Roteiro esquisito

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Pela quinta vez em uma única manhã, ele adia o despertador sem o mínimo interesse em levantar da cama e encarar a nova escola. Assim como First que não queria acordar, Khaotung não queria ir até a nova escola. A consciência pesava por saber que iria se atrasar no primeiro dia, mas ele também não deu muita importância a isso. "Que pese", pensa. É meio do semestre, meio do ano... Isso não significava que iria haver uma mudança drástica no comportamento das outras pessoas. A atenção seria voltada para ele de qualquer forma, como se fosse o início do primeiro semestre.

— Qual é a desse uniforme? — fala consigo mesmo enquanto analisa cada peça daquela roupa que, aos seus olhos, era estranha — Deve fazer um calor infernal dentro dele...

Sua mente e seus olhos vagam pelo quarto na esperança de arrumar alguma coisa que alivie o seu calor. Realmente era uma manhã ensolarada e se ele já estava suando em suas roupas de pijama, não gostava de imaginar o que aconteceria quando colocasse as outras... coisas. A tesoura amolada nunca havia chamado tanto sua atenção quanto naquela manhã onde o sol parecia estar bem acima de sua cabeça. Ele tinha uma tesoura e um sonho.  Já que iria chamar atenção, por que não fazer isso do jeito certo? Corte aqui, corte ali, e foi assim que ele rasgou sua calça e desfiou as pontas com um garfo da cozinha de sua mãe.

— Até que não é ruim... — da de ombros.

Água fria numa manhã quente, tentador. Ele a deixa lavar seu mau humor e refrescar seu corpo. Ela também é ótima para fazer acordar já que havia ido dormir tão tarde na noite anterior. Maldita hora que deu ouvidos ao Neo e saiu para aquela festa abençoada... Ele não havia bebido nada, mas de qualquer forma, sabia a hora de parar.
A casa silenciosa prende sua atenção para ter certeza de que não há ninguém além dele. Seus pais saem cedo todas as manhãs para o escritório e na maioria das vezes o deixam dormir um pouco mais.

A nova escola parece tentadora e parece ter muito a oferecer a alguém como ele. Khaotung não se orgulhava de dizer isso, mas muitos dos seus amigos diziam que ele vivia uma vida invejável, mas ele nunca se importou muito com isso. Na verdade, Khao era uma pessoa bem simples, alma leve e travessa. Gostava de se divertir e de sentir a adrenalina no sangue, gostava de senti-lo ferver. O perfume que sua mãe o deu no último mês é forte o suficiente para não precisar de muito. O cheiro chama atenção, e bom, pelo menos do cheiro ele gostava.

Devido a problemas alimentares nos últimos dois anos, Khaotung não come nada pela manhã e lamenta, ele ainda tem um pouco de trauma. Tudo fora causado pela correria dos seus dias, por isso seus pais pegam leve. O apartamento está vazia e pela janela ele vê o carro do seu pai estacionado lá embaixo.

Quando Thanawat não consegue se alimentar, ele encontra alívio para o peso disso nas maças que sua mãe compra para seus treinos. Sua barriga não está muito cheia e nem muito vazia, isso parece ótimo para ele, só assim não se preocupa por não ter comido nada. A música passa de um lado para o outro em seus fones de ouvido. Neo já deveria estar esperando na escola e ele sabia bem que estava atrasado. Bom, parecia que finalmente havia chegado a hora de assumir a personalidade que todos achavam que ele tinha e vivem com essa ilusão. O garoto rebelde com a rotina corrida e sem tempo para amigos, vida social, relacionamentos... O típico bad boy que acabou de se mudar. A única diferença é que ele não tenho um passado tão triste com situações que o obrigaram a ser como era nos dias atuais.

A chave é deixada por baixo da porta quando ele passa e a tranca. Provavelmente quando chegasse seus pais já teriam voltado. O elevador abre e ele entra, então fixa o olhar num ponto fixo, se perdendo em pensamentos aleatórios de um dia quente.

— Bom dia, senhor Thanawat! — diz o porteiro quando o elevador abre e ele o vê.

— Bom dia, senhor.

— Seu pai pediu que lhe desse isso. — ele o entrega um pacote e a chave do carro.

— Obrigado! — ele sorri e Khaotung sai em direção ao carro do pai e joga o pacote no banco do carona ao seu lado, então logo sai com o carro. O trânsito é terrível, como se já não bastasse o seu atraso.

Após alguns minutos parado, o trânsito finalmente andou e ele conseguiu chegar a tempo na escola, deixando o carro estacionado junto aos outros. O ar  é diferente e não tem quase ninguém fora da turma, mas seus olhos logo veem Neo, que caminha em sua direção em passos largos e apressados.

— Você demora muito! — diz, puxando-o e ele trava o carro, logo o seguindo.

— Eu não queria vir hoje... — reclama enquanto é obrigado a andar mais rápido.

— Se depender de você, você não quer vir nunca. E o que aconteceu com sua calça?!

Neo o empurra sobre a porta da sala de aula, fazendo-o bater na mesma e abri-la sem intenção alguma. Os olhares recaem sobre si e os logo começam os murmúrios.

"Eu vou matar você." — Khao o encara e ele o olha já sabendo que está morto.

— Desculpa... — sussurra.

— Bom dia, senhor Thanawat. — a professora o encara com desdém e ele, por impulso, deixa um sorriso sarcástico escapar sem querer. Talvez seja por isso que o acham metido demais, embora não seja. Khaotung apenas age como todos nós agiríamos; tratando da mesma forma que o tratam.

— É demais pra você receber alguém como eu? — pergunta vendo-a olhar da cabeça aos pés e ela sorri, assim como ele.

— Khao...

— Sente-se, por favor. Vocês estão atrasados.

Talvez essa escola seja mais divertida do que ele imaginava. Dentre todas as pessoas e todos os murmúrios, havia um único garoto que o encarou desde o momento em que esbarrou na porta de maneira nada sútil. First é muito bonito, de fato, e seu olhar é intenso ao encarar-lhe. Ele poderia dizer sem esforço algum que talvez, ele estivesse com raiva dele. O sorriso presunçoso surge em seus lábios rosados e First, o presidente do Grêmio, desvia os olhos.

— Você ainda vai me colocar em encrenca. Mal chegou e já causou problemas. — Neo resmunga.

— Você me empurrou. Meu pai pode tirar a gente dessa. Mas não tô entendendo qual é a desses olhares...

— Você só pode tá brincando... Ator; cantor e modelo... O que você espera? Está chamando a atenção de todo mundo.

— Só tem uma pessoa de quem eu quero chamar a atenção... — ele o olha — Quem é ele? — pergunta apontando para o garoto que não parou de olhar até que ele o encarou de volta.

— First Kanaphan. Ele é filho de um médico cirurgião e uma cardiologista. Também é presidente do Grêmio estudantil. Ele não parou de te olhar por causa da calça, eu tenho certeza.

— Isso vai ser divertido...

— Ele não é gay, Khao.

— Já namorou uma menina?

— Não...

— Então também não é hétero.

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