5. Que Deus tenha piedade de mim

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A muito tempo, quando as pessoas sentiam-se fracas, incapazes e perdidas, elas viravam o rosto pras estrelas e rezavam para que Deus as acalentasse. Mostrar o caminho. Fosse o pastor das ovelhas perdidas.


E agora, as estrelas estão ocultas. Acima, só o vazio de neon. Mas as vezes, quando a floresta permite. Lá de dentro o divino vaza. Mesmo que não desse lugar, ainda sim, é uma prova de que em cada lugar existe algo, alguém. Alguém que observa uma criação, alguém que aprecia brincar ou zelar. Alguém que às vezes, entrega bênçãos em forma de dor.


— Que Deus tenha piedade de mim. — A expressão sem sal no rosto da caçadora era estranha. Observaria aquele ser pela primeira e última vez. Pondo o cano da arma contra sua cabeça ela falou deixando o cigarro repousar nos dedos — Isso é piedade.


Com o disparo, voltamos. Antes das coisas começarem a se complicar. Antes mesmo dela chegar a atravessar aquela rua.


Enquanto Cadáver ia, bem, puxando os cadáveres pela gola. As palavras de Uira não a atingiram, foi cantarolando por debaixo dos panos e sacudindo a cabeça no ritmo dos próprios pensamentos.


Não muito animada, ela foi levantando o rosto, encarando o vazio do céu por alguns instantes antes de começar a abrir a boca. Esfregando a língua na pequena cicatriz foi pensando enquanto começava a andar. Muitas poucas perguntas e tão pouca vontade de encontrar essas respostas.


Sem querer se desdobrar sobre os próprios pensamentos começou a acompanhar os outros dois. Sentindo-se levemente derrotada pelo ânimo. A corrente ela ia puxando, tentando segurar de uma maneira que fosse gentil e não machucasse o menino preso naquela coleira. Uma situação engraçada, já que em todos os anos nesse serviço vital, era a primeira vez que andava com um demônio na coleira. No máximo talvez algum outro especialista que tivesse um dentro de um item, ou maldição. Mas uma pessoa inteira?


— Moça, você tá rindo de mim? — O menino apontou o indicado pro rosto, como se não tivesse certeza de quem era si próprio.


— Meio que isso. — poucas palavras, essas não tiravam o sorriso no rosto da mulher. Apenas marcavam seu próprio senso de humor. — Já já tu se acostuma. — Deixou um riso escapar, finalmente atravessando a porta. Dobrou os joelhos e foi buscando pelo resto de areia e entulho, uma corrente, algo que pudesse fechar o lugar até que o grupo terminasse. Não queria ninguém entrando e saindo enquanto o trabalho ainda estava em andamento. Puxando com a ponta dos dedos as chapas de metal, foi enrolando a corrente e dando um nó. Embora impossivel verdadeiramente dar um, servia mais como um aviso já que a rua é movimentada e famosa o suficiente pra que ninguem seja idiota de invadir um predio de corporação em construção sem esperar reações obvias.


Foi lentamente virando-se para a entrada. Ainda era tudo muito rústico, o pessoal estava refinando de baixo pra cima. Mas em tudo aquilo, era só mais um monumento dizendo que alguém tem muito mais dinheiro que outra pessoa. Tudo sempre é grande, um exagero sem limites pra demonstrar o quão abastado você é. Enquanto que por força de Morgan, Cadáver esperava na entrada a caçadora foi andando nos arredores buscando mais algumas informações. Talvez pelo seu erro diurno, não queria escapar da vigilância, teria mais responsabilidade. Ao menos até se cansar novamente.


No canto perto da cerca de ferragem havia um pequeno escritório. Daqueles desmontáveis que o pessoal usa para armazenar alguns documentos e ocasionalmente repousar. Um semi abrigo pra poderem dizer que ainda estavam trabalhando, mesmo que não. — Não entrem. Vou dar uma olhada aqui e já vamos.

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⏰ Última atualização: Apr 02 ⏰

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