Laços de Sangue - Legado & Ruína

- Prólogo -

                    — Esta história foi traduzida do ateiaman para o português pela Eloá, quando ela deixou de viver suas aventuras e passou a conta-las —

O tempo é um senhor brincalhão, rodeando os fios em seus dedos. Ligando tudo e todos em um tear gigantesco. Contando e esperando, era o que Dara sempre me dizia.
Relembrar memórias que demorou tanto tempo para guardar nos mais escuros e secretos lugares de nossa mente. Onde eu escondi a dor e o sofrimento que algumas dessas memórias insistem em trazer consigo.
Revisitar o passado, é como assistir um filme da sua vida.
E é exatamente isso que estou fazendo agora.

— Eloá, pare de correr — Ouvi Dara gritando, para a pequena criança que atravessava meu corpo em alta velocidade. Ressoando uma risada pelos corredores.

— Você precisa me pegar - Gritou a criança como resposta. Minha boca seguiu a fala em uma mímica decorada.

Eu já havia visitado esta mesma memória milhares de vezes. Sabia como ela começava e sabia como ela acabaria. Era como ser um espectro dentro de uma visão do passado. Assistia parada no mesmo lugar sempre, sabendo que o próximo acontecimento mudaria minha vida e o que eu conhecia sobre ela. O que já não era muito.

A noite estava surpreendentemente silenciosa lá fora. Os pequenos feixes de luz da Lua atravessavam pelas janelas, juntamente com uma leve brisa gelada, que entrava por aqueles vitrais que não haviam sido fechados. O horário perfeito para a Eloá de 6 anos, estar dormindo, mas ela queria brincar de pega-pega mais uma última vez.

Fechei os olhos levemente esperando que o grito escapasse pela boca da criança, enquanto meu inconsciente e meus labios se abriam fazendo os mesmos movimentos. O grito não tardou a ser ouvido pelo corredor. Estraçalhando o silêncio em mil pedaços.

— Consegui te alcançar pequena estrelinha — Disse Dara, com um sorriso brincalhão,  ao segurar-me pelos braços, uma criança aos berros, agonizando — Eloá, o que está acontecendo? — Perguntou, rapidamente mudando sua
expressão alegre para uma seriamente preocupada.

Eu não lembrava com certeza o que tinha visto quando ela me tocou. Eu também não tenho explicação de como algumas memórias são inacessíveis para mim. Essa é só mais uma das perguntas que eu guardo em uma caixinha dentro da minha cabeça.

A dor que aquela criança sentia. A dor que eu sentia, era angustiante. O calor queimando meu corpo de dentro para fora, o suor escorrendo pelas minhas têmporas, os olhos fechados com força, enquanto os pensamentos entravam em combustão. Eu não precisava me forçar a abri-los, porque sabia o que aconteceria em cada próximo segundo.

Eu poderia narrar os acontecimentos. Os gritos da criança cessariam de repente, os meus gritos parariam assim que Dara se afastasse. Eu não abriria os olhos nas próximas cinco horas. E uma explicação, de duas horas, viria a seguir. Uma tentativa eufemista de amenizar os danos em uma criança. Os danos a minha mente. Um eufemismo inútil.

Muitas crianças ficariam alegres ao descobrir um super poder. Pensariam em nomes e uniformes de super-heróis. Não sou uma delas. Fiquei apavorada. Perdida em mais uma confusão de perguntas, que não cabiam mais na minha caixinha.

Foi neste dia que descobri que Dara era uma druidisa com centenas de anos. Que, também, de alguma forma despertei meu poder. Foi naquele momento que uma pequena criança descobriu o seu primeiro bicho-papão: o toque e o passado.

Olá população de Allous, para aqueles que estão relendo esses primeiros capítulos, espero que gostem das mudanças e aqueles conhecendo pela primeira vez, sejam bem-vindos. Essa história só esta começando. A Eloá e eu estamos ansiosos para que conheçam esse mundo e personagens. Um abraço e até o próximo capitulo.