Nas águas da Grande Rota

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A chamada Grande Rota consistia num conjunto de rios que banhavam toda a extensão de Taëreth, tornando o domínio desses corpos de água essenciais para quem tivesse a intenção de exercer seu poder sobre aquele continente. Até então a marinha da aliança vinha fazendo um bom trabalho garantindo o controle daqueles rios, e as fragatas levando os auroreanos tinham que se preocupar mais com ameaças vindas do céu que com barcos inimigos se esgueirando em sua direção. Assim os auroreanos que ainda se recuperavam da batalha contra a horda de demônios podiam descansar aproveitando a brisa que soprava no mesmo sentido da correnteza.

Foi ao anoitecer do quarto dia de viagem quando um nevoeiro começava a se formar escondendo as margens do rio, enquanto a frota contornava a parte sul da província de Esdaim, que os auroreanos foram surpreendidos com os primeiros sinais de seus inimigos. Uma nuvem de pássaros negros passou por cima dos navios, e mascarados pelo céu que escurecia eles não teriam sido sequer notados se não fosse por Viriel. O elfo que liderava os arqueiros do exército auroreano tinha os olhos e a atenção treinados para perceber as anomalias no ambiente, por menores que fossem, sendo fácil para ele notar o movimento estranho das aves.

-Vou avisar ao capitão que teremos problemas em breve. - Disse Viriel aos anões que estavam sentados ao seu lado em um dos bancos encostados a amurada da embarcação. O elfo então se levantou e foi até a cabine do capitão. Passou por uma dezena de marinheiros que trabalhavam ajustando os mastros, esticando cordas e fazendo outras atividades relacionadas a navegação que Viriel não tinha ideia de para que serviam. Havia também um lixando e envernizando um pedaço com convés onde haviam marcas de flechas, provavelmente resquício de algum conflito do passado, talvez recente.

A cabine de Pin ficava ao lado da cabine principal do navio onde Akshazai permanecia de pé obstruindo a passagem de qualquer curioso que quisesse contemplar o corpo do deus. - Vejo inquietação em seu rosto, tem algo acontecendo? - indagou o comandante dos auroreanos olhando Viriel nos olhos.

-Vi espiões do inimigo no céu, teremos problemas em breve então vou avisar ao capitão para que estejam todos preparados.- Respondeu o elfo enquanto se preparava para bater à porta a sua frente com os nós dos dedos.

-Explique a situação a ele e depois venham aqui para decidirmos o que fazer.- Ordenou Akshazai que foi respondido com um aceno de cabeça. Viriel então bateu a porta três vezes e antes que pudesse bater a quarta ouviu uma voz rouca vinda do aposento, -Já estou indo rapazes! -

Em instantes a porta se abriu revelando um homem baixinho, em comparação com Akshazai, e por trás dele uma cabine abarrotada de móveis, mapas e todo tipo de arma convencional ou exótica. Os aposentos de Pin eram uma verdadeira bagunça, contudo ele não podia ser censurado por aquilo afinal sua cabine original havia sido transformada num necrotério divino. O capitão aparentava ter perto dos quarenta anos e era um homem robusto de cabelos pretos curtos e uma barba bem aparada emoldurando seu rosto. Era um sujeito de aspecto rústico como a grande maioria dos marinheiros, e a julgar pelas rugas em seu rosto ele já navegava há muitos anos.

-Ah você é o arqueiro dos auroreanos, é verdade que matou mais de mil demônios na batalha? - Indagou ele enquanto punha a cabeça para fora pela porta e esquadrinhava o convés ao redor deles procurando outros visitantes.

-Se nem eu contei duvido muito que alguém tenha contado, mas sim posso ter abatido até mais afinal fiquei horas atirando. - Respondeu Viriel, orgulhoso de suas habilidades como arqueiro. Ele então fez menção de adentrar a cabine e antes que o fizesse foi interrompido por Akshazai que fez sinal para que o capitão se aproximasse.

O marinheiro obedeceu sem pestanejar mas com paços vacilantes, pois Akshazai era uma figura sinistra para aqueles que não o conheciam. Os companheiros habituados aos seus modos rígidos e a firmeza de sua voz sabiam que encontrariam nele um amigo leal para todas as ocasiões e um aliado que não retrocederia mesmo diante do inferno. Contudo tais modos somados a seu porte imponente causavam receio nos demais.

A Forja do Deus ProfanadoOnde histórias criam vida. Descubra agora