Juntando as peças

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A ida ao fisioterapeuta não foi tão animada quanto das outras vezes. Ivy e Dora adoravam fazer parte da vida de Amália, mas toda aquela história de faltar almoço para sair com alguém tirou tudo do lugar. Pela primeira vez em anos, as três estiveram envolvidas em uma discussão em trio. Dora e Ivy se estranhavam, porque é coisa de irmãs, mas envolvendo Amália... O clima, de fato, pesou mais.

Ivy desceu do carro apressada, nem mesmo entrou para dar um "oi" a Nice, que viu a filha indo em outra direção totalmente cabisbaixa.

Pandora que teve que se explicar.

_ Oi, mãe. A sua outra filha anda muito rebelde, sabia? Deu para querer fuçar a vida da Amália. Quem ela pensa que é? Eu em! _ Disse Dora dando um beijo na testa de Nice.

Nice conhecia bem as filhas que tinha. É bem verdade que Ivyna tinha uma personalidade mais forte, mas ela nunca desrespeitaria sua vó. Aliás, era a única pessoa no mundo a quem obedecia cegamente. Nice até tinha ciúmes, às vezes.

_ O que aconteceu? _ Questionou Nice.

Pandora foi explicar tudo o que tinha acontecido. Enquanto isso, Ivy seguiu para o único lugar em que poderia voltar a falar sobre aquele assunto sem ser completamente condenada.

Cumprimentou sua sogra e logo partiu em busca do Ruy, que estava na garagem com sua moto, a quem deu o nome de "meu segundo amor". Ruy e Ivy se conheceram na época da escola. Estavam juntos desde o nono ano. Atualmente, Ivy estava se preparando para as provas do vestibular, sempre quis cursar Psicologia. Já Ruy trabalhava com o pai na concessionária da família.

_ Ivynha... _ Disse Ruy.

Ivy estava desconsolada. O namorado era a segunda pessoa para quem poderia se abrir, já que sua vó, primeira pessoa, era o assunto da conversa.

_ Acredita que a minha vó está de date? Cara... _ Diz Ivy com a voz bem embargada.

O rapaz, que não encontrou o problema na fala da namorada, inocentemente, questiona:

_ E?

O jovem quase se torna mais um na discussão.

_ Isso é sério, Ruy? Acha tudo normal? A minha vó... _ Ivy se interrompe, talvez não fosse gostar de si mesma ao término de sua fala. _ Ai, Ruy, eu queria que ela contasse comigo...

Ivy desaba nos braços do namorado, que largou o segundo amor no momento em que Ivy entrou naquela garagem.

_ Não acha que a sua vó pode querer contar apenas consigo mesma algumas vezes? É normal, gata. Você gosta de contar sempre com os outros? Eu prefiro resolver minhas tretas só, você já sabe.

O que parecia ser mais importante para Ivy não era a ideia de sua avó estar com alguém, mas, sim, de estar e não se sentir bem para compartilhar com suas netas, que eram quase como filhas, segundo a senhora.

_ E a minha irmã ainda fica tirando o corpo de banda. Todo mundo lá em casa querendo meter o nariz, mas sou eu quem levo a culpa por fazer o que eles não tiveram coragem. A Dora... Odeio quando ela se faz de desentendida. Eu acabo saindo como a errada da história. Quer saber? A partir de hoje, não me envolvo mais em nada envolvendo Amália.

Ruy abraça a namorada concordando totalmente com sua decisão, que estava prestes a mudar, já que o rapaz pediu para ver a tal foto e começou a fazer especulações.

_ Mas Ivynha... Essa é a foto? _ questiona o rapaz pasmo.

Ivy faz que sim com a cabeça, mas sem entender a surpresa do namorado.

_ É apenas uma foto! _ Completa a garota.

Ruy continuou observando a foto, deu zoom por várias vezes, algo chamou sua atenção, e não foi o tal date de Amália.

_ Já jogou essa foto no Google, amor? _ Pergunta o jovem.

A menina nega. Então, o rapaz coloca em prática seus dotes de investigador da web. Graças a Ruy a família Dias descobre que a foto, na verdade, foi retirada de um site que compartilha ideias para mesas postas. Amália havia pregado uma peça em todos. Agora parecia ainda mais difícil de saber se existia alguma verdade nas suspeitas levantadas. E se Amália não faltou por conta de um date, o que a tirou do almoço em família no domingo passado?

O jantar na casa dos Dias renderia uma série de perguntas. Para a sobremesa, um quebra-cabeças cujas peças estavam espalhadas por toda a região. Todos queriam saber os motivos da falta de Amália, mas ninguém queria ser o curioso cara de pau, embora Ivy já estivesse quase garantindo o título por anos seguidos. Fora eleita em todos os natais e anos novos, quando a enorme família Dias se reunia para celebrar. A menina sempre tinha uma história envolvendo algum membro. Acabava sempre repreendida, mas se desculpava com todos; não fazia por mal, era até uma forma de animar aquelas noites chatas, como alegava.

_ Ai, Ivy, como me prega uma dessas? Colocar Amália contra a parede assim... Que absurdo, filha! Foi essa a criação que te dei? _ Nice parecia decepcionada.

Benício, por sua vez, se atentou ao fato de que sua mãe, já que não estava em um outro almoço, faltou sem alegar absolutamente nada. Logo os ninhos começaram a se formar em sua cabeça novamente. Dora nem quis dar opinião, ainda estava tentando digerir as discussões da tarde envolvendo a vó e a irmã mais nova. Foi Ruy quem decidiu tentar juntar as peças por ali, com a ajuda da namorada, claro.

_ A foto foi tirada de um site, o que significa dizer que...

Beni interrompe o genro.

_ Que ela mentiu, já sabemos!

Nice era quem menos gostava de dar pitacos, mas já estava encolhida até o pescoço em tudo.

_ Ela deve ter tido um bom motivo. A Amália nos adora... _ Completa a mulher com os braços cruzados.

A família estava pensativa. Não parecia existir um motivo claro que levasse Amália a mentir. Ela poderia apenas não ir por não sentir vontade, ou por qualquer outra coisa. O que não fazia sentido para a família Dias era a justificativa. Quando se falta ao que já é tradição entre parênteses, ficam questões. São questões que começam a interferir no bem-estar geral.

As cartas estavam sendo postas sem a única figura capaz de elucidar todo o mistério da falta ao almoço do domingo na casa dos Dias, que era dona Amália.

A senhora, por sua vez, jogava xadrez com sua melhor amiga, Antonella, a quem fez questão de contar sobre os recentes acontecimentos.

_ Briguei com as meninas. Estavam querendo bisbilhotar minha vida! _ Disse a senhora.

Antonella e Amália se conheciam desde mocinhas. Eram amigas inseparáveis. Antonella havia perdido a única filha que teve. Não tinha mais ninguém. Foi nesse período conturbado que acabou conhecendo aquele lar, que logo passou a chamar de seu. Consternada com a melhor amiga, e também entendendo que precisava de ares que fosse mais a sua cara, Amália decidiu acompanhá-la. Foi uma decisão de irmãs, sem dúvidas. As duas jogam xadrez todas as noites, além de compartilharem os eventos de suas vidas.

_ E você adorou! _ Afirmou Antonella.

Amália fez que "sim" com a cabeça e as senhoras caíram em gargalhadas.

_ Eu sabia, Amália. Você deve estar amando todo esse cenário de novela mexicana. Um drama... Isso é bem sua cara! _ Dizia Antonella.

Amália apenas sorria concordando com tudo.

_ Mas, sabe o que é mais curioso nisso tudo? _ Questiona Amália.

Antonella fica em silêncio aguardando a resposta de Amália, que com um sorriso diferente desabafa com sua velha amiga.

_ Estou mesmo conhecendo alguém... Ou, melhor, (re) conhecendo. Parece tudo novo quando se começa um romance assim pelas telas. Deveria experimentar... _ Completa a senhora.

Antonella, feliz pela amiga, não faz muitas perguntas. Aliás, a mulher sabia que o coração de sua amiga sempre teve um mesmo dono. O Inácio nunca deixou de ser o homem de sua vida.

Será?

O namorado de Amália - Conto Onde histórias criam vida. Descubra agora