antes mesmo do jantar, Antônio o chamou e com o nervosismo aumentando, o garoto viu que na mesa do escritório, tinham quatro fotos de homens e claro que o rosto de Ramiro estampava uma das fotos. Em uma sessão exaustiva de "tente lembrar se você já viu algum desses homens, Kelvin" e de vários "Pode ser, não tenho certeza", a paciência de Antônio se esgotou.

- Eu não sei o que esse miserável fez com você, pra você ficar desorientado desse jeito. Mas sei que coisa boa é que não foi. Se ele ousou pegar meu filho e submeter a algum tipo de tortura, que eu não quero nem imaginar de que tipo foi, eu vou mostrar a ele que dois sabem brincar...ele tem filho também!

Foi a hora mais difícil pra Kelvin conseguir manter o personagem. Só não gritou e pulou no pescoço do pai porque além de confirmar a ideia dele, ainda ia conseguir ser trancado no quarto, se fosse assim, como ia ajudar Ramiro?

Eram quatro da manhã quando Kelvin deixou a mansão, no baú do carro da lavanderia, sabendo que só dariam por sua falta mais de meio dia. Não podia deixar que seu pai fizesse nada com João, nem com Ramiro.

Só esperava que conseguisse chegar a tempo.

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Oiii!
Desculpem o descaso por aqui. Eu comecei essa história(que eu amo), com o intuito de desbloquear minha escrita, que estava assim, em estado de calamidade. Pensei ela como short fic e tinha muito do plot claro na mente, desde o início.
Ela terá 10 capítulos, então tá pertinho do fim e ele já existe aqui na minha mente, então não vou mais demorar uma eternidade, o capítulo VII já tá quase finalizado e prometo que não demoro a postar.
Obrigada por permanecerem!
Amo vcs.

YASMIMMMM te dedicaria o capítulo, mas acho que você vai gostar mais do próximo, então ele será seu!🧡

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⏰ Última atualização: Mar 25 ⏰

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