CINZAS

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~♡~


As cinzas que se espalharam no ar antes de pousar nas ondas não fizeram com que aquela dor se fosse por completo, mas pela primeira vez em dias parecia que tudo estava em seu devido lugar.

"O que pertence ao mar,
sempre retornará ao mar"

Era isso que minha avó dizia sobre o destino das mulheres da nossa família. O qual também me inclui, ela gostava de frisar. Sinceramente, ela parecia ter uns parafusos a menos às vezes.

Eu era a única disposta a ouvi-la de qualquer forma, por isso fui a única a se importar o suficiente para jogar suas cinzas ao mar seguindo a tradição. Porém, demorou algumas semanas até que eu estivesse disposta o bastante para fazer isso.

As ondas molham o jeans ao redor dos meus tornozelos, as areias que se arrastavam sob meus pés com as águas e a brisa salgada da madrugada eram o que me mantinham acordada. Era tão seguro estar naquele lugar que nenhum pensamento ruim se fixou em minha mente em nenhum momento sequer.

Porém, isso só durou até os primeiros raios despertarem no horizonte, trazendo de volta os pesos habituais em meus ombros.

"Preciso ir trabalhar... outra maldita vez"

- Vovó, espero que encontre seu lugar aí... - disse limpando uma lágrima que havia escapado dos meus olhos.

A coisa sobre não conseguir pregar os olhos pela madrugada, é que também se pode ter ideias estranhas do que fazer para passar o tempo, como por exemplo, jogar as cinzas de uma velha ao mar.

Entretanto, voltar pra casa com as barras das calças molhadas e meus sapatos encharcados e com grãos de areia não me agradava nem um pouco, pelo menos o metrô já tinha começado a correr e os poucos presentes no mesmo vagão que eu não estavam interessados em meu estado deprimente. Abraçando o cardigan rosa ao meu redor, meus olhos pesados tentavam se manter abertos para que não perdesse o ponto em que deveria descer.

E depois disso, ainda tive que me arrastar pelas ruas da cidade para chegar ao bairro dos prédios residenciais, o jarro branco adornado com flores de cerejeira vazio em meus braços só não chamava a atenção porque as ruas ainda não haviam sido preenchidas pelos trabalhadores.

Depois da Guerra Paranormal, eu havia me mudado para um daqueles prédios. Cinco meses depois, estando sozinha no último mês, não tive forças o suficiente pra voltar para casa, em partes porque fui irresponsável o suficiente para ouvir minha avó e aceitar tomar o lugar da antiga dona do apartamento em um contrato de um ano.

Ainda faltavam sete meses...

Sete meses vivendo num prédio enorme com poucos inquilinos, bem estranhos diga-se de passagem, capazes de pagar um aluguel meio fora do normal, reclamações fúteis, um porteiro pago para dormir e um medo claramente questionável pelos moradores do apartamento 103.

Meus vizinhos misteriosos e os únicos que apertavam o botão do elevador daquele andar além de mim.

Parecia um grande exagero. Eles só eram muito barulhentos, já que as paredes eram meio finas demais para o meu gosto, quando recebiam os únicos dois visitantes recorrentes, também muito jovens que presumi serem amigos da garota que morava ali e esbarrava comigo às vezes na saída quando ela ia alimentar os gatos de rua da vizinhança.

Entretanto, o caso mais enigmático era o dono do apartamento ao lado que quase não se via andar pelo prédio.

Hawks, ex-Herói Número Dois.

O Anjo Caído, desviado dos caminhos moralistas da sociedade de Heróis devido a um grande escândalo nacional envolvendo o assassinato do Twice, membro da Liga dos Vilões, o que havia colocado aquele herói em uma posição comprometedora e abominável diante de todos

𝐒𝐎𝐔𝐍𝐃 𝐎𝐅 𝐓𝐇𝐄 𝐒𝐄𝐀 - 𝐋𝐢𝐯𝐫𝐨 𝐈𝐈. 𝓚𝓮𝓲𝓰𝓸 𝓣𝓪𝓴𝓪𝓶𝓲Onde histórias criam vida. Descubra agora